Por José Carlos de Assis

A figura romana do Magistrado Supremo, que enfeixava temporariamente nas mãos os poderes do Estado para defender a Nação do risco de dissolução, não foi uma imagem muito inteligente que usei para propor uma saída institucional da crise brasileira. Em primeiro lugar, para descrever esse poder institucional eu usei a palavra clássica “ditadura”, descolada de seu contexto histórico. Segundo, não deixei claro que o magistrado recebia um mandato e um programa bem definidos, e tinha que respeitar os direitos dos cidadãos (não havia cidadãs).

O ditador da era pré-clássica romana, entre a monarquia e a república, deveria devolver o poder ao Senado tão logo cessasse a necessidade do regime de exceção. Em geral faziam isso de bom grado pois não viam com bons olhos o exercício do poder fora da institucionalidade. Fala-se de um “ditador” que foi chamado de sua fazenda para assumir o poder e que, depois de cumprido o mandato, voltou tranquilamente para a enxada e a foice. No contexto da época, a “ditadura” ou magistratura foram o que salvou a República.

Vejamos a situação brasileira contemporânea. Poucos duvidarão de que a República de Bolsonaro, prolongamento da de Temer, levou o país a um processo de desarticulação sem paralelo. Desde o caos do INSS à zorra total nos processos do Sisu/Enem, nada, mesmo as coisas mais elementares, estão funcionando. A impressão – e, de fato, a realidade – é que um bando de amadores, movidos exclusivamente por ideologia anti-esquerdista, assumiu os poderes da República. E tudo isso é recoberto por uma retórica de ódio.

Se observarmos o STM é a mesma coisa. Proliferam as sentenças conflitantes e a demora das decisões, em casos políticos como de Lula, é resolvida de acordo com conveniências oportunistas dos juízes. Isso lembra os magistrados ingleses de séculos atrás convencidos por presentes e não por argumentos. Os recursos ilimitados põem a Justiça exclusivamente a serviço dos ricos que tem poder econômico de recorrer indefinidamente tanto em casos civis como criminais, eliminando o princípio de igualdade perante a lei.

O comportamento do Congresso está abaixo de qualquer crítica. Rodrigo Maia, presidente da Câmara, tornou-se um negociante da pauta. O mesmo acontece com David Alcolumbre, presidente do Senado. Eles negociam abertamente as prioridades das duas Casas de acordo com interesses de grupos. E a própria definição de grupos é indefinida, pois quase 30 partidos tem representação na Câmara, fazendo desta última um verdadeiro bazar de negociatas. A esse sistema chamam de democracia!

O Executivo se esforça para parecer honesto, já que fez uma campanha baseada na retórica contra a corrupção. Debalde. As negociatas do PSL, originalmente do Presidente, resultaram em sua cisão e numa crise de governo, com insultos pesados e denúncias de parte a parte, que mancham permanentemente a reputação do partido. Mais do que isso, a investigação das operações financeiras de Flávio Bolsonaro coloca em evidência um processo podre de corrupção que se liga diretamente com a cozinha de Jair Bolsonaro.

Enquanto as principais instituições da República chafurdam na lama, a Procuradoria Geral da República atua politicamente, e a Polícia Federal primeiro prende para depois “provar” a culpa. Supervisionando tudo, no exercício pleno da “liberdade de imprensa”, a grande mídia ajuda o Judiciário corrompido a violar todos os direitos básicos da cidadania,

especialmente o direito ao habeas corpus, à presunção de inocência e ao devido processo legal. De seu púlpito, a OAB assiste impávida a usurpação pelos ricos da democracia no país.

Desculpem-me, se isso é democracia, uma democracia que só atende aos interesses dos ricos, estou fora. Tenho que buscar alguma alternativa de curto prazo para salvar os direitos dos pobres, antes que Paulo Guedes – canalha, canalha, canalha, diria Requião – liquide o patrimônio nacional e as empresas estatais estratégicas. Minha proposta é a Magistratura Suprema, como apoio do Exército. E não me venham com o argumento cínico de que isso violaria a democracia. Esta democracia que está aí não presta.