Por Lucas Rubio –
Exatamente 31 anos depois da queda do socialismo na Bulgária, a situação social e econômica do país beira o colapso nunca antes imaginado num dos mais importantes países balcânicos.
Em 2009, uma pesquisa realizada pela Pew Global Attitudes Project demostrou que apenas 1 entre 10 pessoas na Bulgária acreditam que o país está melhor hoje no capitalismo do que no socialismo. Além disso, apenas 16% da população considera que o governo atua em benefício de todas as pessoas. Entre os argumentos, há sempre a lembrança de que no socialismo todos tinham trabalho, serviços públicos gratuitos e acessíveis, direito à moradia e a vida era relativamente cômoda.
Dados mostram que, hoje em dia, 50% da população búlgara vive em instabilidade econômica e risco grave de miséria.
Desde o fim do socialismo, mais de 20% dos búlgaros já deixaram o país em busca de empregos em outros lugares. Em várias regiões do país, aldeias e cidades estão praticamente desertas e sem qualquer perspectivas de futuro.
10 anos depois da pesquisa, em 2019, o canal de televisão Euronews fez uma reportagem na Bulgária acompanhando a vida de trabalhadores de uma indústria têxtil alemã baseada na cidade de Gotse Delchev. Os quase 2.000 operários da fábrica relatam que trabalham como robôs escravizados e denunciam a condição terrível dos salários baixos. O dono da empresa, entrevistado, diz que apesar de sua fábrica vender diretamente para grandes marcas como Hugo Boss, não há lucro suficiente para aumentar os salários.
Por essa razão, ele teria saído da Grécia (onde o salário era “alto demais”) e ido para a Bulgária em busca de melhores rendimentos e poucos encargos trabalhistas a pagar.
A Bulgária é hoje o país da Europa com o menor salário mínimo – cerca de 280 euros. A aposentadoria paga apenas 150 euros mensais aos idosos. Entrevistada pela equipe de TV, uma senhora que trabalhou em sua juventude na União Soviética relata que não tem dinheiro sequer para comprar carne e que aquece sua casa com lenha doada pelos filhos.
A condição miserável dos búlgaros causa dúvidas sobre o verdadeiro status do país dentro da União Europeia. Embora os custos de vida no país sejam os mesmos da Europa Ocidental, os salários e remunerações são migalhas e o bloco europeu intervém na economia interna exigindo cada vez mais “reformas” e políticas de austeridade.
A Bulgária, durante o seu período socialista, chegou a ser conhecida como “o Vale do Silício do Bloco Oriental” por ser um dos países socialistas com a melhor e mais avançada indústria informática. Em 1988, próximo da queda do socialismo, 100% das famílias possuíam TV em casa, 96% geladeira e máquina de lavar, 95% rádio e 40% um carro. Hoje, o fechamento de fábricas e o abandono de complexos industriais e institutos de pesquisa é algo recorrente no país, enquanto milhares de trabalhadores são frequentemente jogados à própria sorte.
A situação se repete de modo muito parecido em todo o Bálcãs e nos outros países da Europa Oriental, a citar Romênia, Albânia, Hungria, países da ex-Iugoslávia, Polônia e a parte oriental da Alemanha.
Três décadas após o fim do dito “regime totalitário do comunismo” e a introdução de reformas neoliberais que privatizaram todos os bens do país e removeram toda a segurança social da população, a queda do socialismo se prova cada dia mais uma verdadeira catástrofe que mistura exploração, injustiça, pobreza e pilhagem.
***
Fontes: Pesquisa de 2009 e dados adicionais – http://politicalaffairs.net/an-experiment-in-living-socialism-bulgaria-then-and-now/
Documentário da Euronews (que eu recomendo muito): https://www.youtube.com/watch?v=b_pJgKcXaCU
LUCAS RUBIO – Coordenador do Núcleo de Política Internacional do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Presidente do Centro de Estudos da Política Songun-Brasil; Graduado em Letras com habilitação em Língua Russa pela UFRJ.
MAZOLA
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