Por Paulo Metri

– O que você achou desta última mesa de debates?

– Acho que está faltando criatividade no discurso para continuarmos a dominação.

– Como assim?

– Vamos analisar o processo histórico. A dominação se dava desde os primórdios através da força bruta. Assim egípcios, vikings, romanos, hunos, espanhóis, portugueses, ingleses e muitos outros a utilizaram. Os ingleses chegaram a terceirizar a dominação, com os corsários e com o apoio de cidadãos locais na Índia, por exemplo. A criação da figura de um “inimigo interno” (por exemplo, os comunistas, no caso brasileiro), fez com que nacionais de um mesmo país buscassem se exterminar. Os Estados Unidos chegaram a detonar duas bombas atômicas para mostrar ao mundo a sua grandiosa capacidade de dominação. Existiram também tentativas exitosas por pouco tempo, como as de Napoleão, Hitler e outros. Enfim, o ataque era às claras e o butim era livre.

– Mas, os discursos humanísticos chegaram, mostrando a inutilidade civilizacional das guerras, inclusive as barbaridades cometidas nelas. E aí?

– Aí, começaram a se preocupar em mostrar à população discursos sugerindo a existência de lutas armadas éticas que trazem segurança, desenvolvimento, liberdade de expressão, novos modelos culturais etc. Com a oferta de segurança, a Arábia Saudita, vizinha de Israel, fechou uma aliança com os Estados Unidos, que dura desde o ano de 1945 até o presente.

Por exemplo, durante anos, ouviu-se que a chegada de multinacionais em um país traria desenvolvimento ao país. Se esta desafogar um gargalo existente em um setor industrial do país, é verdade. Entretanto, se este não for o caso e considerando que as multinacionais tendem a não reinvestir os lucros no país e, sim, mandá-los para a matriz, elas se tornam menos atrativas que o esforço de desenvolvimento tecnológico com empresas nacionais.

– Era necessário, então, rebuscar o discurso?

– Não só isso! Era preciso criar novos conceitos que contivessem a promessa de se atingir um alto padrão de desenvolvimento. Assim, criaram o conceito que cada país deveria se dedicar só à produção do que ele fosse “vocacionado”. Ou seja, para os produtos e serviços que ele mostrasse possuir “vantagem comparativa”. Ou seja, ao Brasil restaria somente a produção de minérios e grãos. Essa proposta frearia os países em desenvolvimento de buscar desenvolver tecnologia. A subordinação à vantagem comparativa é uma forma de nada mudar.

É interessante que figuras irreais são trazidas, despudoradamente, para basear raciocínios neoliberais, como o da “competição perfeita”. Esta incoerência real não existe por causa dos próprios empresários, que trabalham para conseguirem o “domínio do mercado”. O fato que não existirá “competição perfeita” entre as refinarias da Petrobras escolhidas para privatização é triste. Pois, elas são donas de monopólios regionais.

Mais um fato estranho nas privatizações é que o preço mínimo do ativo a ser privatizado é calculado pela soma dos lucros futuros que ele ainda proporcionará trazidos para o valor presente. A soma dos gastos históricos atualizados, sendo desta soma diminuídos o desgaste devido ao uso e a obsolescência eventual da tecnologia poderia ser outra metodologia, que, eventualmente, chegaria a um valor mínimo do ativo maior.

Contudo, a discussão do valor mínimo deve ser precedida por outra muito mais importante, que é: “Por que privatizar? ” Os neoliberais respondem a essa pergunta com algo como: “A empresa privada é sempre mais eficiente que uma empresa estatal! ” Em primeiro lugar, ela é mais eficiente sob que aspecto? Econômico? Ambiental? Social? Se a empresa privada der bons dividendos aos acionistas, péssimos salários aos trabalhadores e causar maiores danos ambientais, ela é mais eficiente?

Além disso, o que é muito importante: “Se a empresa estiver em um setor que pode alavancar o desenvolvimento nacional, é melhor a privada ou a estatal? ” “Se o setor for extremamente lucrativo e for desejado transferir boa parcela deste superlucro para políticas públicas, qual tipo de empresa seria convidado a participar? “

Em respeito aos que têm dúvida, lembro que o maior objetivo das empresas privadas e, em alguns casos, o único objetivo, é maximizar o lucro. Neste caso, os gastos com políticas públicas iriam diminuir o lucro.

Um monopólio privado é o pior dos mundos, enquanto um monopólio estatal pode ser o melhor dos mundos, se houver controle social da estatal. Este controle social, que não é controle governamental, pode ser detalhado em outro artigo. Assim, às estatais, poderiam ser reservados os setores estratégicos, os setores que geram superlucros e aqueles em que se precisa desenvolver tecnologias, porque o Estado consegue as desenvolver.

O fracasso do modelo neoliberal ocorre em vários países ao redor do mundo. Ignacio Ramonet, ex-editor do “Le Monde Diplomatique”, publicou seu artigo “Angleterre, crise totale”, na edição de abril de 2001 do jornal. Nele, Ramonet dizia que a epidemia de febre aftosa que se espalhava, naquela época, pelos campos britânicos, (…) era consequência de um momento histórico preciso e não era por coincidência que estava acontecendo dentro de uma Inglaterra que foi utilizada, durante mais de vinte anos, como laboratório do ultraliberalismo. Assim, desde 2001, sabia-se que cortes neoliberais do orçamento público traziam reações indesejáveis para a sociedade também a médio e longo prazo.

– O que nos resta fazer, então?

– Sempre tivemos o controle dos principais meios de informação comerciais, controle do Congresso e de parte do Judiciário, e adquirimos recentemente o controle da máquina pública. Passamos a entregar o poder a governos autoritários comprometidos com nossos interesses. Antes, compúnhamos com a direita liberal, que travestia melhor a dominação. Mas, isto tem se mostrado pouco efetivo, atualmente.

– Por que?

– A sociedade adquiriu melhor grau de politização? Talvez, não sei. Sei que, hoje, o Brasil resiste ao controle midiático convencional. O modelo de comunicação mudou e nossos adversários se adaptaram bem ao novo modelo. Existe a opção pelas fake knews e os robôs, cuja aplicação maciça é uma solução, se puder ocorrer. Por falta de outras opções, vim aqui esperando ouvir novas propostas. No entanto, pregam providencias antigas e, hoje, inócuas.

Estamos perdendo e, por isso, os países estão reestatizando suas antigas estatais, que tinham sido privatizadas.

PAULO METRI – Engenheiro, conselheiro do Clube de Engenharia, vice-presidente do CREA-RJ, colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.


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