Por Wladmir Coelho –
Resposta ao artigo do economista Cláudio de Moura Castro.
1 – Em artigo publicado no jornal Estado de São Paulo domingo, 2 de abril, o economista doutor Cláudio de Moura Castro apresenta com nitidez os elementos ideológicos presentes na chamada “reforma do ensino médio”.
2 – O doutor Moura Castro, para confundir os ingênuos, inicia o artigo descendo a borduna nos ministros da educação nomeados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro um expediente comum em nossos dias e amplamente utilizado por aqueles interessados em manter e ampliar o projeto ideológico representado no antigo mandatário sem os carimbos amplamente conhecidos.
3 – Na mesma edição o jornal paulista, em seu editorial, apresenta um conceito peculiar de democracia no qual o Congresso ao aprovar uma lei – e no caso do editorial em questão tratava-se daquela da autonomia do Banco Central – esta jamais pode ser contestada e no caso em questão não precisamos de muito esforço para perceber os interesses dos banqueiros elevados a condição sacrossanta e desta a famosa condição de fim – no sentido de término – da história.
4 – O fim da história – em termos práticos – significa o seguinte: as leis implantadas pelos interesses do capital são permanentes e não podem ser tocadas, pois representam a verdade absoluta. Eis o conceito de democracia do Estado de São Paulo.
5 – Voltando ao doutor economista Moura Castro vamos observar o seu horror e desprezo ao conceito de democracia como prática participativa – um exercício perfeitamente possível e previsto em diferentes pontos da Constituição de 1988 – reduzidos pelo economista em questão a condição de “assembleísmo” e uma delas – segundo o douto autor em análise – “pariu o Plano Nacional de Educação (PNE)” completando a respeito da Conferência Nacional na qual foi aprovado o PNE: “o caos mais memorável que presenciei em minha vida.”
6 – E o que seria o “caos” na Conferência Nacional de Educação? Primeiro a existência de “milhares de sugestões disparatadas” e depois a falta de referência “as palavras eficiência e qualidade”. Observe: o conceito de democracia do Estadão – e por consequência do economista Moura Castro – não admitem divergências de ideias e menos ainda a construção de um projeto educacional brasileiro a partir dos interesses nacionais, de um consenso efetivado a partir dos trabalhadores e estudantes.
7 – Para o economista Moura Castro o PNE carregava ainda o “perigo” presente na nas “ideias do italiano Gramsci. Nos anos 20, esse filósofo esquerdista se atrapalhou com a lei e foi parar na cadeia. Lá, escreveu sobre educação, com propostas ambiciosas e revolucionárias.” Afirma o economista.
8 – Existindo alguma dúvida a respeito do peculiar conceito de democracia do Estadão e do douto economista devemos observar o culto a ordem estabelecida e desta constatação perguntar: qual era a ordem estabelecida na Itália que resultou na prisão do filósofo esquerdista em função de “trapalhadas” com a lei? Ora, a resposta é simples: a Itália naquele momento histórico encontrava-se submetida a ditadura fascista de Benito Mussolini. Isso qualquer estudante sabe, trata-se de parte dos temas presentes nas antigas e suprimidas aulas de História em função da dita reforma defendida pelo economista Moura Castro.
9 – Mussolini considerou Gramsci perigoso da mesma forma o doutor Moura Castro e sabem o motivo? Eis a resposta retirada do artigo em análise: “Suas preocupações [as do Gramsci] com as diferenças entre a educação dos pobres e a dos ricos eram e são legitimas. Mas, para ele, a cura seria oferecer exatamente a mesma educação para todos, indo da prática aos píncaros da abstração. O modelo ficou conhecido como ‘politecnia’. Mas essa proposta é fantasiosa.”
10 – A partir das observações do ponto anterior vou destacar duas questões: a primeira o discurso do ‘marxismo cultural’ – o autor em questão não cita o termo, mas apresenta o seu significado – como fantasma presente no Plano Nacional de Educação e deste a contaminar toda prática escolar em nosso país somado as variações do tipo mamadeira erótica, ‘ideologia de gênero’ e todo o delírio amplamente divulgado. A segunda está na confissão dos interesses ocultos na dita reforma do ensino médio confirmando as denuncias realizadas por professores e estudantes, ou seja, a criação de uma escola inferior para os filhos dos trabalhadores e outra para os futuros gerentes. Aquelas escolas para as classes dominantes não vou anotar neste texto por razões obvias: esta parcela da juventude não estuda no Brasil.
10 – Em termos gerais podemos afirmar que o doutor Moura Castro não enxerga educação de qualidade para todos, mas privilégios de classe traduzindo eficiência como sinônimo de criação dos meios para reduzir os estudantes das classes populares a simples condição de produto de reposição mercadológica futura. Desconhece o economista o necessário acesso ao conhecimento acumulado pela humanidade ou dos fundamentos, criação de meios para o melhor desenvolvimento da juventude. Para ele pensar, criticar, entender não é função da escola para o povo.
11 – Deve ser por isso que em seu artigo escreve a respeito da antiga organização do ensino médio nacional: “Tinha de estudar também Química quem gostava de Literatura. E entediar-se como Filosofia quem queria ser físico.” Que respondam a restritiva ideia de formação do douto economista os exemplos de Carl Sagan, Einstein, Bohr e outros físicos e filósofos que felizmente não passaram pela estreita visão de educação do douto economista. No Brasil recordo o exemplo do zoólogo Paulo Vanzolini, que matriculado hoje no ensino médio, não teria a formação escolar em literatura e quem sabe não desenvolveria – ao lado do cientista – a condição de compositor musical.
12 – Aos poucos vamos observando como a dita reforma do ensino médio representa os interesses ideológicos da classe dominante, dos banqueiros e seus institutos e fundações transformando os professores em meros transmissores do conteúdo apresentado em suas apostilas reduzindo o processo ensino aprendizagem a condição de simples adequação ao mundo sem história da permanente submissão.
Ainda não encontrei, entre os defensores da revogação da dita reforma do ensino médio, um defensor da estagnação do modelo educacional e como foi possível observar esta posição pertence aos ditos reformadores.
WLADMIR COELHO – Professor do Instituto de Educação de Minas Gerais – IEMG; Superintendente de Juventude da SEE-MG; Editor do blog Política Econômica do Petróleo e Colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2018 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
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