Redação

Herdeiros do fundador do hotel entraram com recurso alegando suspeição do administrador da recuperação judicial.

O administrador judicial que supervisionou o processo de venda do hotel Maksoud Plaza atuou em pelo menos duas ocasiões como advogado dos compradores do prédio e de seus familiares.

Oreste Nestor de Souza Laspro foi nomeado em 2020 administrador judicial no processo de recuperação judicial do icônico hotel paulistano. Nessa função, ele auxilia na condução da ação judicial e fiscaliza o cumprimento das etapas da recuperação, de modo a garantir que a empresa consiga se viabilizar novamente.

Laspro foi procurado por email e por telefone, mas não respondeu até a publicação da reportagem. O hotel fechou as portas na manhã do dia 7 de dezembro, após 42 anos de funcionamento. O anúncio pegou trabalhadores e hóspedes de surpresa.

Na função de administrador da recuperação judicial do Maksoud, ele também foi chamado a dar um parecer em um incidente –um tipo de processo paralelo ao da recuperação judicial, ligado ao principal– que terminou com um acordo pela conclusão da venda do prédio.

Nesse procedimento, os interessados no acordo pela conclusão da venda eram Jussara e Fernando Simões, os irmãos que arremataram o prédio do hotel em um leilão na Justiça do Trabalho em 2011. Uma sucessão de discordâncias dos termos da arrematação vinha impedindo que eles tomassem posse do imóvel.

Jussara e Fernando são acionistas da Simpar, que controla a JSL (de logística). As duas empresas têm entre seus acionistas o próprio Fernando e outros membros da família Simões, segundo consta em suas páginas dedicadas às relações com investidores.

As ligações de Laspro com a família dos compradores são pelo menos duas. Em 2015, ele atuou como advogado de Fernando Simões, da JSL e da Simpar em um processo de arbitragem concluído em 2017.

Depois, até julho de 2019, atuou como advogado da Locar Guindastes e Transportes Intermodais em uma arbitragem que discutiu a responsabilidade da empresa e da construtora Norberto Odebrecht no acidente que deixou dois mortos na construção da Arena Corinthians, em 2013.

A empresa foi fundada por Julio Eduardo Simões, irmão de Jussara e Fernando Simões, os compradores do prédio do Maksoud.

Na manifestação sobre a venda imóvel onde funcionava o hotel, Laspro disse não ver motivos para se opor à homologação do acordo, “tendo em vista que, salvo melhor juízo, não há impedimento contratual, legal ou judicial à sua celebração.”

Esse procedimento correu na Justiça de São Paulo de maneira sigilosa e é criticado pelos herdeiros do Maksoud que, assim como os credores, não participaram da mediação.

Henry Maksoud Neto, sócio da HM Hotéis e representante da Hidroservice Engenharia, empresas envolvidas na venda do Maksoud, disse ao jornal Folha de S.Paulo em dezembro que o procedimento foi solicitado pelo juiz do processo de recuperação judicial, e que apenas colocou fim a uma disputa que não vinha sendo favorável ao grupo.

A contestação do leilão no qual os irmãos Simões arremataram o prédio chegou ao TST (Tribunal Superior do Trabalho), onde o grupo Maksoud foi derrotado.

Os irmãos Claudio e Roberto Maksoud, herdeiros do fundador do hotel e que se opõem a Henry Maksoud Neto, atual administrador do grupo, dizem que a venda do prédio ocorreu “por preço vil, e foi decidida por alguém que tem participação de apenas 0,01% no capital da empresa proprietária do ativo”.

O preço vil a que os irmãos se referem soma R$ 132 milhões —segundo eles, o imóvel valeria R$ 300 milhões.

Na terça (18), eles entraram com um recurso judicial no qual pedem a suspensão definitiva e a anulação da venda do prédio a partir do que consideram ser falta de imparcialidade de Laspro, que não teria comunicado, no processo, já ter advogado para um dos compradores.

Advogados ouvidos pela Folha de S.Paulo dizem que o ideal teria sido Laspro ter comunicado que seu escritório já tinha atuado em processos de pessoas ou grupos interessados na recuperação judicial, para que o juiz avaliasse se havia ou não suspeição.

“Além de todas as demais irregularidades que cercaram a alienação do prédio, o administrador judicial que recomendou a homologação da venda na recuperação judicial já foi advogado do comprador do prédio, de seus familiares e de suas empresas, em passado recente”, disseram os irmãos Maksoud, em nota.

Nesta sexta (21), o juiz João de Oliveira Rodrigues Filho, da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo, negou liminarmente o pedido e afirmou considerar que não existe suspeição. Na decisão, ele escreveu que o acordo homologado não é uma operação de compra e venda, “e sim uma transação para colocar fim ao litígio envolvendo a arrematação realizada por Fernando Antônio Simões e Jussara Elaine Simões perante a Justiça do Trabalho e há mais de 10 anos.”

Em relação ao mesmo pedido, o desembargador Grava Brazil, do Tribunal de Justiça de São Paulo, também negou o recurso dos irmãos para suspender a homologação do acordo.

Em manifestação por escrito, os empresários Fernando Simões e Jussara Simões afirmam que o imóvel onde o Maksoud Plaza funcionava foi arrematado em 24 de novembro de 2011 e não envolveu as atividades exercidas no local.

“O administrador judiciário foi nomeado pelo juiz responsável pela recuperação judicial, em setembro de 2020, e não houve qualquer questionamento sobre seu impedimento”, disseram. Eles não comentaram a suspeição levantada pelos irmãos que se opõem à venda do Maksoud.

A Locar disse não ter nenhuma relação com o prédio arrematado. A JSL afirmou não ter relação com o imóvel sob disputa. “Em conjunto com outros advogados, o dr. Oreste Laspro atuou em uma ação ajuizada pela companhia, que foi encerrada há cerca de cinco anos (2017).”

Ricardo Zamariola, advogado de Claudio Maksoud, disse que o recurso pela suspeição ainda não foi analisado pelo desembargador Araldo Telles, a quem coube a decisão de suspender a entrega no prédio aos irmãos Simões em meados do mês de dezembro. “A discussão está longe de terminar e o herdeiro Claudio irá às últimas consequências para impedir que a venda irregular do imóvel seja consumada”.

Os irmãos Claudio e Roberto conseguiram, em 17 de dezembro, adiar a entrega do prédio até o fim de janeiro, por meio de um agravo de instrumento. A decisão provisória suspendeu a posse dos compradores e determinou que o prédio fosse lacrado, para evitar a retirada de móveis e outros bens.

Como administrador da recuperação judicial, Laspro foi ao hotel no dia seguinte à decisão do desembargador Araldo Telles, onde constatou a retirada de bens do local. Em manifestação encaminhada à 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, ele disse que “de modo a resguardar o cumprimento da decisão”, acionou a Polícia Militar e registrou boletim de ocorrência.

Na segunda (17), o juiz Rodrigues Filho, da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais, reconsiderou a decisão de encerramento da recuperação judicial e determinou o período de supervisão por dois anos.

Henry Maksoud Neto disse, em nota, que a decisão é “absolutamente normal e condizente”. O presidente-executivo do grupo afirmou que o plano apresentado no processo já previa que a recuperação só terminaria após a quitação integral dos pagamentos dos credores trabalhistas.

“A nova decisão não interfere de maneira nenhuma nos planos do grupo Maskoud, de seguir atuando na prestação de serviços e licenciamento de suas marcas, sua origem empresarial, focados em Hotelaria e Empreendimentos Imobiliários com sua marca e know-how.”

Fonte: Folhapress


AGENDA

Tribuna recomenda!