Por Pedro do Coutto –
Pesquisa da Datafolha analisada por Fernando Canzian, Folha de S. Paulo desta quarta-feira, revela que 81% dos comerciantes de São Paulo são contrários à ideia colocada por Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, de criar uma taxa para as vendas parceladas sem juros a longo prazo através dos cartões de crédito.
Sustentam os comerciantes da capital paulista que as vendas parceladas sem juros através dos cartões correspondem a 50% das operações comerciais e que o seu fim acarretaria prejuízos em série tanto para as lojas quanto para os consumidores e para a economia brasileira.
TARIFA – A opinião de Roberto Campos Neto, acentua a reportagem, foi dada quando ele participou de audiência no Senado no dia 10 de agosto dizendo que o BC estava estudando a criação de uma tarifa para não incentivar as compras a crédito em uma grande quantidade de parcelas. Não foi colocado na ocasião o tema dos juros do rotativo, que é outro assunto. Os juros terríveis de 445% ao ano cobrados para as dívidas em atraso para o crédito rotativo são um outro assunto, não se vinculando à questão do crédito em parcelas, aparentemente sem juros.
É claro que não existem financiamentos sem juros reais. Os anúncios nesse sentido já embutem as taxas previsíveis nos preços dos produtos, movimentando-se através das engrenagens que regem as ações do próprio comércio. A questão dos juros anuais de 445% constitui um absurdo, uma agressão, que acarreta um volume altíssimo de inadimplência que está alcançando 74 milhões de brasileiros e brasileiras.
ESCALA – Não há, de fato, quem possa pagar juros dessa ordem. É impossível sustentar tal pagamento de juros em tal escala. Mas esse problema não se vincula de maneira direta às vendas parceladas com base nos cartões de crédito. São questões distintas.
O problema do crédito encontra-se não apenas na taxa de 445% ao ano, mas nas de 2,4% ao mês que, considerando-se os montantes, transformam-se em juros superiores a 30%. Como os salários estão muito longe desse índice, o que acontece? Uma dificuldade cada vez maior de suportar a incidência dos juros bancários e do crédito direto nas lojas comerciais. O problema do crédito e do endividamento é bastante complexo.
RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Daniele Madureira, Folha de S. Paulo de ontem, e Letícia Cardoso, Ivan Martinez-Vargas e Ana Flávia Pilar, O Globo, destacam que a empresa 123 Milhas ingressou com pedido de recuperação judicial na Justiça de Belo Horizonte. A dívida da empresa, revelada por ela própria, é de R$ 2,3 bilhões e, portanto, tal proposta parece ser impossível.
Ela deseja um prazo de 180 dias contra as cobranças das quais tem sido foco, especialmente pela venda de viagens para o exterior não cumpridas pela empresa. Sustento que é praticamente impossível a recuperação judicial da 123 Milhas porque o mercado em que ela atua, viagens de turismo, está completamente fechado para ela. Quem seria capaz de adquirir uma passagem junto a uma empresa que não cumpriu grande número de contratos?
Ela não tem por esse caminho condições de se recuperar. Tem que ser através de outra proposta concreta com a desmobilização de ativos. Será que ela os possui? Será que ela se dispõe a transações saneadoras desta forma? É um problema que angustia os que adquiriram direito de viajar e foram logrados pelo calote.
A impressão que se tem ao observarmos a dívida de R$ 2,3 bilhões é que a empresa sabia da impossibilidade de cumprir seus compromissos.
PEDRO DO COUTTO é jornalista.
Enviado por André Cardoso – Rio de Janeiro (RJ). Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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