Por Adroaldo Quintela e José Carlos de Assis –
A maioria dos cidadãos está se comportando como se eleger Lula Presidente da República é o bastante para a retomada do desenvolvimento sustentável do país a altas taxas, assim como para a reconstrução e consolidação da democracia representativa. É um tremendo equívoco. Lula, sozinho, não terá forças para enfrentar as terríveis travas que os governos Temer e Bolsonaro deixaram para seu governo, seja no plano legal, seja na forma de uma hegemonia parlamentar mais preocupada em defender os próprios interesses particulares do que os do país.
De fato, a base política e administrativa na qual se apoia o Presidente, formada por uma colcha de retalhos partidária, é extremamente frágil. Para ampliá-la, Lula tem que fazer recorrentes concessões. Hábil negociador, o Presidente contorna muitos empecilhos. Contudo, seu estoque de concessões não é infinito, especialmente diante do apetite de muitos grupos parlamentares acostumados ao velho estilo fisiológico de tempos anteriores. Talvez a alternativa seja recorrer ao poder supremo numa democracia: o povo.
Entretanto, as massas, por omissão de suas lideranças, têm tido um comportamento amorfo. Não há mais mobilização política real no país no campo democrático e popular. Todo o esforço para convencer o Congresso a assumir uma pauta progressista na esfera da política econômica fica nas costas do Presidente e de alguns ministros. E ninguém duvide que é justamente no campo da política econômica, cujos meandros não são muito bem conhecidos pelo povo, que está a chave da retomada do desenvolvimento sustentável da Nação.
Infelizmente, o ambicioso Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) de Lula pode morrer na praia, se não houver demonstração inequívoca de força popular para sustentá-lo. As prioridades nele indicadas correspondem às necessidades do país, as fontes de recursos, nele assinaladas, estão ao nosso alcance interna e externamente, e o engajamento privado nele é, sem dúvida, possível. O que o restringe, e o povo não sabe, é a política fiscal a que fomos obrigados a nos submeter.
Trata-se de uma tecnicalidade desconhecida da maioria da população. E a principal razão pela qual ela não se mobiliza para defender o programa governamental é que os próprios políticos do governo não têm sabido conduzir o grande debate sobre os destinos do país. A política tem sido reduzida à retórica, em especial a retórica antibolsonarista, quando esse assunto, para todos os efeitos práticos, está praticamente bem encaminhado, na medida em que o STF cuida magistralmente dele no nível legal, o mais adequado.
No nosso entender, as lideranças políticas da situação deveriam superar questões meramente ideológicas e exercer uma pedagogia “religiosa” junto ao povo para esclarecer os pontos vitais da política econômica que separam a Nação entre verdadeiros progressistas e grupos regressivos, muitos deles inconscientes. O divisor de águas, como mencionado, é a política fiscal. E, nela, as superstições do déficit fiscal zero, do teto de gastos e do equilíbrio orçamentário a qualquer custo.
O Presidente deu uma sinalização de que não sacrificará as políticas sociais e de desenvolvimento sustentável no altar do déficit zero, mas, em lugar de virem a público para esclarecer esses conceitos, políticos governistas preferiram reforçá-los com declarações ambíguas, para tranquilizar o mercado. Isso confunde a opinião pública e retarda qualquer iniciativa de mobilização popular por uma mudança efetiva na política econômica.
E, claro, sem mobilização popular, o Congresso não se move.
É extremamente difícil ganhar uma maioria permanente no Congresso. Entretanto, isso é simplesmente impossível se os parlamentares oposicionistas sentirem que a opinião pública está inconsciente e confusa diante das vacilações da política econômica. Portanto, os governistas têm que trazer a força do povo para o centro da cena, o que só é possível com efetiva mobilização das massas. Ao presidente deve caber a última palavra, em resposta à opinião pública.
Não há nenhuma desculpa para que organizações sindicais e os grandes movimentos sociais de mulheres, de negros, de estudantes, de profissionais pela democracia, da igreja progressista, da Ordem dos Advogados do Brasil, da Associação Brasileira de Imprensa e de movimentos sociais do campo e das cidades, e de outros grupos que se manifestaram antes das eleições, com grande força, se retraiam agora como se já não tivessem um papel político a desempenhar. Ao contrário. A luta verdadeira se dá agora, a fim de evitar que o Presidente fique isolado diante de forças poderosas das elites e das classes dominantes que tradicionalmente controlaram a Nação.
Na verdade, as lideranças políticas que apoiam o Presidente estão cometendo um erro estratégico. Em lugar de se organizarem para dar-lhe suporte político, com base em sua unidade, comportam-se como demandantes de interesses próprios. É como se a luta, com o resultado das eleições, tivesse sido ganha em caráter definitivo, e não pudesse haver possibilidade de reversão. Entretanto, há. Antes de “usar” a democracia é preciso consolidá-la. Consolidação da democracia significa promover o desenvolvimento.
Um fracasso do governo Lula seria o pior desastre da história republicana, similar ao que acontece na Argentina. E embora pouco provável neste momento, não é impossível, porque as travas ao desenvolvimento acima mencionadas poderão levar a uma grande frustração da opinião pública em relação a seu grande líder político histórico. Não podemos continuar sendo um país apenas de festas e de carnaval. A principal festa que temos de fazer, como mencionado, é a da democracia e do desenvolvimento.
Em razão disso, é preciso que todas as principais lideranças sociais, principalmente os dirigentes das Centrais Sindicais, dos Movimentos Negros, dos Movimentos de Mulheres e dos Estudantes, entre os outros acima citados, mobilizem suas bases a fim nos prepararmos para ir às ruas e praças das metrópoles e cidades de grande e médio porte, a fim de defenderem o programa de governo de Lula.
Dessa forma a Cidadania fará sua parte na grande luta política que definirá o futuro da Nação e do nosso povo!
ADROALDO QUINTELA – Economista, fundador da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) e diretor do Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas Gerais (IDENE).
JOSÉ CARLOS DE ASSIS – Jornalista, economista, doutor em Engenharia da Produção, autor de mais de 25 livros de Economia Política e introdutor do jornalismo econômico investigativo no Brasil com denúncias de escândalos sob o regime militar que contribuíram de forma decisiva para o desgaste da ditadura nos anos 80. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
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