Por Carlos Mariano

Quando se fala de Hildemar Diniz, mais conhecido no mundo do samba como Monarco, é claro que vem à nossa mente, sua linda história de amor com a nossa querida Portela, a maior vencedora do carnaval carioca. Mas, ao falar do grande sambista e poeta que nos deixou recentemente, não podemos esquecer de falar da sua história em outra escola – que não tem os títulos da águia de Oswaldo Cruz e nem fama mundial, mas tem muita tradição e samba no pé. Estamos falando da nossa querida Unidos do Jacarezinho.

Monarco ao participar de desfile da Unidos do Jacarezinho afirmou que a escola é uma das suas grandes paixões, ao lado da Portela. (Reprodução/Tv Globo)

No Jacarezinho, Monarco fez jus ao seu apelido de nobreza e foi um autêntico rei no Jacaré. Em 1967, quando a Rosa e Branco ainda debutava como escola de samba nos grupos de acesso, Monarco escreveu “Exaltação a Frei Caneca”, um bonito samba que rendeu à escola o título de campeã do Grupo 3. Já em 1969, Monarco fez seu primeiro clássico no Jacaré: “História de Vila Rica do Pilar”. Com esse belo samba, o Jacarezinho galgou o segundo lugar do Grupo 2 de acesso daquele ano e conseguiu pela primeira vez chegar ao Grupo 1 das grandes escolas de samba do Rio de Janeiro. Essa obra-prima de Monarco está registrada, no disco: “A voz do samba” que ele lançou em 2013.

O America Football Club lamentou o falecimento de um dos maiores nomes do samba nacional e grande americano. (America Football Club/Reprodução)

Em 1982, Monarco fez outro clássico para o Jacarezinho, trata-se de “Geraldo Pereira, eterna glória do samba”, uma canção lindíssima que homenageava um dos maiores compositores negros da história da música popular brasileira: Geraldo Pereira. Interessante de analisar nesse samba é que a construção e feitura dele não seguem os padrões dos sambas-enredo da década de 1980. Ele guarda características dos sambas- feitos nos anos de 1950 e 1960, nos quais Monarco se tornou compositor de samba enredo.

Noca, Casquinha, Monarco e Manacéia. (Reprodução)

Dentre as características marcantes desse samba de Monarco está o romantismo que ele usa para homenagear o gênio da raça, Geraldo Pereira – um dos fundadores da Estação Primeira de Mangueira e compositor preferido de Cyro Monteiro – um grande cantor e sambista da nossa história. Esse romantismo norteia toda a poesia e prosa da letra e melodia do samba.

A figura de Geraldo é idealizada por Monarco, como a raiz da música brasileira. Outro traço marcante no samba é sua solenidade melódica, típica dos sambas-enredo antigos, que têm no grande imperiano Silas de Oliveira seu maior nome. Essa solenidade é que forja a beleza do samba e nos faz emocionar profundamente.

Monarco disse que compositores desistiram dos próprios sambas na Portela ao ouvir a ”melodia forte” do compositor e instrumentista Manacéia. (Crédito: Wanderlei Pozzembom/Reprodução/Set.1990)

Embora o saudoso Monarco tenha tido uma relação de amor incondicional com a grande Portela, na Azul e Branco ele nunca teve um samba seu como hino da escola, tal situação levou uma crítica jocosa de Natalino José do Nascimento, o velho Natal, eterno patrono da Portela. O lendário bicheiro teria dito a Monarco, depois de ouvir um dos seus lindos sambas, que o compositor ganhou no Unidos do Jacarezinho, que Monarco lá rosa e branco fazia samba-enredo de verdade, bonito e bom, e que na Portela, ele só fazia sambas ruins. Seria esse o motivo de sempre perder nas finais de competição de samba da Águia. É claro que, nessa declaração de Natal, há um pouco de inveja dos sambas que Monarco fez para a Jacarezinho. Fato é que, quis o destino, que Monarco nunca tivesse um samba-enredo seu cantado na avenida pelos portelenses.

Azar da Portela e muita sorte da humilde Jacarezinho que pode ter na sua história verdadeiros clássicos do samba-enredo composto pelo compositor. Lá, Monarco foi rei, e não só na arte do samba, foi também presidente do Unidos do Jacarezinho entre os anos de 1993 e 1994.

Ou seja, Monarco foi um autêntico monarca na comunidade do Jacarezinho.

Mestre Monarco e o jornalista Daniel Mazola na sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), centro do Rio de Janeiro. O primeiro emprego de Monarco, foi como contínuo da ABI. Ele contava que uma de suas funções era comprar os jornais preferidos do maestro Villa-Lobos, que quase diariamente jogava sinuca no “Onze” da ABI — área de lazer no décimo-primeiro andar daquele edifício eternamente moderno, projetado pelos Irmãos Roberto. (Crédito: Iluska Lopes/Tribuna da Imprensa Livre)

CARLOS MARIANO – Professor de História da Rede Pública Estadual, formado pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), pesquisador de Carnaval, comentarista do Blog Na Cadência da Bateria e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.


AGENDA

Dia 22 de dezembro, quarta-feira, a loja de vinhos IPANEMA WINE BAR realiza o lançamento de “Crônicas Subversivas”, do historiador Lincoln de Abreu Penna, colunista e membro do Conselho Editorial do jornal Tribuna da Imprensa Livre. O livro é um apanhado de crônicas e pequenos ensaios cuja maioria foi publicada aqui na Tribuna da Imprensa Livre. “Os princípios da legalidade e da soberania nacional marcaram a minha geração, voltada para o culto dos valores democráticos e libertários”, destaca o autor. O lançamento acontece às 19h e haverá bate-papo com o autor. A IPANEMA WINE BAR fica na Rua Gomes Carneiro, 132, loja 112 em Ipanema, Rio de Janeiro. Contatos: (21) 3798-1169 / 97614-6144 / 98846-5176 / ipanemawinebar@gmail.com

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NOTA DO EDITOR: Quem conhece o professor Ricardo Cravo Albin, autor do recém lançado “Pandemia e Pandemônio” sabe bem que desde o ano passado ele vêm escrevendo dezenas de textos, todos publicados aqui na coluna, alertando para os riscos da desobediência civil e do insultuoso desprezo de multidões de pessoas a contrariar normas de higiene sanitária apregoadas com veemência por tantas autoridades responsáveis. Sabe também da máxima que apregoa: “entre a economia e uma vida, jamais deveria haver dúvida: a vida, sempre e sempre o ser humano, feito à imagem de Deus” (Daniel Mazola). Crédito: Iluska Lopes/Tribuna da Imprensa Livre.