Por Wladmir Coelho –
1 – Em letras grandes anuncia o jornal Valor Econômico em 8 de dezembro: “Pearson põe à venda sistemas de ensino” completando a informação com letras pequenas: “Cogna e Arco participam de processo competitivo para compra das apostilas COC e Dom Bosco.” No dia anterior o mesmo Valor anunciava: “Regulamentação do novo Fundeb será votada até quarta, diz relator insinuando a matéria uma derrota do governo considerando a negativa de ampliação do quantitativo de instituições privadas sem fins lucrativos – via de regra religiosas – “aptas a receber verbas do Fundeb para toda a educação básica, do infantil ao ensino médio.” E assim termina o texto em questão insinuando uma derrota pessoal do sr. Bolsonaro aspecto, para muitos, considerado o máximo e espécie de purificação para qualquer projeto votado no Congresso Nacional prática da qual resulta, em termos práticos, a seguinte ordem: voltem aos seus afazeres está tudo resolvido a favor do povo. Será?
2 – No mesmo dia 8 de dezembro foi aprovada a aceleração da tramitação do projeto de lei regulamentando a distribuição dos recursos do FUNDEB fundamentada esta no relatório do sr. Felipe Rigoni deputado do PSB – Partido Socialista Brasileiro – do Espírito Santo. O relatório e incensado pela imprensa comercial e criticado em diferentes aspectos pelos representantes sindicais e setores comprometidos verdadeiramente com a educação pública, gratuita, laica e de qualidade.
3 – Em nota pública do dia 17 de novembro a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) a respeito do relatório do sr. Rigoni apontou, dentre outras questões, o seguinte: “A meritocracia é outro ponto de destaque no parecer do relator. Ela será a base para os repasses da complementação da União pelo sistema VAAR (2,5%), que acontecerá a partir de 2023, mediante a implementação da metodologia de cálculo do Índice de Aprendizagem com Equidade. Este, por sua vez, considerará três variáveis: i) resultados dos estudantes nos exames nacionais de larga escala (língua portuguesa e matemática), ponderados pela taxa de participação de cada rede escolar nos exames, que não poderá ser inferior a 80% das matrículas; ii) taxa de aprovação dos estudantes e iii) taxas de atendimento escolar confrontadas com a evasão (algo similar ao atual IDEB).”
3 – Vejam neste exemplo, existem outros, que o Rio Jordão do sr. Rigoni não passa da velha e repetida prática ilusionista criada unicamente para confundir e desmobilizar os trabalhadores tudo devidamente temperado com a frase da moda ao estilo o Centro é tudo: “Rigoni afirmou estar ´orgulhoso` do seu parecer, mas disse que estava aberto a discuti-lo. ´Com certeza`, dialogaremos com a oposição para chegar a um texto mais consensual possível”. Consensual com quem? Pergunto aqui considerando a movimentação dos grupos internacionais para apoderarem-se dos recursos do FUNDEB.
4 – Com a pergunta retorno ao fato venda da participação da Pearson no Brasil dos sistemas COC e Dom Bosco e a movimentação dos grupos Cogna (atual apelido da Kroton) e Arco assumindo o eventual comprador o controle de um setor que atinge 250 mil estudantes consumidores de apostilas, videoaulas, análises – com aquele festival de gráficos – de resultados das diferentes avaliações, cursos para professores, pedagogos, e os famosos “gestores” um título mais adequado diante da transformação do atual diretor escolar em elemento “técnico” assassinando a sua função política de representante da comunidade escolar conforme determinado no relatório do sr. Rigoni o centrista amigo.
5 – Controlando a venda destes produtos à 250 mil almas fica a questão: qual o motivo da oferta pela multinacional Pearson deste suculento setor? A resposta é muito simples a multinacional precisa de dinheiro diante dos prejuízos acumulados desde 2016 agora, prá variar, jogados nas costas da “pandemia” igualzinho aos demais setores todos dependentes da compra e recompra de ações gerando os lucros fictícios dependendo estes, todavia, do mínimo de faturamento ou recursos reais em caixa para pagar dividendos e principalmente vender e comprar novamente as novas ações criando aquele sobe e desce noticiado diariamente.
