Por José Carlos de Assis

Com a aproximação do ano eleitoral, abriu-se a temporada de caça a votos financiada por dinheiro público no âmbito das prefeituras municipais, dentro do distorcido sistema brasileiro de reeleição. Um princípio que, em si mesmo, não é totalmente bom nem totalmente ruim, o da reeleição, no Brasil tornou-se um instrumento para consolidação no poder de antigas e novas oligarquias políticas, tanto no Executivo quanto no Congresso.

A possibilidade de reeleição poderia ser uma forma adequada de os eleitores avaliarem o desempenho de seus representantes nos governos. Na prática, ela funciona como um canal pelo qual, no caso dos municípios, torrentes de dinheiro fluem dos falidos cofres públicos para literalmente comprar apoio eleitoral muito antes mesmo de começar a campanha oficial. Pior. Privilegiam os que já exercem cargos públicos e, portanto, ditam as leis que financiam as campanhas. Portanto, a eles próprios. É ao que estamos assistindo, no momento, no Rio de Janeiro.

Trata-se de um dos municípios mais mal administrados do país, em todos os setores de interesse social. O único lugar de destaque que vem ocupando, com ampla cobertura paga de televisão, é na campanha antecipada de reeleição do prefeito Eduardo Paes, ou da eleição de um cúmplice dele. O setor de saúde do município  – e nisso não é diferente do estadual e federal – está às baratas. O mesmo na educação. A questão da mobilidade urbana é um desastre, com a maioria dos ônibus aos pedaços, não obstante uma propaganda insistente, na TV, sobre as maravilhas do BRT!

O que é mais revoltante é o que aconteceu no setor de saúde. Nos seus primeiros mandatos, Eduardo Paes negligenciou completamente o sistema sanitário, limitando-se a mudar o nome das unidades básicas de atendimento, de Postos de Saúde, que funcionavam muito bem, para Clínicas da Família. Estas se deterioraram rapidamente sob sua direção. Com Crivella, houve algumas mudanças. Ao contrário do antecessor, ele pelo menos se dedicou ao reequipamento dos hospitais municipais e a garantir que o governo federal mantivesse os estoques de remédios nas Clínicas da Família.

No mandato atual, as Clínicas de Eduardo Paes pioraram ainda mais. Houve momentos em que não havia um único médico nelas, ficando o atendimento por conta de enfermeiras, o que é vedado no SUS. Com a aproximação das eleições, porém, numa evidente manobra eleitoral, ele está reequipando umas poucas unidades de maior visibilidade. No Catete, por exemplo, um bairro muito populoso situado no início da Zona Sul, apareceu misteriosamente agora, na Clínica da Silveira Martins, a figura rara até mesmo um psiquiatra, para surpresa da clientela carioca!

Esse quadro demagógico do Rio se replica nos outros setores e no conjunto da Região Metropolitana. O dinheiro da privatização da Cedae, por exemplo, mais de 23 bilhões de reais, vem escorrendo pelos cofres do Estado e das prefeituras, sabidamente as mais corruptas do país, a maioria tendo se tornado clientes permanentes do Ministério Público e da Polícia. Nesse ponto, a TV Globo vem fazendo, por enquanto, uma campanha positiva. Quase semanalmente ela aponta os processos abertos contra dirigentes municipais do Estado e da Região Metropolitana, por conta de desvios de dinheiro, ou de dinheiro aplicado sob suspeita, como foi o caso da Ceperj.

Ninguém garante, porém, que ao se aproximarem as eleições, a Globo e outros órgãos de imprensa mantenham sua atitude vigilante em relação à deterioração de serviços públicos e de corrupção que ocorre no Rio e nos municípios vizinhos. É que esses órgãos, principalmente a Globo, ganham muito dinheiro com publicidade em favor de prefeitos corruptos. Paes, por exemplo, tem estado presente diariamente na Globo, com uma intensa campanha proclamando suas supostas conquistas em favor do povo do Rio.

É sua forma de reeleger-se ou de garantir na sucessão um cúmplice de confiança.

JOSÉ CARLOS DE ASSIS – Jornalista, economista, doutor em Engenharia da Produção, autor de mais de 25 livros de Economia Política e introdutor do jornalismo econômico investigativo no Brasil com denúncias de escândalos sob o regime militar que contribuíram de forma decisiva para o desgaste da ditadura nos anos 80. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.

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