Ricardo Cravo Albin –
“Centrão é mesmo tudo em “ão”, começando por corrupção e terminando por traição” (Artur Xexéo)
Não é de hoje que o Centrão da Câmara vem causando dores de cabeça a quase todos os presidentes. À esquerda ou à direita, desde o notório Eduardo Cunha, seu fundador. Mesmo assim, os escândalos nunca cessaram, acionados por quadrilhas que nas eventuais partilhas de apoio político sempre deferiram ao Ministério da Saúde a preferência de nomeações no governo. Ou seja, a cobiça dos farejadores em cima do botim mais fácil de ser assaltado. Porque saúde é quase sempre, como comida e habitação, necessidade urgentíssima.
Elencando apressado resumo dos males da saúde, vale reconferir: em 2004 aflorou a máfia dos vampiros (horrenda fraude para compra de remédios). Em 2006, a Operação Sanguessuga da PF chocou o país ao desarticular quadrilha que desviava dinheiro para compra de ambulâncias. Nos anos posteriores a Lava Jato revelou roubalheira na Saúde do Rio, que continuou provocando até a queda recente do Governador do Estado. O quadro estava mesmo apetitoso: a pandemia em progressão geométrica, milhares de mortes, urgência urgentíssima de vacinas.
Ora, ora, Bolsonaro foi eleito porque acenava uma bandeira contra corrupção, arrolando não apenas a saúde, mas todos os desvios que assaltaram o país, do mensalão ao petrolão. O Centrão sempre foi apontado por ele como o nefasto apoio político dos seus antecessores, que exalava desvios e malfeitos. Também a Lava Jato e o Juiz Moro foram proclamados modelos a serem seguidos fielmente.
E o que fez nosso ingênuo Capitão? Passou da possível boa-fé e da ingenuidade ao político ladino como os demais apontados por ele. Logo o presidente passaria para o Centrão de armas e bagagens, alegando governabilidade. O pior a decepcionar seu eleitorado foi desconstruir sem dó nem piedade um brasileiro considerado herói, o Juiz de Curitiba e sua fortaleza anticorrupção, a Lava Jato. A hipocrisia na derrubada de Moro também avariou severamente a credibilidade do STF, para perplexidade da nação.
O Capitão queria porque queria ter às mãos a Política Federal e o Ministério Público, além de abortar a candidatura de Moro à Presidência na sua sucessão, desejada desde sempre por ele mesmo.
Nem me atrevo aqui a reconstruir a sucessão dos desastres que gerou o agravamento da pior pandemia que o Brasil sofreu, nunca controlada pela cobiçada pasta da Saúde. Até porque peço licença para informar que em dias breves sairá o livro “Pandemia e Pandemônio” – Relatos indignados de um país doente (Editora Batel), em que este inconformado cronista detalha semana à semana toda a história da peste que se armou em 2020. Com observações de Margareth Dalcolmo, Nélida Piñon e Jerson Lima (cientista-presidente da FAPERJ).
Mas me atrevo, sim, a insistir que qualquer governo, mesmo sem gestão eficaz, tem que enfrentar e empunhar armas contra a corrupção. Especialmente quando a única defesa do Presidente era a de ser um cidadão limpo e honrado. Quando denúncias aparecem, não apenas uma mas várias, não me parece cabível acusar os denunciantes. Muito ao contrário, o Chefe da Nação seria o primeiro a se pôr ao lado dos defensores do país, quando esses suspeitam de roubalheiras e as apontam. Mesmo que fossem antagonistas políticos, como boa parte da CPI, esperava-se de um presidente correto apurações rigorosas, sejam os investigados amigos seus, correligionários ou mesmo colegas de armas. Até parentes.
Expoente do Centrão, o ex-Ministro da Saúde (de Temer) e líder do governo na Câmara Ricardo Barros está à testa de um revoltante escândalo a contaminar toda a governança. Que não pode se manter em silêncio e em inação. Tal como o empresário Wizard no impudico mutismo na CPI, muito mais contra ele que a favor de sua defesa.
Embora eu não acredite pessoalmente que Lira e Aras deem prosseguimento a um impeachment, alguma satisfação o país reclama. De imediato, pelo óbvio, o afastamento do líder do governo na Câmara, além do saneamento no Ministério da Saúde. E de intermediários picaretas que aparecem a cada dia.
Pelo amor de Deus, cabe ao presidente determinar a porta vozes afoitos (ou melhor, desastrados) não repetir o insulto à opinião pública, como a fala do canastrão Onix Lorenzoni ao declarar que tudo entrou nos seus lugares e está tudo encerrado, porque a covaxin não foi comprada e seus gulosos intermediários a pedir comissão foram afastados. Agora até estranhíssimo reverendo foi anunciado ontem como novo intermediário para o maná das vacinas. Todos a descobrir que a Ilha do Tesouro estava bem ao nariz dos corruptos, os imunizantes.
Urgentíssimos, afinal vidas não têm preço.
RICARDO CRAVO ALBIN – Jornalista, Escritor, Radialista, Pesquisador, Musicólogo, Historiador de MPB, Presidente do PEN Clube do Brasil, Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
MAZOLA
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