Por Pedro do Coutto –
No programa Em Pauta da GloboNews, noite de terça-feira, foi discutida a caracterização ideológica a ser atribuída ao presidente eleito, Lula da Silva, que assume o governo na madrugada de 1º de janeiro. Alguns debatedores o identificaram como um homem da esquerda, outros de centro-esquerda, e eu acredito que Lula seja melhor definido como de centro avançado, preocupado, aliás como todos os cristãos, com a miséria, com a fome, na busca eterna pelo desenvolvimento e pela justiça social.
A posição de centro avançado inspirada na realidade da população brasileira não se volta, como não se voltou em momento algum, contra a propriedade privada, contra o lucro das empresas, contra os financiamentos estatais à iniciativa privada e à favor de uma política de emprego e de salários, sobretudo para que esses não percam para a inflação, pois neste caso estarão sendo reduzidos através do tempo.
PREOCUPAÇÕES – Foi exatamente isso o que aconteceu com a política do ministro Paulo Guedes adotada pelo governo Bolsonaro. Caso ser da esquerda é preocupar-se com a fome e a miséria, com a falta de saneamento, com a saúde pública e com o atraso registrado de 1,1 milhão processos de segurados não atendidos pelo INSS, tal posicionamento só pode ser considerado de esquerda ou de centro-esquerda se o compararmos com o extremismo da direita conservadora que considera um absurdo (falando ironicamente) que o presidente que desperta na alvorada de janeiro seja um revolucionário.
Reformista é a palavra correta e não representa absurdo algum sustentar simplesmente que todos devem poder tomar o café da manhã, almoçar e se alimentar à noite. O conservadorismo se enraizou de tal maneira no Brasil, sob a capa da mão de tigre do chamado mercado, que qualquer projeto de desenvolvimento social transforma-se em um perigo para o cenário estabilizado do capital que não remunera o trabalho à altura da dignidade do ser humano.
Daí a favelização, do déficit habitacional, a inexistência de esgoto para metade da população brasileira, a falta de água potável para 25% dos habitantes. São dados estarrecedores e preocupantes para com o futuro.
ONDA REFORMISTA – – Futuro? Será de esquerda combater o desmatamento da Amazônia e o garimpo ilegal ? Será de esquerda combater as fraudes na administração pública e a corrupção sem fronteiras ? Lula da Silva governou o Brasil por oito anos; não deu qualquer sinal de ameaça à democracia e à liberdade. Assumirá um terceiro mandato conquistado nas urnas de outubro, integrando-se na onda reformista que deve renascer com a sua posse no Planalto.
É tempo de alvorada e de reforma social, mas não de um posicionamento na esquerda, sobretudo porque o radicalismo esquerdista no mundo desabou com o Muro de Berlim em 1989 e com o fim da União Soviética em 1991. O pensamento no sentido da reforma converge com o humanismo que no fundo encontra sua mais forte inspiração no cristianismo surgido há dois mil anos. Hoje, ninguém pode defender a escravidão , a opressão, a fome, a miséria e a tortura diária proporcionada por uma desigualdade que ultrapassa as fronteiras do próprio humanismo e da humanidade.
ELETROBRAS – Numa excelente reportagem, O Globo desta quarta-feira, Manuel Ventura e João Sorima Neto revelam que a equipe de transição de Lula da Silva propõe alterar para melhor a privatização da holding aprovada em junho pelo governo Bolsonaro. A meu ver, não se compreende a privatização de uma empresa já por si privatizada na medida em que suas ações encontram-se nas Bolsas de Valores de São Paulo, de Nova York e de Madrid.
A manobra efetuada voltou-se para a privatização do comando da empresa, que é algo bem diferente da sua privatização total, e criou uma contradição como sustenta Manuel Ventura e João Sorima Neto de a União não deter o comando de uma empresa da qual detém 42%. Revela-se estranho, portanto, que um grupo que possua 10% ou 12% do sistema acionário possa comandar uma holding 42% estatal. Há outros fatos.
Um deles, o de que Furnas emitiu R$ 180 milhões em debêntures para pagar dívidas em favor da Odebrecht e da Andrade Gutierrez pela construção da Usina de Santo Antônio em Rondônia. O pagamento feito por Furnas foi considerado essencial para que a privatização se realizasse.
DÍVIDA – Ocorre que na empresa subsidiária Santo Antônio Energia, Furnas detinha mais de 35% das ações e outros 35% praticamente divididos em partes iguais pela própria Odebrecht e pela Andrade Gutierrez. Ambas figuram, portanto, entre os proprietários do empreendimento. Assim, a Santo Antônio Energia pagou uma dívida para dois de seus proprietários e o pagamento foi realizado com um endividamento adicional da própria empresa de Furnas.
O ativo da Eletrobras foi subavaliado amplamente. Afinal, quanto vale as usinas de Furnas, da hidrelétrica de São Francisco, da EletroSul e da EletroNorte? Quanto valem as linhas de transmissão através das quais Furnas interliga a produção da Usina de Itaipu ao sistema elétrico brasileiro? Divulgou-se que o ativo foi avaliado por baixo em R$ 176 bilhões. Compare-se esse valor com o valor das transações internacionais de preço muito alto envolvendo empresas muito menores. O grupo de transição de Minas e Energia, no caso Eletrobras, terá muitas tarefas pela frente.
PEDRO DO COUTTO é jornalista.
Enviado por André Cardoso – Rio de Janeiro (RJ). Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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