Por José Macedo

Estou, continuamente, motivado para falar sobre o tema, objeto do presente artigo. “O Acesso à Justiça, Celeridade versus Segurança” foi o assunto de minha pós-graduação em Direito Processual.

Lembro-me e, já se vão mais de 3 décadas, fiz, de início, uma citação de Rui Barbosa: “Justiça tardia nada mais é do que injustiça institucionaliza”. Dei ênfase a uma abordagem semelhante do que, até aqui, continuo escrevendo. Trago ao tema variáveis, que tem visíveis ligações, como as de natureza cultural, histórica e econômica. Essas variáveis, são, pelo menos, aparentemente, afastadas da maioria dos estudiosos do assunto, que preferem dar prioridade à análise técnica e fria, jurídico-processual. Assim é que, meu ponto de partida é o de traçar o perfil de nossa realidade sob o prima cultural, educacional e socioeconomica, até chegar, ao caso concreto, resultado, desse modo mais racional para a obtenção da verdade. Então, enxerguei à minha frente um quadro de desesperança e uma perspectiva desfavorável, resultante das informações concretas, extraídas de fontes com reconhecida e fiel credibilidade. O Acesso à Justiça tem uma dimensão ampla, iniciando na distribuição da ação, provocando o Juízo competente, fundamentando a pretensão, para que reconheça o direito e a pretensão aduzida, numa prestação jurisdicional, imparcial e justa, em um tempo razoável. Para isso, quando o cidadão procura a tutela do Estado-juiz, espera encontrar condições concretas, que garantam sua pretensão, ficando ali afastada qualquer possibilidade de frustração. No caso concreto brasileiro, as frustrações repetem-se, trazendo desilusões, dando continuidade a conflituosa convivência. Então, os resultados concretos desejados não ocorrerão, sem que haja, paralelamente, mudanças profundas na educação e na distribuição de renda das pessoas, em Instituições imparciais, estas foram incumbidas da função de garantidoras de credibilidade, celeridade e de confiança.

Nos meus estudos, incluo a questão da pobreza, sendo o maior obstáculo, para que o cidadão entre e saia, tempestivamente, do Judiciário brasileiro, vendo a efetiva entrega da prestação jurisdicional, satisfeito seu direito, ou seja, o bem da vida, através de um processo, célere, imparcial, bom e justo. Outros obstáculos a serem enfrentados existem, como o tecnicismo, o hermetismo processual e o exagerado formalismo. Recentemente, com o processo eletrônico, posto em prática de modo abrupto, causa maior distanciamento do cidadão, o que é, sem duvida, uma dificuldade a mais para seu acompanhamento e obtenção de informações. Entendo que, essas mudanças, embora necessárias, deveriam passar por adaptação e aprendizado. As leis, teoricamente, são bem elaboradas, por vezes, inspiradas em modelos estrangeiros, obviamente, não são capazes de solucionar os graves problemas, caem em desuso e descrédito. Os legisladores terão de repensar uma Justiça, adaptada à nossa realidade e os magistrados mudarem seu comportamento elitista e isolados da realidade em que atuam, apreendendo os tudo que existe de concreto, assim, pisam exercer a nobre função judicante em uma sociedade desigual, um povo, culturalmente, atrasado.

Nossa dependência à Justiça, jamais, foi tão presente, quanto nos dias atuais.

Os conflitos surgem a cada momento, afetando e trazendo infelicidade a nossas vidas. O cidadão, a cada dia, demanda mais e mais da Justiça. A capacidade da livre negociação, da composição amigável é mais complicada, não encontrando o cidadão de bem outra alternativa, senão a via judicial. A eternização dos conflitos entre as pessoas podem alcançar níveis de difícil convivência social, incidindo na autotutela, na opressão e coação do mais forte, na escalada incontrolável da violência. O fracasso do Direito é o fracasso do Estado, fonte geradora da violência. Nas comunidades, em que inexiste a presença do Estado, da Justiça e a seu acesso, obviamente, predomina a Lei do mais forte. Nesse contexto, assistimos a proliferação das organizações criminosas, das milícias urbanas e do tráfico de drogas. No passado, o Cangaço foi um fenômeno, que prosperou nas Regiões onde o Estado era ausente e omisso, a Justiça, um conto de fadas. O Estado, nascido de um pacto, um contrato social necessário, monopoliza o poder-dever de julgar e dar razão a quem a tem, cujo escopo é o de restabelecer a paz entre todos que, está, constantemente, em risco.

