Por Kakay

“A verdade é inconvertível, a malícia pode atacá-la, a ignorância pode zombar dela, mas, no fim, lá está ela.”
–Winston Churchill

Há alguns anos, estive com o advogado Rodrigo Tacla Duran –réu por crime de lavagem de dinheiro na operação Lava Jato–, em Madrid. Tive acesso nessa oportunidade a documentos que seriam muito importantes caso viessem a público. Desde aquela época, ele demonstrava claro interesse em contribuir com a Justiça brasileira. Claro que queria fazer isso dentro de um contexto jurídico de proteção dos seus direitos, o que é absolutamente legítimo. Até onde sei, desde aquela época, Tacla Duran tem encetado inúmeros esforços para ser ouvido e para apresentar o material que mantém sob sua custódia. E que revelam questões gravíssimas.

É certo que Tacla Duran, ex-advogado de empreiteiras, foi arrolado como testemunha em diversos processos no Brasil. E é inexplicável que o ex-juiz federal da Lava Jato e hoje senador, Sergio Moro, jamais tenha permitido que ele fosse ouvido.

Como advogado militante, fiquei impressionado com a determinação do então magistrado de obstaculizar a oitiva do Tacla Duran quando este era chamado a prestar depoimento nos processos criminais. É melhor deixar bem claro: um juiz, que impede uma testemunha de depor em um processo impossibilitando o exercício pleno do direito de defesa do réu, está cometendo abuso de autoridade, algo absolutamente inusual. Na verdade, o que é necessário esclarecer é a razão pela qual Moro não queria ouvir o que haveria a ser dito. Simples.

Ainda nesta semana, o ex-procurador de estimação do ex-juiz, o atual deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR), impediu a convocação do advogado Tacla Duran na Câmara dos Deputados. É preciso perguntar, parafraseando os Titãs:

“Você tem medo de quê?”.

Hoje, Tacla Duran é uma testemunha protegida e deveria ter todo o apoio institucional para vir depor. Mas o medo do grupo do ex-magistrado Moro é algo que não encontra limites. Urge que se determine a imediata proteção do Estado brasileiro para que Tacla Duran venha ao Brasil, preste depoimento e apresente os documentos que diz ter. Sob pena de enquadrarmos esses que estão tentando impedir a sua oitiva, configurando claríssima obstrução de Justiça. Inclusive, é um caso clássico de motivo para prisão preventiva.

As últimas decisões do juiz federal Marcelo Malucelli, do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), causaram estupefação na comunidade jurídica e no meio político. Um magistrado que, ao que consta, tem relação de proximidade com o casal Moro, que é investigado, ousa continuar despachando nos processos de interesse deles e que se delimita como o maior escândalo recente no estranho episódio patrocinado pelo grupo do ex-juiz da Lava Jato.

Sérgio Moro seria sócio do filho do desembargador Marcelo Malucelli (foto com Moro). Corregedor de Justiça pede informações sobre a conduta do desembargador. (Reprodução)

Muito ruim para o Poder Judiciário e para a democracia do país que um ex-juiz federal, atual senador da República, e seu pupilo, hoje deputado federal, que tiveram ativa participação na prisão ilegal, injusta e inconstitucional do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), decisiva para a eleição do fascista Jair Bolsonaro (PL) em 2018, tenham suas atitudes questionadas sem que tenham a honradez de darem uma explicação. Um acinte. Um escárnio. Um escândalo. É absolutamente incompreensível que os poderosos ex-juiz e ex-procurador enxovalhem o Poder Judiciário impedindo que se esclareça o porquê desse medo doentio. Eles, certamente, sabem o que fizeram nos verões passados.

Uma coisa é certa, por muito menos, o então protegido do ex-magistrado teria pedido a prisão de todos e ele, todo poderoso, teria determinado a prisão imediata dos que estão tentando obstruir a Justiça, ou seja, eles próprios.

Nas últimas horas, as versões se acumulam sobre as decisões do TRF-4 colocando, muitas vezes, na berlinda o seríssimo, técnico e corajoso trabalho do juiz titular da 13ª Vara de Curitiba, Eduardo Fernando Appio.

Em um primeiro momento, anunciou-se que o juiz federal Marcelo Malucelli, que tem relação de proximidade com a família Moro, teria descumprido a decisão do ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), e determinado a prisão do Tacla Duran. Isso correu em 12 de abril de 2023, na última 4ª feira.

O advogado estava embarcando da Espanha para o Brasil no dia seguinte, na noite de 5ª feira (13.abr.2023), para depor presencialmente ao juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba.

A confusão causada pela decisão –depois desaparecida– do juiz Marcelo Malucelli acabou fazendo com que Tacla Duran cancelasse seu embarque. Sua oitiva, que seria dia 14 de abril, agora está remarcada para o dia 18.

Até que que fosse suprimida, a decisão de Marcelo Malucelli havia se tornado um escândalo nas redes sociais por causa das relações entre os membros da família e do escritório de Moro. Após a notícia da possível ordem de prisão reverberar nos meios jurídicos, houve um estranho e inesperado comunicado (eis a íntegra – 44 KB) da assessoria de comunicação do TRF-4 ao juiz Eduardo Fernando Appio. Num texto curto, Patrícia Picon, diretora de Comunicação Social do TRF4, afirmou que havia sido cometido um “erro de interpretação” sobre um despacho e que o texto publicado no site desse Tribunal já havia sido retirado do ar. O título da desse comunicado, agora suprimido, era claro: “TRF4 restabelece ordem de prisão preventiva do advogado Rodrigo Tacla Duran”. No site do Tribunal há uma nota (eis a íntegra – 2 MB).

Felizmente, para esclarecer tudo o que está se passando, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) representou contra o juiz federal Marcelo Malucelli, até para que ele possa explicar ao Conselho Nacional de Justiça o que está acontecendo, sem prejulgamento. Dando oportunidade para que as pessoas envolvidas possam ser ouvidas. Afinal, é exatamente isso que, há anos, pretende o advogado Tacla Duran: ser ouvido. Esse é um direito básico em qualquer Estado que se pretenda democrático.

Lembrando-nos sempre do mestre Octávio Paz, “Sem liberdade, a democracia é um despotismo, sem democracia a liberdade é uma quimera”.

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AGENDA

https://www.oabrj.org.br/eventos/juizes-perseguidos-estado-direito

ANTÔNIO CARLOS DE ALMEIDA CASTRO, o Kakay, tem 61 anos. Nasceu em Patos de Minas (MG) e cursou direito na UnB, em Brasília. É advogado criminal e já defendeu 4 ex-presidentes da República, 80 governadores, dezenas de congressistas e ministros de Estado. Além de grandes empreiteiras e banqueiros.

Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com


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