Por Jorge Folena –

A Constituição Federal diz que compete privativamente ao Senado Federal “aprovar, previamente, por voto secreto, após arguição pública, a escolha de (…) Procurador-Geral da República”.

A Constituição estabelece, ainda, como competência privativa do Senado Federal, “aprovar, por maioria absoluta e por voto secreto, a exoneração, de ofício, do Procurador-Geral da República antes do término de seu mandato”.

Ou seja, do mesmo modo que cabe ao Senado Federal aprovar o Procurador-Geral da República, indicado pelo Presidente, cabe-lhe também exonerá-lo, de ofício, durante o exercício do mandato. Estas cláusulas constitucionais decorrem do princípio da separação de poderes, que têm por objetivo manter o equilíbrio das forças políticas e sociais, segundo a lição de Montesquieu.

Assim, na dinâmica dos freios e contrapesos, o Executivo indica e o Legislativo (representado pelo Senado Federal) aprova o indicado ao cargo de Procurador-Geral da República; ou o exonera, caso ele não esteja cumprindo com sua missão constitucional e agindo de modo a causar um desequilíbrio político, exatamente como tem feito Augusto Aras no curso do seu mandato.

O atual procurador-geral tem sido questionado por nada fazer contra o ocupante da presidência da República, que tem contra si diversas acusações de prática de crimes, no exercício do cargo, que, inclusive, estão sendo investigados na CPI da COVID, em tramitação no Senado Federal, e em inquéritos em curso no Supremo Tribunal Federal; cujo desenrolar, diante de sua insistência na afirmação de uma inexistente normalidade, poderia até mesmo poderia caracterizar o delito de prevaricação.

Na verdade, a atuação do atual Chefe do Ministério Público tem colaborado para o desequilíbrio das forças políticas e sociais e, contrariamente ao republicanismo, tem sido marcada por um forte traço patrimonialista, pois comporta-se como se fosse o advogado privado do Presidente da República, de seus familiares e amigos.

Augusto Aras, procurador-geral da República, foi indicado ao cargo pelo presidente Jair Bolsonaro. (Reprodução)

O Procurador-Geral da República não tem atuado de acordo com o interesse público, como deve proceder o Chefe do Ministério Público, ou seja, “na defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”, como determina a Constituição; em razão disso, deveria até mesmo já ter sido exonerado do cargo, de ofício, pela aprovação da maioria absoluta dos senadores, como autoriza o Texto Maior, porque, com sua absoluta leniência, tem colaborado para criar um ambiente de instabilidade política e de enfrentamento permanente à ordem democrática e institucional, ao “normalizar” os ataques promovidos pelo ocupante da presidência da República e seus seguidores.

Sem dúvida, a indicação da renovação do mandato do Sr. Augusto Aras (que, a propósito, não conta com a aprovação dos seus pares no Ministério Público Federal), apresentada pelo presidente da República, constitui mais uma provação à ordem jurídica e institucional do país, promovida por um governo de forte viés autoritário, que procura desmoralizar e desacreditar o pouco que restou de regime democrático no Brasil, com suas sucessivas ameaças de golpe militar.

Em consequência de tudo isto, e a fim de manter o respeito às instituições e promover a defesa da Constituição Federal, o Senado Federal tem o dever cívico de reprovar o nome de Augusto Aras, impedindo-o de obter mais um mandato de Procurador-Geral da República, uma vez que ele, até o momento, só fez colaborar para a instabilidade institucional que afunda o país em crise sobre crise e não mudará de comportamento, caso tenha seu mandato renovado.

Portanto, o Senado tem agora, diante de si, a grande oportunidade, dentro da ordem democrática liberal, de colaborar para restabelecer a estabilidade e o equilíbrio das forças políticas e sociais, a todo momento violentados pelo Chefe do Poder Executivo, que tenta impor-se pela força aos demais Poderes da República.

Assim, o veto à recondução do leniente Augusto Aras, bem como a reprovação de André Mendonça (indicado para o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal), são pontos de reafirmação democrática, tão necessária neste momento de enfrentamento a toda forma de tirania!

JORGE FOLENA – Advogado e Cientista Político; Doutor em Ciência Política, com Pós-Doutorado, Mestre em Direito; Diretor do Instituto dos Advogados Brasileiros e integra a coordenação do Movimento SOS Brasil Soberano/Senge-RJ. É colunista e membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre, dedica-se à análise das relações político-institucionais entre os Poderes Legislativo e Judiciário no Brasil.

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