Por Siro Darlan –
Série Presídios VI.
Essa semana o empresário Emilio Odebrecht lanço o livro UMA GUERRA CONTRA O BRASIL: COMO A LAVA JATO AGREDIU A SOBERANIA NACIONAL, ENFRAQUECEU A INDÚSTRIA PESADA BRASILEIRA E TENTOU DESTRUIR O GRUPO ODEBRECHT. No livro Emílio relata então a batalha jurídica que enfrentou e diz que uma “fábrica de delações” foi montada pelo então juiz Sergio Moro (eleito senador em 2022) e pela força-tarefa de procuradores do Ministério Público Federal em Curitiba, à época comandada por Deltan Dallagnol (atual deputado federal).
Também na última semana o STJ utilizando expressões como “erro judiciário gravíssimo” e “ilegalidade gritante” absolveu da acusação de roubo um porteiro negro, que respondia a outros 61 procedimentos criminais por reconhecimento fotográfico.
O Ministro Sebastião Reis Júnior atestou que não há como ignorar a existência de racismo também nas investigações criminais, mesmo que a discriminação não se manifeste de maneira clara.
“O preto pobre é o principal alvo da atuação policial”, destacou o magistrado ao lembrar que, nas abordagens da polícia, cotidianamente, há diferenças de tratamento em relação a pessoas da periferia e a moradores das regiões mais ricas.
Já o Ministro Rogerio Schietti Cruz disse que a situação do processo é “absolutamente vergonhosa” e revela “desprezo pelo ser humano” em uma ação conduzida a partir de reconhecimento fotográfico feito em total desacordo com as formalidades prevista na lei.
Procurei saber o que pensa o interno M.A.S. de dentro do Complexo de Gericinó a quase 9 anos preso que assim se manifestou:
“Quando se chega ao sistema nenhuma lenda é falsa, muito pelo contrário, a insalubridade e vertiginosa, esgoto nas galerias, superlotação e a falta de água para suprir os apenas e constante. Aqui na Lemos de Brito, após uma falha de segurança explorada por três presos, sofremos diariamente o revanchismo estatal. A mídia que divulgou a fuga, usou todo o poder do seu sensacionalismo para expor a corrosão de uma das sazonas caixa preto do Estado do Rio de Janeiro. Expos a falta de estrutura em diversos pontos de uma secretaria que se gabava da sua excelência tecnologia, câmeras que não funcionas, quadros de luz encharcados pela chuva, campo de futebol para recreação abandonados a sua natureza e a alimentação, o que falar da alimentação? Galões de água sujas que eles dizem ser feijão, arroz cru, pães com a massa pálida de malcozida, isto e o comum da cadeia.
Isso apenas foi agravado pela fuga, não tendo a quem culpar a SEAP apenou, mirou os mais fracos, nós vivendo uma pressão medida de segurança, nos foi retirado as únicas comunicações legais que o estado nos permite ter, que são as tvs e os rádios, nos retiraram as visitas e visitas intimas e nos colocaram em um castigo coletivo, fomos punidos coletivamente por não fugir, quem ficou, foi colocado num castigo logicamente impossível, a SEAP nos deu um recado claro: Quem não fugir será punido.
