Por Pedro Augusto Pinho –

O Brasil é um continente. A Europa, excluída a Rússia e os poucos países eslavos orientais e de escrita cirílica, tem 4.906.201km². Se fosse um país seria o sexto maior do mundo, menor do que o Brasil (8.515.767 km²), abaixo da Austrália e mais próximo da Índia (3.287.590 km²).

Porém o Brasil, diferentemente dos que lhe são mais extensos, pode ser inteiramente ocupado por seus habitantes, não tem áreas de geleiras nem desérticas que dificultem a permanência humana. E mais: o Brasil é um verdadeiro celeiro mundial, pelas terras férteis, abundância de água, insolação por todo ano e disponibilidade de tecnologia agrícola. Além da autossuficiência energética e de minerais estratégicos para seu desenvolvimento industrial.

Cabe então perguntar: por que o Brasil não ocupa melhor posição no mundo, entre aqueles países ditos desenvolvidos?

Uma parte da resposta pode ser encontrada na locução de Glauber Rocha (https://youtu.be/nzeVQ9tyCLI), o maior cineasta brasileiro: nossas elites são culturalmente colonizadas, não formaram um pensamento próprio, acomodam-se em repetir as asneiras que as potências colonizadoras nos ensinam e nos massacram pela educação, nas mídias e em comportamentos alienados – a pedagogia colonial.

E temos a acrescentar que nossas elites, como as estadunidenses, porém com muito menor êxito, engessaram o poder numa plutocracia – o governo dos endinheirados.

Mas os Estados Unidos da América (EUA), filho do capitalismo financeiro inglês, teve a elite que engessou a sua constituição num modelo de progresso controlado, para evitar insurreições, enquanto a brasileira expulsou José Bonifácio de Andrada e Silva, autor do primeiro e verdadeiro marco da independência – que só veio efetivamente a ocorrer em 1930, com Getúlio Vargas – o “Projeto para o Brasil” de 1822, que lhe valeu o exílio em 1823. Do Patriarca: “O Imperador, dissolvendo a Assembleia e deportando seus deputados, mostrou energia aparente; mas não é pela violência que se remediam males de opinião – foi um mau exemplo, que compromete o futuro. Esta dissolução, fora de tempo, foi obra do orgulho e da vaidade, de intrigas e ódios ridículos, e talvez das insinuações do agente da Áustria” (José Bonifácio, “Projetos para o Brasil”, Companhia das Letras, SP, 1998).

A referência à Áustria tem um sentido mais profundo e que demonstra a pedagogia colonial em plena ação no Brasil. Na época da nossa independência, o chanceler austríaco era o Príncipe de Metternich (1821-1848), sob Francisco I. Ele foi um dos articuladores da Santa Aliança, pacto firmado no Congresso de Viena (1815) para a defesa do absolutismo monárquico, o que agradava à realeza portuguesa.

É sempre importante ver além do que a pedagogia colonial nos doutrina, nos informa. O conhecimento do que cerca o evento, que dá origem aos fatos é muito importante e sempre tem raízes que não interessam ao poder ser reveladas.

E aí que ligamos o Brasil ao que nos parece tão distante: uma guerra na Europa, num país muito pouco conhecido, ainda menos a sua história, e que apenas serve de palco para guerra, pois a luta é de um mundo que desaba (o financeiro apátrida) contra um que desponta (da Rota da Seda, dos BRICS).

Desde a década de 1980, o sistema financeiro obteve vitórias importantes: primeiro as desregulações, ou seja, a ausência de controles estatais para suas movimentações, o que levou ao enorme crescimento de paraísos fiscais (de menos de uma dezena para 85, hoje) e ao ingresso no sistema legal dos capitais, daqueles que têm origem em crimes, assim considerados pelas legislações nacionais e acordos internacionais (tráfico de drogas e de armas, contrabando de pessoas e órgãos humanos, corrupção, entre outros). Depois com isenções tributárias para diversos ganhos de capital e o mínimo rigor em lançamento de títulos financeiros, que levou à profusão de papeis sem qualquer lastro que hoje abundam no sistema bancário. Para que se tenha a dimensão deste problema, analistas econômicos, como o alemão Instituto Schiller, com membros em 50 países, estimam que haja sem suporte em bens reais, ou seja, papéis que nunca poderão ser resgatados, embora constituam parte de quase todos fundos financeiros comercializados por bancos e financeiras, o montante equivalente a vinte Produtos Nacionais Brutos (PNBs) de todos os países do mundo. É a nova crise financeira, muito superior àquela de 2008/2010, que está, como imenso tsunami, chegando a todas as nações.

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) tinha o objetivo de colocar os EUA na Europa Ocidental para “defende-la” do comunismo, controlar a militarização europeia e recuperar os dispêndios com o Plano Marshall. Deixou de ter sentido com a União Europeia, desde o Tratado de Maastricht (1992) e menos ainda com o Tratado de Lisboa (2007), que possibilitou atingir 27 membros, com o fim da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), em 1991, e menos ainda com o domínio das finanças apátridas em quase todo mundo ocidental, no Oriente Médio e em países africanos e do Pacífico.

Países que não se submeteram a este império financeiro foram rotulados de terroristas, ditaduras e “do mal” (sic).

Porém a realidade é muito mais presente que todas as ideologias e falácias construídas pelo poder.

Este poder financeiro é estéril, isto é, ele não produz bens reais, apenas os faz convergir para poucos. É absolutamente concentrador de patrimônio e renda.

