Por Alcyr Cavalcanti

Ainda que todas essas pessoas fossem suspeitas de associação criminosa, o que não está provado, não é justificado esse tipo de execução sumária. Cabe à polícia o poder de prender e a justiça o dever de processar e julgar.

Para o Ministério Público “Em nenhum país do mundo uma operação policial com 25 mortos, não pode em hipótese alguma ser considerada exitosa“. Organismos internacionais criticam a operação policial que resultou em um número de mortos jamais visto, uma verdadeira chacina, sem justificativa, haja visto que o narcotráfico não vai acabar na cidade do Rio de Janeiro.

A Favela do Jacarezinho dominada pela rede criminal Comando Vermelho-CV é uma enorme localidade na Zona Norte da cidade. A “War on Drugs” fiel a seus princípios ataca com todo o aparato bélico ao seu dispor, não se importando com a morte de inocentes, nem com o fechamento de escolas e principalmente numa época de crise sanitária, com o fechamento de Postos de Saúde.

A polícia investigativa parece que não teve muita importância desta vez. Vinte e cinco mortos até agora é uma absurdo e com o agravante de estarmos em plena Pandemia, onde por recomendação expressa do STF a normativa foi ignorada. Moradores acuados relatam às escondidas que a violência extremada foi a ordem, desde pé na porta, destruição de utilidades domésticas duramente conquistadas e eliminação sumária de “suspeitos” de ligação com o narcotráfico.

O Ministério Público está na enorme favela, para tentar apurar alguma coisa e como de hábito a reportagem ficou de plantão na Cidade da Polícia para saber a versão oficial.

Foi a maior chacina de toda a história do Rio de Janeiro superando a Chacina de Vigário Geral (foto) em que vinte e uma pessoas foram mortas, a maioria de evangélicos. Nenhum em Vigário pertencia à criminalidade. As novas diretrizes em não facilitar o trabalho da Imprensa em operações dessa importância leva a boatos de todo o tipo. Parece que alguns querem esconder alguma coisa. Isso não é bom, circulam por aí vídeos de outras execuções em outros locais. Para um morador da área, deve haver um número bem maior de mortos, ou como disse o Senhor Presidente aqueles que “Tiveram o CPF cancelado”. Circula por aí um vídeo de uma execução sumária, e segundo os executores escreveram: “Aplicação da Pena de Morte”.

A operação, que já é a mais letal da história do Rio de Janeiro, paralisou também as estações de metrô e de trem da região, deixando, inclusive, dois passageiros do metrô feridos a bala. Ambos foram atendidos no hospital Salgado Filho e no hospital Souza Aguiar e não têm risco de morte.

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Nota oficial da OAB/RJ sobre a operação policial na comunidade do Jacarezinho

A Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Rio de Janeiro, vem a público manifestar grande preocupação com a recente incursão policial no Jacarezinho, que contabiliza até o momento 25 pessoas mortas e 5 feridas. Tal número de vítimas coloca essa ação policial entre as mais letais da história do Estado.

Operações de enfrentamento ao crime organizado são necessárias, mas devem ser feitas com inteligência e planejamento. Salientamos que o norte permanente da atuação das forças de segurança deve ser a preservação de vidas, inclusive a dos próprios policiais.

É importante observar que a incursão policial de hoje acontece durante a vigência de medida cautelar proferida nos autos da ADPF 635 (STF), cujo dispositivo reserva operações dessa natureza, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, a hipóteses completamente excepcionais e justificadas. E com acompanhamento do Ministério Público.

Independente das circunstâncias, as forças de segurança devem cumprir suas funções respeitando o universo de direitos e garantias fundamentais previsto na Constituição Federal. Nunca será aceitável que um braço do Estado opere acima das leis.

A Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da OABRJ já está acompanhando o caso.

Rio de Janeiro, 6 de maio de 2021
OABRJ


ALCYR CAVALCANTI – Jornalista profissional e repórter fotográfico, trabalhou nos principais jornais do Rio de Janeiro e de São Paulo e em agências de notícias internacionais. Bacharel em Filosofia pela Universidade do Estado da Guanabara (atual UERJ) e mestre em Antropologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Professor universitário, ex-presidente da ARFOC, ex-secretário da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.