Hoje 3 meses após a fuga, pouca coisa mudou, a SEAP destruí rádios e tvs comprados pelas famílias dos presos, e na outra penta a SEAP preferiu fazer uma boa ação, doar para hospitais e orfanatos, outra pequena parte foi devolvida, seria cômico se não fosse trágico. Os órgãos de defesa do preso nada disseram, nada falaram, silencio total, serviços como Defensoria, Conselho Penitenciário, Ministério Público silenciaram-se, nada falaram sobre as condições que a SEAP nos impôs, nada falou sobre pegar todos os presos classificados de alta periculosidade e colocados em regime disciplinar, diferenciado do Bangu I, sem nada que eles tivesse feito, sobre proibir as visitas intimas 3 meses, sobre a alimentação precária e sobre o fato de isolar todo o coletivo de informação externas, via rádio e tv, causando alienação e um sentimento de angustia. Vivemos sob o paternalismo estatal, ele decide sobre o indivíduo impondo sua vontade pela forca, perderemos não apenas o direito à liberdade, mas perdemos o direito a justiça, seus agente ( promotores, juízes, desembargadores e ministros) interpretam as leis a seu bel prazer, o Código Penal e a LEP para eles nada servem, conhecemos por suas instalações as penitenciarias e o estado, apesar da arrecadação de impostos (é sua caixa preta, pois não há transparência do que é feito com a arrecadação) não oferecem vestuários e nem material higiênico, a alimentação passa longe de qualquer orientação nutricional e de qualquer inspeção sanitária, o cardápio de alimentos malcozidos e de insetos e pedaços de coisas achadas (como pedras, plástico e objetos não identificáveis), são oferecidos à massa carcerária, que refém de cantinas com preços absurdos é obrigada a consumir uma alimentação degradante. A cantina é outro problema, controlada por não sei quem, cobra o olho da cara por insumos básicos que a maior parte dos presos que não tem visita e nem custodia é obrigada a consumir, como não há concorrência, monopólio desses produtos e sempre superfaturado, com quem reclamar? Outro problema é a instalação com celas para quatro pessoas, mas não são exceções celas com o dobro de presos amontoados no chão frio, a vulnerabilidade e a doença que mais mata no sistema e eles não sabem o porquê. Estou hoje no regime semiaberto, em uma penitenciaria de regime fechado, sem campo para recreação. A colônia agrícola é um conto de fadas. Muda-se o regime, e nada muda para o preso que continua em um regime mais severo do que a lei diz. A ainda há os juízes da VEP, que ignoram a classificação individual do preso e negam benefícios básicos como a visita periódica a família com argumentos mais absurdos impossíveis, trata-nos genericamente dizendo que estamos imaturos e com pouco tempo no regime semiaberto. Então o STJ é mentiroso pois diz que o tempo que conta para esses benefícios é o tempo de regime fechado, dizem que a longa pena a cumprir e risco para um futuro evasão, pelo amor de Deus, além desses juízes trabalharem com futurologia e adivinhação, desconsideram que ou a longa pena a cumprir que nos fez demostrar tanto tempo para chegarmos a semiaberto, e para além disso, nos julgar mais uma vez, uma vez que já fomos sentenciados.
Esses juízes ignoram se trabalhamos, se estudamos, se não temos faltas disciplinares, num eterno looping de recorta e cola e cospem no Código Penal e não aplicam a Lei de Execuções Penais, fazendo o que querem, como querem e no tempo que querem, um absurdo o tempo que levam para julgar um pedido de benefício, não levam em consideração o transtorno de saúde mental que se encontram os presos, que vivem em uma bolha de pressão psicologia, além do estresso do convívio preso, temos os estresses das ferais onde a humilhação do esculacho que fazem com nossos pertences, sem respeito algum, rasgam colchoes, lençóis e travesseiros, destroem bolsas com alimentação, quebram baldes e galões de agua e jogam nossas roupas no chão molhado, o preso agoniado para abandonar esta realidade angustia-se com a esperança de ver sua família no seu lar.
A evasão e uma realidade imposta por esse mesmo estado que dá o benefício, não são poucos os relatos de zombaria e xingamentos dos servidores da SEAP para quem retorna, a SEAP, o Ministério Público sem um plano de reinserção do apenado ao convívio social, são raras as empresas que contratam ex-detentos, imagina só detentos para oferecer uma carta de emprego para esses trabalharem. O que o estado oferece? Então temos um exército de ex-presidiários sem formação, sem instrução, deixando os presídios com a responsabilidade de sustentar, para a sorte dele e para o azar do estado, o crime está sempre com vagas abertas”.
Não sem razão concluiu o Ministro Schietti: “A mim, particularmente, me envergonha, por ser integrante desse sistema de Justiça – um sistema de moer gente. É uma roda viva de crueldades. Nenhum de nós pode avaliar o que representa três anos dentro de uma cela fétida, insalubre e apinhada de gente, como é a situação desse rapaz”.
Leia também:
1- A roubada dos presídios federais – por Siro Darlan e Raphael Montenegro
2- Para que servem os presídios? – por Siro Darlan
3- Como transformar seres humanos em seres sem dignidade humana – por Siro Darlan
4- A guerra aos povos pobres e negros com nome de “guerra às drogas” – por Siro Darlan
5- O dia que a casa caiu – por Siro Darlan
SIRO DARLAN – Editor e Diretor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Juiz de Segundo Grau do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Especialista em Direito Penal Contemporâneo e Sistema Penitenciário pela ENFAM – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados; Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos na ENSP; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo; Membro da Comissão da Verdade sobre a Escravidão da OAB-RJ; Membro da Comissão de Criminologia do IAB. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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