Por Iluska Lopes

“O fanatismo e a inteligência nunca moraram na mesma casa” (Ariano Suassuna)

Assim como fizeram os governantes talibãs do Afeganistão que em 2001 entraram no Museu Nacional de Kabul e destruíram e mancharam cerca de 2.750 obras de arte, as melhores e mais raras do mundo, a horda terrorista-golpista de vândalos bolsonaristas cometeu o mesmo tipo de crime contra a cultura nacional em Brasília neste domingo (8).

Destruíram, roubaram e danificaram diversas obras de valor incalculável, desde um valioso quadro de Di Cavalcanti até um Relógio raríssimo do século XVII dado pela corte francesa à Dom João VI foram depredados.

Terroristas destroem relógio que foi dado de presente para a família real pela corte de Luís XIV - TV e Lazer - Extra Online

A destruição do patrimônio público causada por terroristas de extrema-direita ainda está sendo estimada pelas autoridades. Outra perda, também inestimável, apontada pelo Museu do Holocausto de Curitiba: móveis feitos por um sobrevivente do Holocausto, o polonês Jerzy (Jorge) Zalszupin Z”L. Lembra da cadeira com o brasão da República arrancados do STF, é criação do arquiteto e design. Além de obras do artista plástico também da Polônia, Frans Krajcberg Z’’L foram alvo dos radicais.

Jerzy (Jorge) Zalszupin Z”L nasceu em Varsóvia, na Polônia, em 1º de junho de 1922, em uma família judia bem integrada na sociedade polonesa. Ele era adolescente quando, em 1939, começou a 2ª Guerra Mundial. Diante do avanço nazista, sua família decidiu deixar a Polônia enquanto havia tempo. De carro, atravessaram a fronteira com a Romênia.

Sobreviveram ao Holocausto em Bucareste, escondendo o fato de que eram judeus. Lá, Jorge também estudou Arquitetura. No pós-guerra, conheceu a obra de Oscar Niemeyer e decidiu vir para o Brasil, imigrando em 1949. Aqui, obteve o contato do arquiteto Luciano Korngold, com quem trabalhou até abrir o próprio escritório.

Jorge se especializou no design de móveis. Integrou o grupo que, a convite de Niemeyer, nos anos 1960, concebeu e produziu móveis para gabinetes e palácios na construção de Brasília. Entre suas obras mais conhecidas, estão as poltronas utilizadas pelos juízes do STF, depredadas por terroristas durante o ataque ao DF, na tarde do último domingo (8). “Projetei o espaldar bem alto para transmitir sobriedade aos juízes que ali sentassem”, comentou à Folha de S.Paulo a respeito da Ambassador Versão 2. “E há outras mais. Boa parte dos móveis do Judiciário brasileiro leva minha assinatura”, finalizou.

Jerzy (Jorge) Zalszupin Z”L faleceu em 17 de agosto de 2020, aos 98 anos de idade.

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O Museu do Holocausto de Curitiba, é o primeiro Museu do Holocausto no Brasil, voltado a relembrar as vítimas e alertar as novas gerações sobre os perigos do ódio, da intolerância e do racismo.

Frans Krajcberg Z’’L nasceu em 12 de abril de 1921, em Kozienice, na Polônia. No início da 2ª Guerra Mundial, viveu em Częstochowa, cidade ao sul de sua terra natal. Pouco tempo depois, conseguiu refúgio na antiga URSS, onde estudou Engenharia e Artes na Universidade de Leningrado. Entre 1941 e 1945, foi oficial do exército polonês. Após o fim do conflito, foi para a Alemanha. Lá, ingressou na Academia de Belas Artes de Stuttgart.

Em 1948, imigrou para o Brasil procurando reconstruir a vida. Expôs duas pinturas na 1.ª Bienal Internacional de São Paulo em 1951 e, em seguida, residiu no Paraná, isolando-se na floresta para pintar. A partir de então, tornou-se autor de obras que têm como característica uma pesquisa dos elementos da natureza, destacando-se pelo ativismo ecológico, que associa arte e defesa do meio ambiente.

