Por Miranda Sá

A consciente e duradoura atração pela literatura nos leva a explorar o conteúdo das obras clássicas. Faço-o de vez em quando, com cuidado de citá-las e inflacionar o uso de aspas; e sabemos que não agradamos a muitos.

É difícil para certas pessoas satisfazerem-se com a cultura alheia, e se assumem com ceticismo e rebeldia refutando o modo de pensar do outro. Encantam-se, porém, com os políticos que industrializam uma falsa religião para enganar as massas ingênuas com a fantasia maniqueísta da luta do bem contra o mal, e se assumindo, lógico, como o espírito do bem….

O dualismo demagógico e radical patina na politicalha que enlameia o Brasil e impõe a polarização eleitoral entre a falsa direita bolsonarista e a falsa esquerda lulopetista. É um sistema que estimula o culto da personalidade e o fanatismo sem princípios. Está mais para a torcida na Festa dos Bois Garantido e Caprichoso de Parintins ou no azul e encarnado das lapinhas natalinas….

Divagando sobre esta situação dos descerebrados corro para a bagagem erudita acumulada ao longo dos anos para tirar uma curiosa historieta. Está num texto de Anatole France, transcrevendo uma milenar lenda chinesa.

Conta que um gênio feioso, de cabeça grande e grandes olhos habita cavernas escuras, vagueia pelas noites em busca do prazer que consiste em divertir-se às custas dos mortais; a sua diversão é penetrar nas moradias e abrir cirurgicamente o crâneo dos dorminhocos.

A operação se realiza com a extração do cérebro da pessoa, trocando-o pelo de outra; assim, percorre pelas cidades repetindo várias vezes a proeza. Ao amanhecer, volta para o subterrâneo e se alegra por saber que o militar acordará com o misticismo de um monge, a prostituta terá ideias de magistrado; o político despertará como um moralista e a adolescente virgem estremecerá com a fissura de um drogado.

Já imaginaram se este gênio gozador chegasse no Brasil e se materializasse numa sessão espírita e saísse praticando um troca-troca de mentalidades?

Certamente não seria uma mudança como ocorreu com o sueco Alfred Nobel que depois de fabricar o mais hediondo meio de destruição e mortes e enriquecer com isto, dedicou parte de sua fortuna cientistas, intelectuais e pacifistas.

Aqui, com o transplante de cérebros, veríamos os picaretas do Congresso Nacional atribuindo-se o papel dos juízes, policiais e promotores da Lava Jato! Os togados do STF arrancando a venda da Justiça, fazendo-a condenar os crimes dos amigos; os dirigentes partidários e sindicais dispensando dinheiro público pela independência das entidades; os empresários criando empregos e remuneração justa e os intelectuais pensando um futuro promissor para as novas gerações.

Seria o sonho de uma noite de Verão…. Já imaginaram se pastores evangélicos e padres católicos passassem a acreditar que Deus é a energia cósmica e não a criação do homem, à sua imagem e semelhança, masculino, de barba e bigode?

Enfim, como eu gostaria que o Cabeçudo conseguisse mexer cerebral e coletivamente com o povo brasileiro e o fizesse abandonar a matreirice do conquistador português, a resistência passiva do africano e a cultura de caça e colheita do índio!

Então se concretizaria o lema que inspirou a nossa bandeira: “O amor por princípio, a ordem por base e o progresso por fim!”

MIRANDA SÁ – Jornalista profissional, blogueiro, colunista e diretor executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como a Editora Abril, as Organizações Globo e o Jornal Correio da Manhã; Recebeu dezenas de prêmios em função da sua atividade na imprensa, como o Esso e o Profissionais do Ano, da Rede Globo. mirandasa@uol.com.br

Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com


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