6 – Encontrando-se a Pearson com dívidas e prejuízos considera-se natural a venda e aquelas empresas saudáveis – duas habilitaram-se – correm para comprar, correto? No mundo real seria assim, mas vejamos o que acontece na Disney de Wall Street: a Cogna registrouno terceiro trimestre deste 2020 o prejuízo de R$ 1,29 bilhão e sua situação não estava lá essas coisas acumulando a empresa “brasileira” repetidas quedas nos lucros omesmo verificado na Arco também tratada nos noticiários econômicos como “nacional”. Culpa da pandemia afirmam os jornais da burguesia em sua intensa campanha negacionista diante da maior crise do capitalismo desde 1929.
7 – Duas empresas com sucessivos prejuízos querem comprar uma terceira em iguais condições qual a lógica disso? qual a relação deste rolo com o FUNDEB? Primeiro vamos acrescentar ao enredo o projeto de emenda constitucional 32 de 2020 (PEC-32) também conhecido como Reforma Administrativa hoje a menina dos olhos do equilibrado centro político representado pelo sr. Rodrigo Maia – o bom rapaz – contendo este projeto os elementos necessários para oficializar a entrega dos recursos públicos ao setor privado incluindo neste rol o nosso FUNDEB com o qual o sr. Maia revela profunda preocupação e imediata aprovação da proposta do sr. Rigoni.
8 – A título de curiosidade: o texto da PEC 32, não apresenta em momento algum a palavra direito substituída por serviços buscando – conforme sua justificativa –permitir ao Estado brasileiro estabelecer “firmes instrumentos de cooperação com órgãos públicos e privados para a execução de serviços públicos, inclusive com compartilhamento de estrutura física e a utilização de recursos humanos de particulares com ou sem contrapartida financeira, garantindo assim que um Estado moderno, que cumpre os mais diversos tipos de parceria com a segurança jurídica necessária a garantir a prestação de serviços essenciais à população.”
9 – Em termos objetivos a simples aprovação da regulamentação do FUNDEB não vai garantir a utilização dos recursos de forma exclusiva na educação pública caso a PEC 32 venha a ser aprovada e para este fim não é necessário, como verifica-se no texto da emenda em questão, a privatização direta das escolas de ensino básico bastando para este fim a “cooperação” dos segmentos privados como garantia da “prestação de serviços essenciais à população” e no caso do relatório do sr. Rigoni a brecha já está aberta ao condicionar os recursos do sistema VAAR ao desempenho nas famosas avaliações externas e escolha dos gestores “técnicos” prontos a implantar com o chicote da subserviência ao imperialismo a ideologia dos interessados em lucrar na educação pública.
10 – A PEC 32 vai anular qualquer tentativa de manutenção dos direitos sociais e possibilitar aos grupos privados o acesso aos recursos do FUNDEB aprofundando a infiltração nas escolas – sabemos todos que boca destes encontram-se abertas podendo fechar em breve – surgindo desta prática “cooperativa” a salvação dos diferentes grupos privados educacionais todos controlados por condomínios de fundos de investimentos com sede em paraísos fiscais e negociados em Wall Street vivendo e sobrevivendo da especulação sem gerar um emprego, ao contrário, caracterizados pela prática de intensificação do trabalho daqueles que permanecem constantemente chantageados com a visão da fila gigantesca de desempregados obrigados a aceitar todo tipo de precarização.
11 – A crise capitalista de nossos dias ampliou o saque promovido pelos grandes grupos econômicos aos recursos públicos cumprindo a PEC 32 a função de legaliza-lo inutilizando o fato de encontrar-se o FUNDEB no corpo da Constituição como forma de uso exclusivo de seus recursos no setor público visto a possibilidade de efetivação dos “serviços essenciais” a partir de parcerias drenando o dinheiro do trabalhador brasileiro para os cofres dos controladores dos fundos de investimentos a saber os grandes bancos, os milionários interessados na manutenção de seus lucros.
12 – O caso Pearson apenas revela a movimentação dos fundos de investimentos e dos bancos no sentido de garantir a concentração do segmento educacional privado facilitando o saque a partir do sequestro dos direitos sociais e sinaliza para a necessária atenção ao processo de criação de uma nova Constituição a partir da substituição gradual dos fundamentos da atual um grave ataque a democracia.
WLADMIR COELHO – Professor do Instituto de Educação de Minas Gerais – IEMG, superintendente de juventude da SEE-MG, editor do blog Política Econômica do Petróleo e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.
MAZOLA
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