Em 2003, foi inaugurado, no Jardim Botânico de Curitiba, o Instituto Frans Krajcberg de Arte e Meio Ambiente, espaço que passou a abrigar permanentemente obras do artista. Frans Krajcberg Z’’L morreu em 15 de novembro de 2017, aos 96 anos, no Rio de Janeiro.

No último domingo (8), durante o ataque terrorista à Brasília, no DF, uma de suas obras foi quebrada em diversos pontos. A escultura de parede em madeira é estimada em R$ 300 mil.

Janja, Margareth Menezes e Grass avaliam obras danificadas no Palácio do Planalto

Após visita ao Palácio do Planalto, para debater a recuperação do patrimônio destruído na invasão aos Três Poderes, a ministra da Cultura Margareth Menezes, fala à imprensa

Os atos extremistas ocorridos na Praça dos Três Poderes, no domingo (8), deixaram um rastro de destruição em patrimônios históricos e artísticos do Palácio do Planalto. Para avaliar os danos e traçar planos para a restauração das obras danificadas, a ministra da Cultura Margareth Menezes visitou o local de trabalho do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nesta terça-feira (10), ao lado da socióloga e primeira-dama Rosângela Lula da Silva, conhecida como Janja, e do ex-deputado distrital do DF e presidente do Iphan Leandro Grass. Na visita, a ministra anunciou a criação de um memorial em defesa da democracia com as obras vandalizadas.

“Esse memorial é para deixar marcado, para que nunca mais possa acontecer outra violência desse nível, com o intocável, que é nossa democracia. Vamos usar todas as possibilidades possíveis a partir do momento da dimensão de quanto será o custo disso”, disse Margareth Menezes. Também estiveram presentes na visita ao Planalto o secretário-executivo do Ministério da Cultura Márcio Tavares, o diretor de Curadoria dos Palácios Presidenciais Rogério Carvalho e o diretor do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização do Iphan Andrei Rosenthal Schleed.

Janja Lula da Silva (esposa do presidente Lula), Margareth Menezes (ministra da Cultura), Márcio Tavares (secretário-executivo do MinC), Leandro Grass (presidente do Iphan), Andrei Rosenthal Schleed (diretor do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização do Iphan) e Rogério Carvalho (diretor de Curadoria dos Palácios Presidenciais) examinam a obra O Flautista, de Bruno Giorgi. (Divulgação)

Uma das obras danificadas foi o quadro As Mulatas, do pintor Di Cavalcanti, avaliado em R$ 8 milhões. A tela ficava no Salão Nobre do Palácio do Planalto e foi resgada a facadas por bolsonaristas. A escultura em bronze O Flautista, de Bruno Giorgi e o relógio de Balthzar Marinot, do século XVII, também foram examinadas pelas autoridades.

Segundo Margareth, até quinta-feira (12) serão divulgados os resultados da perícia das obras vandalizadas. O trabalho é fundamental para dimensionar o valor dos danos e a possibilidade de restauração do que foi danificado. A recuperação será feita por servidores do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). “Muita gente dando as mãos nesse momento para fazermos essa recuperação”, pontuou a ministra.

As principais obras danificadas no Planalto

No andar térreo:

Segundo Ministra, Obra de Di Cavalcanti e relógio do século XVI não poderão ser recuperados - Brasil - BCharts Fórum
• Pintura Bandeira do Brasil, de Jorge Eduardo, de 1995 — o quadro, que reproduz a bandeira nacional hasteada em frente ao palácio e serviu de cenário para pronunciamentos dos presidentes da República, foi encontrada boiando sobre a água que inundou todo o andar, após vândalos abrirem os hidrantes ali instalados.
• Galeria dos ex-presidentes — totalmente destruída, com todas as fotografias retiradas da parede, rasgadas e jogadas ao chão.