Ora, um importantíssimo motor do desenvolvimento, da prosperidade, seja o sistema capitalista ou socialista, é o consumo: o mais eficaz sistema de controle. O modelo concentrador das finanças apátridas, sem compromisso com qualquer país que seja, começa a fazer água exatamente pela falta do consumo. Menos empregos, menores salários, tributação para rendas que não sejam financeiras, após 30 anos em vigor, só pode continuar se mantendo pela guerra. Exemplos históricos, em menores escalas, hoje universais pela cibernética, pela aplicação da teoria matemática da comunicação, demonstram, como laboratórios, o que ocorre dentro desta forma de opressão.

Daí o nazismo explícito nesta “guerra” da OTAN. No uso de epidemias fabricadas, no absoluto desrespeito ao humano. Ainda que com discursos religiosos, de defesa da família e de valores jamais praticados como da solidariedade e da aceitação das diferenças.

E o Brasil? Sofrerá ainda que não seja diretamente atingido pela guerra. Que seus dirigentes, num rasgo de lucidez e independência, saibam o que está verdadeiramente em questão: o velho e excludente mundo, de um lado e, de outro, o mundo multipolar e mais aberto aos nacionalismos, às aceitações de diferenças.

Não podemos ter dúvida nem ilusão do que somos: um povo miscigenado, que a todos acolhe. Não nos deixamos influenciar pelos racistas do Império e da 1ª República e seus projetos nazistas de “branqueamento racial”, que agora, com o golpe de 2016, se procura ressurgir. Tão pouco pela competitividade, que coloca irmão contra irmão, acirra ódios e exclusões, quando nosso passado é do “cunhadismo” índio, como se lê em Darcy Ribeiro, do compadrismo, que o cientista e acadêmico Antônio da Silva Mello classificou de “autêntica instituição nacional, nascida desta nossa tendência para aproximação e camaradagem”, da ama de leite afrodescendente.

Pouco conhecido, mas muito significativo, foi o levantamento realizado pelo médico Roberto Jorge Haddock Lobo, em 1849, da população e sua classificação, na capital do Império, a cidade do Rio de Janeiro, a pedido do Ministro da Justiça, Eusébio de Queiroz Matoso Câmara:

“escravos africanos … 1.252 (41,2%); 

estrangeiros livres …..    798 (26,2%); 

brasileiros livres ………    558 (18,3%); 

escravos brasileiros …    410 (13,5%) e 

libertos ……………………      24 (  0,8%). 

Total da população: 3.042 pessoas”. 

Duas quantidades ressaltam de imediato: a maioria absoluta de escravos na cidade que deveria ser a mais importante e mais rica do País, e o número de estrangeiros, assim considerados também os portugueses, mais numerosos do que os próprios nacionais, os brasileiros livres e libertos.

Outra questão que devemos ter em mente, é nossa situação econômica. Em 13/12/2021, a BBC News Brasil, publicou matéria da jornalista Camilla Veras Mota, onde se lê:

“A base da pirâmide é relativamente homogênea — 90% dos brasileiros têm renda inferior a R$ 3,5 mil por mês (R$ 3.422,00) e 70% ganham até dois salários mínimos (R$ 1.871,00, para um salário mínimo de R$ 998,00 em 2019), ainda segundo o levantamento” e “a renda mensal média de quem está entre os 5% mais ricos no Brasil é de R$ 10.313,00, conforme os dados da Pnad Contínua – Rendimento de todas as fontes 2019, do IBGE”.

Conclusão: o Brasil é um país de pobres e, ainda pior, da mais injusta distribuição de renda. Tão grave é esta situação que “segundo o estudo, realizado a partir dos dados do relatório dos Grandes Números das DIRPF, 1% da população do País, o que representa aproximadamente 2,1 milhões de contribuintes, abrange donos de bens médios individuais de R$ 640 mil — incluindo, nesse valor, imóveis utilizados para residência própria. Portanto, conclui-se que são pessoas que fazem parte da classe média brasileira, e não proprietários de grandes fortunas” (Nota Técnica da Unafisco Nacional, 22 de junho de 2020). Em outras palavras, o milionário brasileiro dificilmente será uma pessoa de classe média europeia, estadunidense, talvez japonesa e de outros países asiáticos.

Logo nossa eventual adesão à OTAN, branca e rica, significa que nem mesmo temos consciência de nós próprios. E que com muita probabilidade ficaremos com a conta dos prejuízos para pagar.

E que conta é essa? A que já estamos pagando com a alienação do patrimônio brasileiro, desde a venda da Vale do Rio Doce, a maior mineradora do mundo, das siderúrgicas brasileiras, inclusive a icônica Companhia Siderúrgica Nacional, negociada por Getúlio Vargas com Franklin Roosevelt, nossas ferrovias, portos, rodovias, aeroportos, manietando nossa capacidade de circular no próprio território brasileiro, e crime dos crimes, a energia brasileira, despedaçando a Petrobrás para entregar por partes aos gestores de ativos (as finanças apátridas em paraísos fiscais), e a Eletrobrás. E ainda mais, fechando empresas indispensáveis para nossa vida, para nossa alimentação como as de fertilizantes e de energia nuclear.

Cuidado eleitor brasileiro, não vá votar em quem nos quer meter numa guerra que só nos dará ainda mais miséria. Procure saber o que a senhora Victoria Nuland, subsecretária de Estado para Assuntos Políticos do governo de Joe Biden (EUA), veio fazer dia 25 de abril próximo passado no Brasil.

E se for para lutar, lutemos pelos nossos interesses que estão com os BRICS, no mundo multipolar.

PEDRO AUGUSTO PINHO é presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET), avô e administrador aposentado.

Publicado inicialmente no Pátria Latina. Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com


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