Por José Carlos de Assis

A TV Globo está comprando a simpatia de juízes, promotores, procuradores e polícia com ataques diretos à lei contra o abuso de autoridade aprovada no Congresso, e que está para ser sancionada por Jair Bolsonaro. É um descaramento absoluto. Repisando de forma insistente declarações das corporações judiciais temerosas de alguma forma de vigilância pela sociedade de suas arbitrariedades, a emissora está dando uma fantástica cobertura de um lado só ao tema, como forma de pressionar o presidente a vetar a lei no todo ou em parte.

É um acinte. Não existe nem mesmo aquele simulacro de imparcialidade que colocaria em cena apoiadores da lei e os que estão contra ela, para que o telespectador tire uma conclusão sua. Não. Quem fala pela TV Globo nesse tema, manipulando o povo, são só os detratores da lei aprovada num momento de rara dignidade e interesse público pelas duas casas do Congresso. Defensores não aparecem. Há dias, talvez por engano, abriram uma fresta: fizeram uma gravação com Gilmar Mendes, mas reduziram propositadamente o som.

A manipulação começa na nomenclatura. Não dizem lei contra o abuso de autoridade. Dizem lei do abuso de autoridade. Em nenhum momento o cidadão comum é esclarecido sobre os objetivos reais da lei, ou seja, processar e eventualmente condenar juízes, desembargadores, promotores, policiais e procuradores moralmente corruptos, que usam sua posição para atacar pessoas comuns em situação vulnerável. É contra o guarda da esquina arrogante, o juiz arbitrário, o parlamentar petulante. É lei a favor do pequeno, do humilhado.

As muralhas que as instituições corporativas erguem contra a lei , a partir de suas casamatas de privilégios na ativa e na aposentadoria, são um verdadeiro insulto a povo e denunciam o propósito intrínseco de abusar da posição de autoridade. É um argumento absolutamente hipócrita que a lei viria criar obstáculos para promotores (Lava Jato) e juízes, como essa corporativa associação de magistrados alega. Enfim, o batalhão dos concursados não quer saber de proteger o povo contra abusos. Quer continuar abusando.

A sanção está nas mãos de Bolsonaro, mas terá a última palavra do Congresso. O artigo que Bolsonaro adiantou que vetará é irrelevante: diz respeito a colocar algemas em suspeito sem autorização judicial. Já os artigos que Moro quer vetar são relevantes. Afetam pontos essenciais. O problema é que Moro não tem moral para vetar nada. Ele aparecerá na história como o juiz que mais violentou os códigos judiciais brasileiros, inclusive na cumplicidade com os procuradores da Lava Jato, que violaram juntos ritos de processos.

Querem uma justificativa para a sanção da lei? Basta uma. O terrível drama do reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Luís Cancellier, levado ao suicídio em face de uma perseguição implacável da Polícia Federal por motivo fútil. E a jovem de 16 anos, no Pará, que a juíza Clarice Andrade mandou para a cadeia com 27 homens, durante 20 dias, num dos casos mais escabrosos de abuso de autoridade na história do país. Em ambos os casos as punições foram pífias diante da gravidade do crime.

Seria a Globo, por sua cobertura manipulada da lei contra o Abuso de Autoridade, favorável a estupros de meninas de 16 anos na cadeia? Não. Certamente que não. A Globo não é tão cruel. O problema da Globo é que ela deve ter rabo preso com o sistema judiciário. Ela está comprando a boa vontade de juízes e promotores para apagar rastros de crimes.

financeiros realizados ou por realizar. A cobertura que deu e ainda dá à Lava Janto vai na mesma direção. Ela jamais fez jornalismo investigativo. Fez jornalismo declaratório.

É interessante que tudo isso, inclusive o estímulo implícito ao abuso de autoridade, vai no pacote de manipulações que a Globo serve à população brasileira. Muitos pensam que a violação dos princípios da liberdade de imprensa se referem apenas a notícias mentirosas. Não. Muitas vezes a manipulação, com conseqüências ainda piores que a mentira, está na omissão. E nisso a TV Globo é craque, como se vê. Mas temos que esperar, sobre abuso de autoridade, o que o Congresso, em processo de recuperação de sua dignidade, decidirá após a decisão de Bolsonaro.