No 2º andar:

• O corredor que dá acesso às salas dos ministérios que funcionam no Planalto foi brutalmente vandalizado. Há muitos quadros rasurados ou quebrados, especialmente fotografias. O estado de diversas obras não pôde ainda ser avaliado, pois é necessário aguardar a perícia e a limpeza dos espaços para só daí ter acesso às obras.

No 3º andar:

De relógio da corte de Luís XIV a tela de Di Cavalcanti, veja obras de arte danificadas em Brasília - Folha PE
• Obra As Mulatas, de Di Cavalcanti — a principal peça do Salão Nobre do Palácio do Planalto foi encontrada com sete rasgos, de diferentes tamanhos. A obra é uma das mais importantes da produção de Di Cavalcanti. Seu valor está estimado em R$ 8 milhões, mas peças desta magnitude costumam alcançar valores até cinco vezes maior em leilões.
• Obra O Flautista, de Bruno Giorgi — a escultura em bronze foi encontrada completamente destruída, com pedaços espalhados pelo salão. Está avaliado em R$ 250 mil.
• Escultura de parede em madeira de Frans Krajcberg — quebrada em diversos pontos. A obra se utiliza de galhos de madeira, que foram quebrados e jogados longe. A peça está estimada em R$ 300 mil.
• Mesa de trabalho de Juscelino Kubitscheck — exposta no salão, a mesa foi usada como barricada pelos terroristas. Avaliação do estado geral ainda será feita.


• Mesa-vitrine de Sérgio Rodrigues — o móvel abriga as informações do presidente em exercício. Teve o vidro quebrado.
• Relógio de Balthazar Martinot — o relógio de pêndulo do século 17 foi um presente da Corte Francesa para Dom João VI. Martinot era o relojoeiro de Luís XIV. Existem apenas dois relógios deste autor. O outro está exposto no Palácio de Versailles, mas possui a metade do tamanho da peça que foi completamente destruída pelos invasores do Planalto. O valor desta peça é considerado fora de padrão.

Educação, o princípio da vida

Mobílias raríssimas de valor inestimável foram vandalizadas. Muitas obras que o Brasil recebeu de diversos chefes de Estado foram roubadas, vasos chineses raros foram destruídos. A escultura de bronze ‘A Bailarina’  feita em 1920 por Victor Brecheret arrancada e arremessada ao chão. Desrespeito com nossa história, cultura e memória, sem precedentes. Tudo destruído, desfigurado, distorcido.

A "Bailarina" de Victor Brecheret foi arrancada e arremessada ao chão — Foto: Chrys Hadrian / @felipecabral_ / Instagram / Reprodução | Montagem: Casa e Jardim

O terror no DF por toda vida vamos lembrar. Pra nunca mais esquecer. O terrorismo bolsonarista não atentou apenas contra o Estado Democrático de Direto, o terrorismo bolsonarista atentou contra a alma e a memória do povo brasileiro. É Inacreditável, inaceitável!

Precisamos compreender essa crise e intolerância, a dimensão do ódio direcionado as instituições e agir de tal modo que esse ódio não permaneça institucionalizado.

As instituições devem travar luta constante contra a intolerância, o ódio e o racismo. Capacitar educadores, é uma conscientização permanente, devemos banir o ódio, o racismo e a intolerância, entender que são crimes contra a humanidade.

“Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo.” (Paulo Freire)

*Com informações do Museu do Holocausto de Curitiba e Agência Brasil.

ILUSKA LOPES – Jornalista, Sommelier e proprietária da IPANEMA WINE BAR. Especialista em Turismo, Professora, Locutora, Colunista e Diretora de Redação do jornal Tribuna da Imprensa Livre. 

Envie seu texto para iluska@tribunadaimprensalivre.com /  mazola@tribunadaimprensalivre.com / siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com


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