Por Ricardo Cravo Albin

“Faltam menos de 20 dias e como separar igrejas de opiniões políticas, pergunta a maioria?”.

O resultado do primeiro turno trouxe duas surpresas que ainda hoje são discutidas, analisadas e até temidas.

A primeira foi a disparidade dos números contabilizados pelas pesquisas de intenção de voto e pelas urnas apuradas. A segunda, as surpreendentes conquistas de Bolsonaro, não anotadas com a clareza devida pelas pesquisas.

Vamos por etapas, analisando com “olhos frios e cabeça no freezer”, como minha saudosa mãe recomendava ante questões de certa gravidade.

O problema dos institutos de pesquisas vem permitindo debates por demais acalorados, em especial pelo bolsonarismo, autoproclamado como a grande vítima das pesquisas, especialmente em São Paulo. Estou certo de que os institutos estarão a estudar em detalhes as possíveis falhas, e de que corrigirão a performance ineficaz agora no segundo turno. Como também estou certo de que críticas são justas (e necessárias) para que os dois principais institutos, ao menos eles, corrijam futuras previsões improváveis. Todos sabemos, enfim, que pesquisas não são prognósticas nem verdades inamovíveis, até porque eleitores podem mudar de opinião na hora H de votar na urna. E ainda cabe anotar dois fatores a distrair e confundir alguns eleitores, a abstenção em país de voto obrigatório e a radicalização onipresente entre Lula e Bolsonaro. Além, cabe realçar, dos eleitores invisíveis, aqueles que se recusam a responder às pesquisas.

Embora geralmente credibilizados por nós jornalistas desde muitas décadas, os institutos devem, absolutamente devem, fornecer todas as hipóteses sobre as movimentações, sutis que seja, do eleitorado. Quanto a segunda surpresa, o avanço não previsto dos candidatos de Bolsonaro, especialmente em São Paulo, já é fato concreto e ponto final. O apurado pelas urnas eletrônicas estão a desmentir as acusações infundadas de Bolsonaro, que as avaliava como trapaceiras. Aliás, os observadores internacionais da OEA (Organização dos Estados Americanos) deram parecer “excelente” para as eleições do Brasil, realçando tanto a lisura quanto o profissionalismo do TSE. Outro dado relevante: mais de 50 observadores de 17 países estiveram também a avaliar nosso primeiro turno e o julgaram “com ordem e normalidade”.

Foi positivo todos os candidatos terem reconhecido os resultados, embora o Presidente Bolsonaro, mesmo tendo as urnas a seu favor, se absteve de comentários ante suas ácidas críticas anteriores ao sistema eleitoral eletrônico.

Agora, nesta segunda semana da votação de primeiro turno – escrevo à noite de segunda-feira- acabo de saber que o bolsonarismo atacou mais uma vez o sistema eleitoral e teria chegado a anunciar disposição de reformar o STF, ampliando-lhe o número de vagas. Medida essa que assisti na Globo News pela boca do líder do governo, o controvertido Deputado Ricardo Ramos. A que, acrescento aqui por dever, se seguiu entrevista do Ministro Celso de Mello, ex-Presidente da Corte Suprema, que comparou essa medida ao apogeu do governo militar de 64, que dobrou a seu bel prazer o número de ministros do STF. O que provocou a maior controvérsia jurídica de todo o período da época tempestuosa de 64 a 85.

Já que me referi há pouco ao comecinho da segunda semana entre primeiro e segundo turnos, os institutos apontam neste começo de noite 51% dos votos para Lula e 42% para Bolsonaro, índices indicadores de estabilidade da primeira pesquisa, há menos de uma semana. Embora, é claro, possa se alterar nos próximos dias, para mais ou para menos, a qualquer momento.

Outro dado que anoto com enorme desprazer é a permanente presença de Fake News, já que foram contabilizadas 600 mil, mais que meio milhão de mentiras, distorções e informações fraudulentas(!) a circularem pelo terreno livre (até que ponto?) na rede de computadores até o dia 2 de setembro.

Ao que observei em pesquisas pessoais, a maior concentração de investidas eleitorais pelos dois candidatos se desenvolve neste começo de semana em torno do voto evangélico. O que pode admitir algumas observações paralelas. Segundo testemunhas de alguns fiéis há uma fortíssima pressão das igrejas pentecostais para o voto expresso ora em Lula, ora em Bolsonaro, este aparentemente preferido pela maioria dos pastores. A bancada evangélica detém metas inamovíveis como aborto, condenação a direitos LGBTQIA+, combate a medidas de liberação mesmo medicinal de drogas, entre outros itens conservadores. Mas guerra é guerra.

Mesmo se intuindo Bolsonaro à frente como candidato ultraconservador, Lula adiou para sábado uma “carta” aos evangélicos, da qual mal se sabem tanto conteúdo quanto efeitos possíveis. O que não há dúvidas, ou parece não haver neste país em que as contradições frutificam num abrir e fechar de olhos, é a que cada lado tem sua opinião e que não devem os candidatos mudar de opinião como trocam de camisa. Disso os eleitores já estão fartos.

E a ascendência atual do bolsonarismo de extrema-direita nos dá exata conta disso. Ou seja, da imutabilidade da opinião conservadora em relação aos seus valores.

RICARDO CRAVO ALBIN – Jornalista, Escritor, Radialista, Pesquisador, Musicólogo, Historiador de MPB, Presidente do PEN Clube do Brasil, Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.

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