Categorias

Tribuna da Imprensa Livre

Um Brasil próspero é possível
Charge do Pelicano. (Facebook)
Colunistas, Política

Um Brasil próspero é possível

Por José Carlos de Assis

É falso que o Brasil quebrou.

E que não pode voltar aos níveis de alto crescimento econômico do passado a fim de ancorar um programa de desenvolvimento sustentável, porque o governo não teria dinheiro para fazer os investimentos sociais e de infraestrutura requeridos para isso. O que quebrou, sim, foi a vontade política de promoção do desenvolvimento e do bem-estar da população por parte de brasileiros que, empoleirados nos órgãos de comando do Estado, se deixaram escravizar pelas mentiras e os fetiches da economia política neoliberal.

Sustentamos que o Brasil não quebrou, já que nenhum Estado que emite a moeda com que realiza seus pagamentos, por definição, quebra financeiramente. A não ser em condições muito especiais em que fica dependente, de forma absoluta, da moeda emitida por outros Estados. Um Estado criador de sua moeda tem o dinheiro para fazer seus pagamentos com essa moeda. Assim, o Estado brasileiro pode financiar os mais ambiciosos programas de desenvolvimento, alinhados com o que é mais avançado no mundo em termos de busca do desenvolvimento sustentável e do pleno emprego, sem risco de inflação. É o que pretendemos provar, de forma inequívoca. Estamos iniciando um projeto de conscientização de lideranças universitárias, sindicais, sociais e políticas no sentido de remover do caminho do nosso desenvolvimento os entulhos do neoliberalismo, representados pelas reiteradas políticas de arrocho fiscal e salarial que vêm sendo aplicadas pelos governos desde os anos 80, com poucos intervalos de retomada. São fetiches que entulham as consciências do povo com
conceitos de pura mentira, como a necessidade de fazer poupança prévia para investir, ou de fazer superávit primário e e teto orçamentário para conter o déficit e o endividamento público.

Chegou-se, no governo Temer, a aprovar uma emenda constitucional para congelar o orçamento do governo por 20 anos, ainda vigente. Pessoas nascem, precisam de novos empregos, têm filhos, a demanda de serviços públicos essenciais aumenta, mas a oferta, segundo essa lei estúpida aprovada por um Congresso inconsciente, mantém congelados os níveis desses serviços no mesmo patamar por 20 anos. Antes disso fez se uma Lei de Responsabilidade Fiscal, com o objetivo exclusivo de reduzir o espaço fiscal do governo e dos Estados subnacionais em sua capacidade de estimular a produção de bens e serviços para o povo.

Para fazer as políticas do arrocho salarial e da contração das rendas baixas, o terrorismo fiscal dos governos recentes, e em especial dos dois últimos, destruiu a legislação trabalhista e a legislação previdenciária, ambas patrimônios sociais do povo brasileiro havia décadas. A anunciada “reforma” administrativa vai pelo mesmo caminho. A Federação foi praticamente destruída. Recursos fiscais que a Constituição havia destinado aos Estados para financiar serviços públicos essenciais foram desviados para acumular superávits primários na União, mentirosamente necessários para pagar juros aos donos da dívida pública.

O Estado apropriado por uma elite financeira vendida ao capital predatório e especulativo tornou o povo escravo dos novos barões do dinheiro vadio, que usam para seus próprios propósitos a moeda que esse mesmo Estado, sob um comando político desenvolvimentista, poderia aplicar em favor do povo. É justamente isso que pretendemos provar. A moeda de um Estado orientado para o desenvolvimento social e da infraestrutura econômica pode mudar o mapa do desemprego e da miséria. Olhando além do horizonte do terror bolsonarista, é possível ver perspectivas de esperança para o país.

Os fetiches que, no plano ideológico, impedem a retomada do desenvolvimento brasileiro não se restringem aos áulicos do capital financeiro que apontam na dívida pública a “causa” dos juros elevados e de supostas ameaças inflacionárias.

Estendem-se também aos que, enganados por falsos conceitos do senso comum de que o Estado é como “uma dona de casa responsável que não deve gastar mais do que ganha”, acham que o déficit público é sempre ruim, e que o juro que remunera a dívida pública constitui uma restrição aos gastos do Estado em outras aplicações. Isso é falso. Dona de casa não cria moeda, e esta, sim, quebra, se não pode pagar sua dívida. O déficit público sempre corresponde à criação de moeda nova e pode ser usado como fonte saudável de crescimento econômico e de criação de novos empregos.

A compreensão de que o Estado pode investir sem preocupação com a dívida pública ou necessidade de arrecadação prévia de impostos, sem risco inflacionário, é fundamental para o financiamento estatal saudável de investimentos públicos essenciais e responsáveis. O imposto ajuda a criar condições distributivas para suportar os gastos correntes do Estado, mas o que efetivamente financia investimentos públicos novos em infraestrutura e serviços, gerando novos empregos, é a criação de moeda. A isso se contrapõe o aumento da disponibilidade de bens e serviços reais na economia, sem risco de descontrole inflacionário.

