Por Amirah Sharif –

Hoje vi um louva-a-deus. Os antigos acreditavam que encontrá-lo era sinal de sorte, pois ele indicaria o caminho para algo ou alguém perdido nas matas. O inseto ganhou esse nome, porque, pousado, lembra uma pessoa orando.

Louva-a-Deus (Mantis religiosa) - Klima Naturali™

Bonzinho e predador

O louva-a deus é um inseto de corpo alongado e estreito e é facilmente confundido com talos de plantas. Embora sua aparência transmita a sensação de bicho mais bonito, inofensivo e calmo do reino animal, pasmem! Segundo uma pesquisa publicada no The Wilson Journal of Ornithology, o louva-a-deus ou cavalinho-de-deus é um forte predador capaz de comer pássaros, lagartos, aranhas, cobras e até ratos, no entanto, não oferecem riscos aos seres humanos. E eu achava que o louva-a-deus era tão bonzinho…

Ommmmmmm

Espiritualmente falando, o louva-a-deus é o símbolo da meditação pacifica, do silêncio na oração e da atenção plena.

Na China e no Japão, o louva-a-deus é reverenciado por seus movimentos graciosos e formas contemplativas, inclusive, até inspirou dois estilos conhecidos de antigas artes marciais chinesas.

Antes de atacar, eles observam atentamente seus alvos e são conhecidos por fazer poses estratégicas. Esta atitude pode ser associada ao símbolo popular de equilíbrio e paciência, portanto, diz a sabedoria popular que, ao avistarmos um louva-a-deus, pode ser muitas vezes a maneira de o Universo nos dizer para irmos mais devagar e com atenção.

Fiquei pensando no que é ser bonzinho, no que é ser uma pessoa boa. O louva-a-deus me levou a esta reflexão.

Buda e o rei

Certo dia Gautama Buda estava sentado com seus discípulos quando o rei de um dos vilarejos das redondezas se aproximou e perguntou:

– Mestre, desde que me tornei seu seguidor, todos estão me explorando. Eles estão tirando vantagem indevida da minha calma. Antes de me tornar seu seguidor, todos tinham medo de mim, porque eu era muito cruel. Eu não pensaria duas vezes em condenar alguém à pena de morte, mas depois de me tornar seu seguidor, não tenho vontade de punir ninguém, nem fico com raiva. Eu me tornei pacífico e olho para todos com compaixão, mas algumas pessoas estão se aproveitando da minha bondade. Isso também colocou meu povo em perigo e, assim, estou enfrentando muitos problemas na governança de meu reino. Por favor, me diga o que devo fazer agora.

A estória

Ao ouvir o rei, o Buda contou uma estória que começa assim:

-“Era uma vez uma cobra venenosa, que vivia num buraco debaixo de uma grande árvore, que ficava à beira da estrada em um campo perto de uma aldeia. A cobra atacava qualquer um que se atrevesse a chegar perto e muitas pessoas morriam por causa da sua mordida fatal. As pessoas tinham pavor de se aproximar da árvore, pois morriam de medo da cobra. Um dia, um monge estava passando pela aldeia e viu aquela linda árvore. Decidiu, então, meditar sob sua sombra antes de seguir em frente. Alguns aldeões viram o monge e o alertaram sobre a cobra. Contaram que a cobra era tão perigosa que mordia qualquer um que se aproximasse dela. O monge sorriu e continuou a caminhar em direção à árvore. Os aldeões seguiram seu caminho. Chegando lá, o monge se sentou e começou a meditar, quando, de dentro do buraco, apareceu a cobra sibilando furiosamente pronta para dar o bote. Enquanto entoava seu mantra, o monge olhou no fundo dos olhos da cobra e magicamente começaram a conversar. A cobra perguntou como o monge ousava se sentar ali em seus domínios sem ter medo dela. O monge respondeu com compaixão e lhe disse que nada deveria temer, porque não tem medo da morte e nem tem desejo de viver além do necessário, então quando fosse a hora, partiria em paz. Na verdade, é a cobra que teme que tirem sua vida, por isso morde todos que se aproximam. A cobra ficou atônita, porque até então ela só havia conhecido pessoas que, ou queriam matá-la, ou fugiam de medo dela, mas nunca conheceu alguém que não a temesse e que se dispusesse a conversar com ela. A cobra, então, se enrolou e pousou a cabeça aos pés do monge dizendo que ele estava certo. Contou-lhe que, se não fizesse isso, as pessoas a matariam. O monge concordou com a cobra e lembrou-lhe que a vida irá acabar um dia, quando chegar a hora. Sendo assim, não é apropriado sair matando todo mundo por medo. É necessário ter mais amor no coração. Em seguida, o monge se levantou e partiu. A cobra, então, refletindo sobre as palavras do monge, decidiu que abriria mão de sua natureza raivosa e não morderia mais ninguém. As pessoas quando perceberam que a cobra não mordia mais pararam de sentir medo, aqueles que antes fugiam apavorados passaram a perseguir a cobra, apedrejavam-na, davam pauladas e faziam todo o tipo de maldade. A cobra se sentia triste e sozinha. Certo dia, o monge voltou e se surpreendeu ao ver como a cobra estava maltratada e triste. Ela contou que, desde que passou a seguir seu ensinamento para abandonar a violência e deixar de morder as pessoas, todos a têm machucado. Desde que adotou uma conduta boa e pacífica, sem procurar ferir ninguém, ninguém a respeitava e a machucavam o tempo todo e a sua vida tinha se tornado muito difícil. O monge, então, lhe disse que ela o havia interpretado mal. O conselho era para ela parar de morder todo mundo e não parar de se defender, quando necessário.”

Depois de contar essa estória para o rei, Buda lhe perguntou:

– Será que você não está interpretando meu conselho da mesma forma que a cobra? Eu lhe disse para desistir de sua natureza cruel, mas não para desistir do seu dever de rei. Você tem que cumprir seu dever como governante sendo firme, para que possa disciplinar todos em seu reino, para que as pessoas possam viver pacificamente e não sintam nenhum tipo de insegurança. Você precisa cumprir com suas responsabilidades sendo firme em suas ações e macio no seu coração.

Portanto, você deve governar como um monge por dentro e como um rei por fora.

Reflexão para votar

Nós temos de votar em pessoas boas, comprometidas com um projeto social que erradique a fome, reduza a desigualdade social, amplie a oferta de emprego, restitua a dignidade aos trabalhadores , defenda os povos da floresta, defenda o meio ambiente, defenda os animais. E para pleitearmos mais direitos para os animais, os humanos têm de viver dignamente, porque me disseram certa vez e é verdade que “gente feliz não incomoda”.

Bora votar certo, com o coração!

AMIRAH SHARIF é jornalista, advogada, protetora dos animais e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. asharif@bol.com.br

Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com


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