Redação

O estatuto social da Petrobras estabelece que conflitos entre a estatal e seus acionistas devem ser resolvidos via arbitragem. E a Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996) prevê a competência do árbitro para decidir questões sobre da existência, validade e eficácia do contrato que contiver a cláusula compromissória.

Com esse entendimento, a ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, suspendeu processo da Justiça Federal de São Paulo que excluiu a União de arbitragem em que a Fundação Movimento Universitário de Desenvolvimento Econômico e Social (Mudes) pede ao governo federal a reparação de danos causados à Petrobras por atos de abuso de poder de controle.

A magistrada também designou a Câmara do Mercado, onde tramita a arbitragem, para resolver eventuais medidas urgentes. A decisão é de 17 de fevereiro.

A Mudes, representada pelo escritório Sergio Bermudes Advogados, moveu arbitragem para pedir a reparação da União à Petrobras pelos desvios revelados na operação “lava jato”. Em janeiro de 2020, o tribunal arbitral reconheceu que a União deveria participar do processo, devido à cláusula compromissória do estatuto social da petrolífera.

Porém, em agosto de 2020, a 22ª Vara Federal Cível de São Paulo aceitou ação declaratória ajuizada pela União para declará-la desvinculada da cláusula compromissória e desobrigada de participar do procedimento arbitral. O governo federal argumentou que não há que o autorizasse a se submeter à arbitragem.

A Mudes então suscitou conflito de competência no STJ. A ministra Nancy Andrighi apontou que a decisão da 22ª Vara Federal Cível de São Paulo invadiu a esfera de competência do juízo arbitral. Isso porque o estatuto da companhia prevê que disputas entre a Petrobras e acionistas serão resolvidas por esse meio. E o árbitro tem poderes para decidir sobre a existência, validade e eficácia da convenção que contiver a cláusula compromissória (artigo 8º, parágrafo 1º, da Lei de Arbitragem).

Dessa maneira, a ministra ordenou a suspensão do processo que corre na 22ª Vara Federal Cível de São Paulo designou o juízo arbitral para resolver, em caráter provisório, eventuais medidas urgentes.

Cláusula arbitral
Fabiano Robalinho
, sócio do Sergio Bermudes Advogados que representa a Mudes no caso, afirmou que a decisão “prestigia o respeito e a vinculação à cláusula compromissória”.

Segundo Robalinho, a cláusula de arbitragem foi incluída no estatuto social da Petrobras em 2002, por iniciativa e com voto favorável da União, após todo um processo administrativo, no qual a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional se manifestou pela legalidade da norma.

O advogado afirma que a União tomou essa iniciativa porque, em 2001, a Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/1976) foi alterada para permitir a inclusão de cláusula de arbitragem no estatuto social das companhias (artigo 109, parágrafo 3º). A Constituição Federal estabelece que as sociedades de economia mista estão sujeitas ao regime privado e, portanto, à Lei das Sociedades Anônimas (artigo 173).

Conforme Robalinho, desde 2002, a União votou para ratificar os termos do estatuto social da Petrobras com a cláusula de arbitragem inúmeras vezes. Inclusive após 2015, quando a Lei de Arbitragem e a Lei das Estatais (Lei 13.303/2016) passaram a prever expressamente a possibilidade da União se submeter à arbitragem.

“Portanto, se havia alguma irregularidade em 2002, as ratificações posteriores à entrada em vigor dessas leis afastaram qualquer dúvida quanto à regularidade da cláusula e à vinculação da União à arbitragem. E tudo isso se deu antes da Mudes iniciar a arbitragem”, disse o advogado, ressaltando que a cláusula compromissória foi incluída no estatuto social da Petrobras para dar aos acionistas um sinal de que a empresa adota boas práticas de governança corporativa.

“É contra o princípio da moralidade dos atos administrativos que agora, quando as disputas surgem, a União tente sustentar que a cláusula que foi incluída no estatuto por iniciativa dela, com o voto dela e com parecer favorável da PGFN, não é válida. Esse tipo de insegurança e desrespeito aos acionistas que investem no mercado brasileiro claramente tem consequências, e uma delas é o êxodo de investidores da Bovespa. Investidores sofisticados acabam preferindo investir na própria Petrobras através da Bolsa de Nova York, porque o mercado de lá gera mais segurança jurídica para eles”, opinou Robalinho.

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CC 177.437


Fonte: ConJur