Por José Macedo –
José Macedo, em 22/01/2023, lembra-se de Leonel de Moura Brizola, nascido, em 22/01/1922. Portanto, neste dia, comemoraria 101 anos de idade.
Entre tantas histórias de Brizola, essa com Carolina de Jesus merece ser compartilhada – trago do Memorial Luiz Carlos Prestes:
BRIZOLA E CAROLINA DE JESUS
No livro “Casa de Alvenaria” (1961), Carolina de Jesus registra sua passagem por Porto Alegre e o encontro com Leonel Brizola e sua esposa Neuza Goulart na turnê de divulgação do seu primeiro livro “Quarto de Despejo”. Datada em 02 de dezembro de 1960:
“Quando a Dona Neuza Goulart Brizola surgiu fiquei observando-a atentamente. Foi a primeira esposa de governador a receber-me depois que eu saí da favela. Conversando com Dona Neuza percebi que o majestoso palácio que ela habita não lhe envaidece. Achei lindo ela dizer: “Tenho pavor desta casa. O meu esposo é político. E os políticos não têm amigos”. Ela despediu-se. Fui falar com o Dr. Leonel Brizola noutra sala. Perguntei-lhe como vai indo o desenvolvimento do estado. O Dr. Leonel Brizola pediu-me para não envaidecer e não desprezar os pobres:
– ‘Você deve voltar periodicamente a favela para não perder sua autenticidade. Você vai visitar as favelas de Porto Alegre e dizer aos favelados que eles precisam e devem estudar. Faça-me esse favor. O meu sonho é acabar com o analfabetismo no estado. O meu carro está a seu dispor”.
Dei uma risada e comentei:
– “Que honra para mim! Estava habituada a andar só de Rádio-Patrulha”.
(…)
Fiquei abismada quando vi as favelas do Rio Grande do Sul. As casas são de tábuas bem construídas.Tem muita água e vários tanques. As mulheres não brigam por causa da água. Algumas pessoas da favela conheciam-me de nome. (…) O que impressionou-me na favela de Porto Alegre foi a quantidade de água. Quando abre a torneira em dois minutos enche-se uma lata. As mulheres lavam as roupas com água canalizada desinfetada com cloro.
(…)
Fomos na Câmara ver o II Congresso Estadual de Vereadores. Estava empolgante. O Governador Leonel Brizola estava presente. Eu disse-lhe:
– “O senhor está me perseguindo”.
Ele sorriu comentando:
– “Não, Carolina. Quem está perseguindo-me é você. Eu cheguei na frente”.
O presidente interrompeu os debates para receber-me. E apresentou-me aos presentes, convidando-me para me dar parte nos debates. Perguntou-me qual é a causa das favelas nas grandes cidades. Respondi:
– “Nós os favelados somos os homens do campo. Devido os fazendeiros nos explorar ilimitadamente deixamos as favelas e vamos para as cidades. E nas grandes cidades, os que vivem melhor são os cultos. Nós os incultos encontramos dificuldades de vida. Mesmo trabalhando na cidade como assalariado, encontramos dificuldades para viver porque o salário não cobre as despesas. Não há possibilidade de pagar uma residência decente. Temos que habitar as terras do Estado.
Fui aplaudida. Meu olhar avuou para o rosto do Dr. Leonel Brizola. Ele estava sorrindo. Autografei alguns livros para os vereadores”.
(Fonte: JESUS, Carolina de. Casa de Alvenaria: diário de uma ex-favelada. São Paulo: Editora Paulo de Azevedo, 1961. p. 89-93.)
Em 1961, Brizola era governador do Rio Grande do Sul. Nessa data, dá-se o encontro entre Carolina de Jesus e o governador.
Esse encontro ficou registrado como registrado na história do Brasil por revelar a importância que foram esses dois personagens.
Carolina de Jesus, uma favelada que se tornou a mais importante escritora negra de nosso país.
Essa mineira, de catadora de papel, de uma analfabeta, de Favelada, tornou-se conhecida internacionalmente. Tornou-se ainda uma best-seller por seu livro, “Quarto de Despejo”, uma autobiografia.
Seu estrondoso sucesso foi um exemplo e ainda é, para os que lutam, individualmente, pelo superação da fome e da miséria.
Mas, não foi seu único livro.
Esse encontro com Brizola foi emblemático e significou a sensibilidade de Leonel de Moura Brizola para os problemas sociais e da população negra, seus problemas sociais.
Quando Brizola foi governador do Rio de Janeiro essa atenção fez parte de seu governo.
Jamais deixou de lado as questões do negro, das favelas, das crianças, das mulheres.
A educação foi o farol de suas ações.
Brizola seria o presidente da República que não chegou a ser.
Quem perdeu? Todos nós, brasileiros.
Para fechar essa homenagem, trago relevante pedaço de uma entrevista de Brizola e, foi o 08 de janeiro de 2023, a tentativa de golpe, sua motivação.
Após a ditadura de 1964, analisando a questão do intervencionismo Militar, em nossa história, disse Brizola:
“Os militares estavam assimilando bem o processo de redemocratização – mas haviam saído de cena estrategicamente, preservando o seu poder para voltar a intervir no cenário no cenário nacional. Eu acho que eles se retiraram, evidentemente com base numa visão estratégica para conservar o poder de reintervencão”.
Quem estuda a história do Brasil, sabe que, o intervencionismo militar é nossa marca.
Quando ocorre qualquer crise política, os militares oferecem-se como instrumento de mediação de conflitos, de intervenção ou mesmo de tomada do poder.
Trata-se de indevida politização e desvirtuamento de suas funções constitucionais.
Brizola vive!
JOSÉ MACEDO – Advogado, economista, jornalista e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.
Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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