Os filósofos do século XVII e XVIII, cito, aqui, Hobbes, pela importância de sua principal obra, o Leviatã (o Estado), esse Ente Superior e monopolista está acima dos indivíduos, cuja função e a do exercício da Justiça. O “homem, o lobo do homem”, justifica o filósofo, fez necessário a criação do Estado-juiz. Com a criação do Estado-juiz, “justo e imparcial”, imaginou-se que, a Lei de Talião (“olho por olho, dente por dente”), o duelo e o “exercício arbitrário das próprias razões” (justiça pelas próprias mãos), enfim a força dos poderosos ficariam nos livros de história, tão-só, objeto de contos e estudos. Saindo desse necessário e longo preâmbulo, passo a questionar e examinar o que estamos vivendo, os obstáculos e incoerência do Estado Moderno, capitalista e patrimonialista, nossa Justiça é e será impotente. Meu ponto inicial é o de afirmar: a Justiça que conhecemos é a que temos e temos de nos virar com ela, pelo menos enquanto não haja mudanças profundas. Dou seguimento à citação do artigo 5°, inciso XXXV – “a Lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. No tempo e espaço conhecidos, por natureza a Justiça é lenta, até para preservar a segurança, porém não quer dizer que, ultrapasse níveis do tolerável, tornando-se “Injustiça” ou, dando razão a quem não tem direito. Por isso, a EC 45 inseriu uma nova garantia ao processo, no artigo 5°, LXXVIII da CF/88 – “a todos, no âmbito judicial e administrativo são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Apesar desses esforços, não temos obtido sucesso, com relação ao acesso à Justiça e a segurança de um direito justo e de uma decisão imparcial.

Lamentavelmente, essa crítica foi feita pela ONU, quando fez veemente crítica à Justiça Brasileira, por sua demasiada lentidão e insegurança jurídica. O acesso à Justiça não se resume ao mero direito de petição, embora, constitucional. A Justiça é cara, burocrática e lenta, o que dificulta o acesso da maioria da população brasileira, facilitando o uso do exercício arbitrário das próprias razões, distanciando-nos do estágio civilizatório. A violência, por isso, passa a ser a regra e costumeira. O ideal de um Estado justo e ágil tem sido um sonho para a maioria para maioria dos brasileiros. Para seguir o caminho dessa minha rápida reflexão, trago informações, que me deixam à vontade para minha crítica pessimista. O processo foi criado como garantidor do direito material, para quem o mereça, direito à vida, à liberdade, à saúde, habitação digna, segurança e ao patrimônio formado com seus próprios esforços, para que tenham gozo sem que sofram restrições. Esses direitos estão presentes em nossa Constituição, chamada de Cidadã sobretudo no capítulo dos Direitos individuais e coletivos. Pois bem, no Brasil, os números são negativos. O Conselho Nacional de Justiça, o IBGE, até Órgãos Internacionais são fontes estarrecedoras desses números. Somos a 4a. população carcerária do mundo, com 840.000 pessoas em nossas prisões. A maioria dessa população sobrevive nas piores condições, abarrotadas, convivendo com ratos e insetos, prisões fétidas e superpopulosa, um retrato de total desumanidade. Dessa população, 35%, embora presos, não têm processos formalizados e sem advogados, muitos cumpriram a pena e continuam presos. Neste momento de Brasil, século XXI, ano 2021, a desobediência à Constituição passou a ser recorrente pelo governo, eleito, em 2018, que se sustenta na implantação do terror, ameaças, medo, sinalizando com a implantação de medidas autoritárias, como fechamento do Legislativo, do STF e a volta do temeroso AI-5. Por isso, as instituições de Estado aparentam fragilidade e até desvios no cumprimento das normas constitucionais, por conta dessas ameaças. Os Poderes da República, Legislativo e Judiciário, aparentam, neste momento, sob ameaças de um governo, de índole autoritária, sob sérias acusações e envolvimento com o crime organizado, passivos e, relativamente, omissos. Mas, faço ressalvas, ao STF, que, em determinados momentos, demonstram coragem, apesar de alguns de seus membros fugirem de suas funções constitucionais para as quais foram nomeados. O Pacto Social está sob ameaça e risco, neste instante de crise sanitária, com um governo omisso e criminoso. Por isso, temo, como, ora analiso, o aprofundamento da crise e o retrocesso, temo pela perda do restante de nossos direitos, nossa liberdade e nossas vidas.

Não tenho o propósito, nem parecer, nessa artigo, a intenção de ideologizá-lo, alerto para os maus intencionados. Trago o emblemático caso, ocorrido na 13a. Vara Federal Criminal de Curitiba e caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não devemos arquivá-lo no esquecimento. Então, um juiz parcial, ideológico e que tinha lado, condenou o ex-presidente, sem provas e foi, agora julgado suspeito.

Com esse exemplo e, recorrendo a tudo que fundamentei, conclamar por nossa reflexão e alerta.


JOSÉ MACEDO – Advogado, economista, jornalista e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.