A melhor evidência empírica disso se encontra em dois exemplos recentes, um no governo Lula, e outro justamente agora. Na crise financeira de 98, diante de uma aguda recessão, o Tesouro transferiu R$ 200 bilhões diretamente ao BNDES para que financiasse empresas em dificuldade. A economia, que havia entrado em depressão em 2009, teve um crescimento espetacular de 7,4% em 2010.

No início da atual pandemia, quando se tornaram evidentes seus efeitos no mercado de trabalho e no desemprego, o governo foi obrigado pelo Congresso a contornar sua obsessão por equilíbrio orçamentário e abriu um orçamento paralelo de R$ 700 bilhões, sem cobertura fiscal, para o auxílio emergencial aos mais pobres. Poderia ter sido maior, mas funcionou em parte. Nos dois casos, não houve descontrole inflacionário. Apenas um aumento no patamar da inflação que poderia ter sido evitado se o governo tivesse atuado com mais eficácia do lado da oferta real de bens e serviços para a faixa mais pobre da população, com intervenção tributária no comércio externo e, recorrendo às reservas internacionais, no câmbio, evitando a elevação dos juros.

Se o dinheiro que o Estado emite for bem aplicado por um governo progressista, e sob os critérios de um planejamento consciente e eficaz, podemos superar os desafios contemporâneos enfrentados não apenas por nós, mas pelo conjunto da humanidade.

Não se trata apenas de recuperar o tempo perdido na crise econômica, ambiental, social, institucional e pandêmica em que vivemos, mas de saltar na frente e nos tornarmos pares dos países desenvolvidos. Para isso são necessárias verdadeiras revoluções conceituais, que devem ser trazidas à prática concreta de um novo Estado.

Vemos essas revoluções como instrumentos estruturantes de uma nova Economia, e de uma Sociedade que deixe para trás o Século XX e torne-se atualizada ao Século XXI, o século em que os grandes desafios ambientais e sociais devem ser efetivamente enfrentados. Não são todas as necessárias, mas são principalmente a Revolução Ambiental, a Revolução Energética, a Revolução Urbana (desfavelização), a Revolução da Reindustrialização, a Revolução do Estado (dentro dela, a reforma fiscal-monetária), e a Revolução atualizadora do Mercado de Trabalho, que sofre profundas mudanças.

Parece muito, mas são possíveis. Basta aplicar com inteligência, e sem nos curvarmos às forças da financeirização e da especulação desenfreadas, os mecanismos da moeda soberana a serviço do crescimento econômico e do desenvolvimento sustentável. É possível que muitos enxerguem nisso propostas visionárias, incapazes de serem atingidas. Contudo, estão ao alcance de uma nova política. Para isso é fundamental que a Sociedade Civil se convença delas, e que leve essa convicção aos tomadores de decisões políticas. Na verdade, não temos alternativa. Ou damos esse salto para frente ou regredimos. Os neoliberais fizeram o Brasil retardar décadas. Convenceram parte da população de que o Estado não pode investir, e que o país e seu futuro devem ser entregues ao mercado livre e ao sistema primário-exportador. Não aceitamos isso.

Fundamentos mais desenvolvidos sobre esses conceitos encontram-se no documento “O Brasil Rumo à Prosperidade”, que vem sendo discutido num grupo voluntário de especialistas. Está sendo enviado nesta mensagem junto com um “Resumo”, para facilitar a leitura. Nossa intenção é que esses documentos sejam encarados como uma provocação a um debate mais amplo na Sociedade, para, eventualmente, subsidiar propostas políticas concretas na campanha presidencial do próximo ano.

Por isso, é nossa intenção também levá-los aos presidenciáveis, enriquecidos pelos debates.

JOSÉ CARLOS DE ASSIS – Jornalista, economista, escritor, colunista e membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Professor de Economia Política e doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ, autor de mais de 25 livros sobre Economia Política; Foi professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), é pioneiro no jornalismo investigativo brasileiro no período da ditadura militar de 1964; Autor do livro “A Chave do Tesouro, anatomia dos escândalos financeiros no Brasil: 1974/1983”, onde se revela diversos casos de corrupção. Caso Halles, Caso BUC (Banco União Comercial), Caso Econômico, Caso Eletrobrás, Caso UEB/Rio-Sul, Caso Lume, Caso Ipiranga, Caso Aurea, Caso Lutfalla (família de Paulo Maluf, marido de Sylvia Lutfalla Maluf), Caso Abdalla, Caso Atalla, Caso Delfin (Ronald Levinsohn), Caso TAA. Cada caso é um capítulo do livro; Em 1983 o Prêmio Esso de Jornalismo contemplou as reportagens sobre o caso Delfin (BNH favorece a Delfin), do jornalista José Carlos de Assis, na categoria Reportagem, e sobre a Agropecuária Capemi (O Escândalo da Capemi), do jornalista Ayrton Baffa, na categoria Informação Econômica. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.


Tribuna recomenda!

Related posts

Deixe uma resposta

Required fields are marked *