Por Gabriela Moura de Oliveira –
O assédio sexual é uma das formas de violência contra a mulher e a sua dignidade.
Historicamente, desde muito jovens, as mulheres são socialmente obrigadas a conviver com diversos tipos de assédio, sobretudo, com o assédio de cunho sexual, aonde quer que estejam.
O machismo ainda se perpetua na realidade social brasileira, o qual desvaloriza a figura feminina em detrimento da figura masculina. Apesar das grandes conquistas em busca de um espaço na sociedade, a cultura do desrespeito às mulheres pela simples condição de ser mulher prevalece até o presente momento.
Não poderia ser diferente no ambiente de trabalho, especialmente quando o homem está em posição de superior hierárquico e exerce poder de escolha quanto ao labor a ser realizado por uma mulher. Nessa realidade, em muitas das vezes, as origens machistas e arcaicas proporcionam ao homem a confiança de que em razão de seu cargo poderá submeter a funcionária a quaisquer de seus caprichos em virtude do controle de poder exercido.
A naturalização do assédio sexual no ambiente de trabalho é uma prática insidiosa e deve ser rechaçada. Neste meio, de acordo com o Superior Tribunal do Trabalho o conceito de assédio sexual se define como: “(…) o constrangimento com conotação sexual no ambiente de trabalho, em que, como regra, o agente utiliza sua posição hierárquica superior ou sua influência para obter o que deseja.”1
Assim, o assédio sexual no ambiente de trabalho pode ocorrer de duas formas: por chantagem ou intimidação.2 A primeira pode decorrer de uma proposta de índole sexual mediante à ameaça da perda do emprego, por exemplo. A segunda é caracterizada pela humilhação no ambiente de trabalho, a exemplo da exposição de fotos íntimas do superior hierárquico aos demais subordinados.
O crime em comento é vivenciado por muitas mulheres diariamente. Segundo dados divulgados pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, o número de processos aumentou em 72% em cinco anos.3
Em 2019, como forma de repreender a prática, o Código Penal foi alterado e passou a tipificar o crime de assédio sexual em seu artigo 216-A da seguinte forma: “Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”.4 Contudo, em virtude da penalidade branda, qual seja, de detenção de um a dois anos, a criminalização da conduta não apresentou grande eficácia social.
Em abril de 2022, o Tribunal Superior do Trabalho apresentou a Presidência da República a proposta de ratificação da Convenção 190 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) pelo Brasil, a qual prevê medidas contra o assédio e a violência no mercado de trabalho, a fim de garantir um ambiente livre e sadio.5 Entretanto, o Brasil ainda não ratificou a presente Convenção Internacional.
Apesar disso, no dia 21 de setembro de 2022, foi publicada a Lei nº 14.457, responsável por instituir o Programa Emprega + Mulheres, o qual possui como objetivo a inserção e a proteção das mulheres no mercado de trabalho. Como uma de suas principais medidas, a presente Lei impõe a prevenção e o combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no âmbito do trabalho, nos termos de seu artigo 1º, inciso VI.
A Lei mencionada dispõe de um capítulo inteiro sobre o assédio sexual, conferindo um prazo de 180 dias para a adoção das medidas impostas a partir de sua vigência. Em seu artigo 23, a Lei ressalta a instituição nas empresas de uma Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio (Cipa) com a finalidade de prevenir e combater não somente o assédio sexual, mas qualquer outra forma de violência no ambiente de trabalho.
Destaca-se que a Lei nº 14.457/2022 alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) por meio da inserção do artigo 163, especificamente sobre a obrigatoriedade de implementação da referida Comissão Interna (Cipa) nos estabelecimentos.
As áreas de Compliance se mostram cada vez mais necessárias no meio empresarial, pois buscam a manutenção do cumprimento das normas legais e regulamentares por toda a empresa, de forma a prevenir eventuais desvios de conduta por parte de seus empregados por meio da fiscalização ativa, o que agrega valor ao negócio em virtude de transmitir confiança e segurança ao mercado.
Dessa forma, a Lei nº 14.457/2022 enaltece a importância da área de Compliance mediante a autonomia conferida à Comissão Interna. Isso se verifica por intermédio da autorização legal à adoção das medidas adequadas e necessárias para promover, inserir e manter as mulheres no mercado de trabalho.
Ainda, o comando legislativo autoriza a inclusão de regras no regimento interno a respeito do assédio sexual e outras formas de violência; a fixação de procedimentos para acompanhar e receber denúncias, até mesmo, anônimas, e inclusive, a aplicar sanções administrativas. No mesmo sentido, propõe a realização de ações de capacitação, orientação e sensibilização de todos os empregados sobre os temas relacionados à violência contra a mulher, igualdade e a diversidade no âmbito do trabalho no mínimo a cada 12 meses.
Por fim, a Lei nº 14.457/2022 institui o Selo Emprega + Mulher, o qual se destina ao efetivo apoio fornecido pela empresa às empregadas vítimas de assédio, violência física e psicológica ou qualquer violação de seus direitos no local de trabalho.
Diante das inovações legislativas apresentadas, constata-se a evolução protetiva da mulher no âmbito das relações de trabalho, o que de fato, alimenta a esperança de um dia a mulher ser respeitada em pé de igualdade ao homem.
De fato, o que se espera é a aplicação integral da presente legislação e a sua fiscalização pelo Ministério Público do Trabalho, pois somente mediante os esforços institucionais adequados é possível elidir a violência contra a mulher em nossa sociedade.
2 Idem.
4 Decreto 2.848 de 1940 (Código Penal).
Bibliografia:
Decreto 2.848 de 1940 (Código Penal)
Lei nº 14.457/2022
https://www.tst.jus.br/assedio-sexual#:~:text=O%20ass%C3%A9dio%20sexual%20% C3%A9%20definido,para%20obter%20o%20que%20deseja
https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2022/07/23/no-de-processos-por-assedio-sexual-no-ambiente-de-trabalho-cresce-72percent-em-cinco-anos-no-trt-15.ghtml
https://www.tst.jus.br/-/presidente-do-tst-entrega-proposta-contra-ass%C3%A9dio-no-mundo-do-trabalho-a-bolsonaro
Gabriela Moura de Oliveira é advogada.
Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
PATROCÍNIO
Tribuna recomenda!
MAZOLA
Related posts
Editorias
- Cidades
- Colunistas
- Correspondentes
- Cultura
- Destaques
- DIREITOS HUMANOS
- Economia
- Editorial
- ESPECIAL
- Esportes
- Franquias
- Gastronomia
- Geral
- Internacional
- Justiça
- LGBTQIA+
- Memória
- Opinião
- Política
- Prêmio
- Regulamentação de Jogos
- Sindical
- Tribuna da Nutrição
- TRIBUNA DA REVOLUÇÃO AGRÁRIA
- TRIBUNA DA SAÚDE
- TRIBUNA DAS COMUNIDADES
- TRIBUNA DO MEIO AMBIENTE
- TRIBUNA DO POVO
- TRIBUNA DOS ANIMAIS
- TRIBUNA DOS ESPORTES
- TRIBUNA DOS JUÍZES DEMOCRATAS
- Tribuna na TV
- Turismo