Redação –
São inconstitucionais as decisões do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) e do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1) que determinaram arresto ou liberação de valores das contas do estado para atender demandas relativas a pagamento de salários, a satisfação imediata de créditos de prestadores de serviços, e tutelas provisórias definidoras de prioridades na aplicação de recursos públicos.
A improcedência, no entanto, vale exclusivamente nos casos em que essas determinações tenham recaído sobre recursos escriturados, com vinculação orçamentária específica ou vinculados a convênios e operações de crédito, valores de terceiros sob a administração do Poder Executivo e valores constitucionalmente destinados aos municípios.
Este foi o entendimento alcançado por maioria pelos ministros do Supremo Tribunal Federal, em julgamento no Plenário Virtual da Corte encerrado nesta sexta-feira (18/6).
No caso, foi examinada Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (APDF) para determinar a suspensão das decisões dos dois tribunais. A ação, ajuizada pelo governo do Rio de Janeiro, alega que essas decisões teriam violado preceitos fundamentais como os princípios federativo, da igualdade e da independência entre os poderes.
Com esses argumentos, pediu liminarmente a suspensão das decisões judiciais que determinaram o bloqueio, arresto, penhora, sequestro e liberação de valores das contas administradas pelo Executivo estadual, que, segundo o autor, até o ajuizamento da ADPF, em 2017, já haviam ultrapassado a cifra de R$ 1 bilhão.
Contas públicas
A ação é consequência, entre outros fatores, da redução das receitas dos royalties e da crise na Petrobras, que levou a uma retração de receitas substancialmente maior do que a experimentada por outros estados da federação, disse o procurador do estado ao se manifestar durante o julgamento.
De acordo com ele, atualmente tramitam na Justiça pedidos de arrestos para satisfazer diversas necessidades. Para o procurador, esses arrestos configuram, na verdade, expropriação indiscriminada de verbas públicas para pagamento de operações especificas. Os valores têm sido expropriados para pagamento de despesas escolhidas por juízes e órgãos do Poder Judiciário, tornando perceptível a violação aos preceitos fundamentais apontados na ação, concluiu o procurador.
Ao se manifestar na condição de amicus curiae (amigo da Corte), o representante da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro disse que a ação em debate busca, ao fim, uma negativa de jurisdição, ao tentar impedir que o Judiciário local, no caso o TRT-1, decida, quando a decisão atingir interesses do estado, e que tenta limitar que juiz de primeira instância ou órgão colegiado de segunda instância conceda os requeridos arrestos, que buscam garantir pagamento de salários.
Por fim, o defensor salientou que as ações com pedidos de arrestos questionadas na ação não são só para pagamento de salários, mas também para questões ligadas a saúde, hospitais, acolhimento de crianças, idosos e pessoas com deficiência.
Fundamentação
Em seu voto, a ministra Rosa Weber ponderou que o conjunto de decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região que têm resultado em bloqueio, arresto, penhora, sequestro e liberação de valores administrados pelo Poder Executivo do estado do Rio de Janeiro amolda-se ao conceito de ato do Poder público passível de impugnação pela via da ADPF.
Quanto ao tema de fundo, a ministra lembrou que o artigo 167 da Constituição (incisos VI e X) diz que são vedados a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa, bem como a transferência voluntária de recursos e a concessão de empréstimos, inclusive por antecipação de receita, pelos governos federal e estaduais e suas instituições financeiras, para pagamento de despesas com pessoal ativo, inativo e pensionista, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.
Rosa Weber citou o caso de uma ação ajuizada pela Defensoria Pública do estado que buscou apropriação de recursos da conta única do Tesouro para pagamento da sua folha de pessoal, que levou a arresto de mais de R$ 44,8 milhões de verbas escrituradas em favor do Hospital Universitário Pedro Ernesto. No dia seguinte, revelou a ministra, a própria Defensoria Pública ajuizou nova ação para compelir o Executivo estadual a liberar saldo financeiro, no valor de R$ 3,5 milhões, ao mesmo hospital.
Para a ministra, o relatado influi na competência para determinar as prioridades na alocação dos recursos públicos, à revelia das dotações orçamentárias, além de traduzir remanejamento de recursos entre diferentes categorias de programação, em desrespeito ao texto constitucional.
“Não se nega que seja passível de tutela jurisdicional a realização de políticas públicas, em especial para atender a mandamentos constitucionais e assegurar direitos fundamentais. No entanto, a subtração de qualquer margem de discricionariedade do chefe do Executivo na execução das despesas sugere indevida interferência do Poder Judiciário na administração do orçamento, e na definição das prioridades na execução das políticas públicas”, afirmou.
Para a relatora, a aparente usurpação de competências constitucionais reservadas ao Poder Executivo, a quem cabe exercer a direção da administração, e ao Poder Legislativo, a quem compete autorizar a transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria de programação para outra, ou de um órgão para outro, sugere configurada, na hipótese, uma provável lesão aos artigos 2º, 84 (inciso II) e 167 (incisos VI e X) da Constituição Federal.
Divergência
Ficou vencido o ministro Marco Aurélio, para quem a ADPF era incabível neste caso. Segundo o ministro, a admissão da ação implica, em última análise, “queima de etapas, considerados os processos em curso, já em fase de execução, sob pena de tomar-se como verdadeira avocatória tão nobre instrumento de controle concentrado”.
Clique aqui para ler o voto de Rosa Weber
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ADPF 405
Fonte: ConJur
MAZOLA
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