Por Miranda Sá

“Não há nada que dominemos inteiramente a não ser os nossos pensamentos” (René Descartes)

Ficaria faltando alguma coisa se depois que escrevi o artigo “Psicologia”, não trouxesse para o meu selecionado grupo de leitores um texto sobre Filosofia. Faço-o fugindo da riqueza que o mundo antigo nos deixou com o saber da China e da Índia e, para nós, ocidentais, o magnífico legado da Grécia Antiga.

É preciso navegar no mar tempestuoso da pandemia, enaltecendo o pensamento moderno, que o filósofo e matemático René Descartes criou quando a Ciência e a Tecnologia ainda engatinhavam de fraldas.

O monumento filosófico erguido por Descartes tem uma lápide com o enunciado que resume a consciência dos novos tempos: “penso, logo existo”.

Para os mais exigentes, está no perfil deste pioneiro da moderna filosofia que ele era um católico praticante, mas multisciente e erudito o bastante para aceitar e adotar as condenadas heresias de Galileu, que expôs no seu livro “Le Monde”, descrevendo a rotação da Terra e negando o geocentrismo obscurantista.

Quase uma leitura obrigatória, destacam-se na sua obra “Discurso Sobre o Método” e “Meditações”, livros em que explica a chamada “dúvida cartesiana”, a base do seu pensamento filosófico.

Bertrand Russel salienta que essa teoria é tão audaciosa que se estende à Aritmética e à Geometria, considerando-as passíveis de dúvida, seja na contagem dos quadrados, seja numa simples operação de somar.

A busca de explicações além do que se pode comprovar pelos sentidos foi um tema que se seguiu depois dele, aceita por Spinoza e todos demais filósofos, até Kant. John Locke, por exemplo, reforçou a dúvida cartesiana com o seu empirismo, exemplificando:

– “Suponhamos que a mente é, por assim dizer, um papel em branco, sem nada escrito, sem nenhuma ideia; de que forma, então, ela se enche? ”. E conclui magistralmente: – “Pela experiência, que encerra todo o conhecimento pessoal”.

O romancista e pensador francês André Gide deixou uma marca indelével sobre a acumulação da experiência resumindo como um princípio: – “Crê nos que buscam a verdade. Duvida dos que dizem tê-la encontrado”. E o genial cineasta norte-americano Orson Welles, ator, diretor e escritor, reforça: – “É preciso ter dúvidas. Só os estúpidos têm uma confiança absoluta em si mesmos”.

Vemos com estas intervenções que a Filosofia não é monopólio de ninguém; está ao alcance de quem queira estudar, e mais, de quem queira pensar; dar atenção a um fato, ou a uma teoria, meditar questionando hipóteses e concepções gerais é um exercício mental que se faz sem querer e muitas vezes até sem sentir…

Mesmo assim, para resolver problemas difíceis não há métodos fáceis; ou ocorre espontaneamente na cabeça de alguns privilegiados, ou se encobre com teorias triviais. O genial Shakespeare deixa isto explícito pondo na boca de Romeu que “há mais coisas entre o céu e a terra do que pode imaginar nossa vã filosofia…”.

A palavra Filosofia dicionarizada é substantivo feminino, que vem do grego antigo “Philosophia” e significa: “philo”- amizade, amor, afeição e “sophia” – sabedoria; definida como o conjunto das reflexões racionais de cada indivíduo, para entender a realidade. Atribui-se a Pitágoras de Samos a invenção da palavra, que a usava como “apreço ao saber”.

A valorização do saber é levada muito a sério pelos filósofos consagrados e assim se impõe. Outro dia, numa troca de mensagens no Twitter, os protagonistas citaram a Coleção “Os Pensadores”, uma excelente publicação da antiga Editora Abril, e dela colhi que todos apresentados – sem exceção -, enaltecem o conhecimento.

No Brasil que está vivendo sob o triunfo (aparente) da mediocridade, enche-nos de pena ao ver os “filósofos da televisão” e os “filósofos da política” com suas certezas estúpidas sobre tudo, levando a Filosofia ao ridículo. Vê-se que não assistiram a aula inaugural da Etiologia e assim não aprenderam a primeira lição dada:

“O ignorante afirma, o sábio duvida e o sensato reflete”.


MIRANDA SÁ – Jornalista profissional, blogueiro, colunista e membro do Conselho Editorial do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como a Editora Abril, as Organizações Globo e o Jornal Correio da Manhã; Recebeu dezenas de prêmios em função da sua atividade na imprensa, como o Esso e o Profissionais do Ano, da Rede Globo.