Por Jorge Folena

O depoimento dos irmãos Miranda, prestado à CPI da COVID-19, no Senado da República, em 25 de junho de 2021, deixou muito clara, finalmente, a prática de corrupção dentro do governo de Jair Bolsonaro, em particular no Ministério da Saúde, entregue ao comando dos militares do Exército Brasileiro, na pessoa do general Eduardo Pazuello.

Segundo o Senador Randolfe Rodrigues (Rede/AP), vice-presidente da Comissão, “a CPI encontrou o maior esquema de corrupção da história da República”. Isto porque não foram apenas os bilhões empenhados para a compra de uma vacina sem eficácia e com preço superfaturado, mas porque foi orquestrado todo um esquema para a não aquisição de outras vacinas, aprovadas pela ANVISA, que já poderiam ter imunizado mais da metade da população brasileira e evitado milhares de mortes.

Diversas vacinas foram oferecidas para o governo brasileiro, com preços inferiores, mas foram recusadas, pois já tinha sido definida por eles a escolha de uma outra, de qualidade duvidosa e sem aprovação na agência de vigilância, questão “resolvida” pelo líder do governo, integrante da base de apoio do bloco parlamentar do “centrão”, que teria apresentado uma emenda parlamentar para facilitar a sua compra pelo Ministério da Saúde.

Até aqui, as múltiplas infrações decorrentes das ações e omissões do presidente, que causaram milhares de mortes em consequência da COVID-19, por si sós justificariam a abertura de processo político para o seu impedimento e/ou apresentação de denúncia criminal no Supremo Tribunal Federal.

Porém, a partir das declarações da sexta-feira de 25/06/2021, na CPI, pode-se dizer que, por enquanto, ele está incurso, em tese, pelo menos no crime de prevaricação, pois foi comunicado das irregularidades na compra da COVAXIN, mas nada fez e somente solicitou a apuração do caso pela Polícia Federal depois que o escândalo denunciado pelos irmãos Miranda veio à tona pela CPI.

Ocorre que, além da provável infração criminal apontada contra o Presidente da República, segundo os depoimentos das testemunhas, o líder do governo na Câmara dos Deputados (o mesmo que apresentou a emenda parlamentar para facilitar a aquisição da COVAXIN), foi apontado por Jair Bolsonaro como sendo o responsável pela compra irregular da referida vacina, tendo se referido ao episódio, na presença dos depoentes, como “coisa do Barros”.

Ou seja, está muito claro que a corrupção é de pleno conhecimento do Palácio do Planalto, conforme afirmação do próprio presidente da república aos irmãos Miranda, e dela faz parte direta a liderança da sua base parlamentar, cujo apoio tem sido cevado com muito dinheiro público do orçamento e que está agora sob a acusação da prática de corrupção.

Sendo assim, o governo e sua base parlamentar (formada pelo Centrão), diante das evidências de corrupção e prevaricação, não têm mais legitimidade para aprovar nenhuma medida contra os brasileiros, por estarem sob grave suspeição.

Por isso, é necessário que seja aberto, com urgência, o processo de impeachment e que simultaneamente seja apresentada denúncia criminal contra o Presidente da República e o deputado líder do governo na Câmara dos Deputados, a fim de serem processados, nos termos da Constituição, com observância do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, por suas respectivas condutas.

Então, é preciso que o procurador geral da república, o presidente da câmara e dois terços dos deputados e deputadas assumam o seu papel institucional, como determinado pela Constituição, que não pode mais continuar a ser interpretada conforme interesses patrimonialistas, em detrimento das reais necessidades da população, pois já são responsáveis, conjuntamente, pela morte de mais de meio milhão de brasileiros.

Enquanto os integrantes da Câmara (leia-se: “Centrão”) não assumirem sua responsabilidade nesses desmandos, é inaceitável a votação ou aprovação de qualquer proposta encaminhada pelo governo ou por sua base de apoio no Congresso, pois encontram-se sob grave suspeição e destituídos de qualquer legitimidade.

E, diante das acusações apresentadas e suas sistemáticas omissões, deverão também ser julgados perante seus eleitores em 2022.


JORGE FOLENA – Advogado e Cientista Político; Doutor em Ciência Política, com Pós-Doutorado, Mestre em Direito; Diretor do Instituto dos Advogados Brasileiros e integra a coordenação do Movimento SOS Brasil Soberano/Senge-RJ. É colunista e membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre, dedica-se à análise das relações político-institucionais entre os Poderes Legislativo e Judiciário no Brasil.