Por Jeferson Miola

Com a transição de governo começa vir à tona a realidade sobre o descalabro das finanças nacionais, a devastação da institucionalidade governamental e o desmonte avançado de instrumentos fundamentais de gestão de políticas públicas.

As informações e dados acessados pelas equipes do gabinete de transição não só confirmam a desgraceira que já se conhecia sobre a herança deixada pelo governo militar presidido por Bolsonaro, como mostram que em várias áreas a situação é muito mais grave do que se suspeitava.

O gabinete de transição recebeu do Tribunal de Contas da União [TCU] documentos com diagnósticos e subsídios sobre esta realidade. Estes trabalhos estão disponíveis no site do gabinete de transição.

O TCU “apontou 29 áreas que representam um alto risco para a Administração Pública federal devido à vulnerabilidade a fraude, desperdício, abuso de autoridade, má gestão ou necessidade de mudanças profundas para que os objetivos das políticas públicas sejam cumpridos”.

O relatório menciona “problemas crônicos e de grande impacto” em praticamente todas as áreas de governo. É um cenário devastador.

O Tribunal cita problemas como pagamento de auxílio federal a pessoas indevidas [como a 79 mil militares e a empresários bolsonaristas]; demora na concessão de benefícios pelo INSS, causa do estoque de cinco milhões de pessoas com benefícios atrasados; falhas na governança fiscal; ineficiência na execução de políticas públicas; prejuízos para a redução das desigualdades sociais e regionais; falta de confiabilidade e de segurança de dados e dos sistemas federais; problemas na gestão de obras paralisadas, falha na fiscalização e no combate ao desmatamento ilegal etc.

O processo de transição de governo tem antecipado a revelação de aspectos escondidos pela política de sigilo, opacidade e falta de transparência do governo Bolsonaro.

Além de casos de negligência e incompetência, há também várias denúncias de improbidade, corrupção e ilicitudes. A partir de 1º de janeiro, com a quebra daqueles sigilos decretados ilegalmente, os órgãos de fiscalização e controle terão condições de apurar e identificar responsáveis.

Os militares estão legando aos brasileiros um país arruinado e destroçado, que precisará ser inteiramente reconstruído, num esforço de muitos anos. Era uma tragédia anunciada.

O saldo da intromissão indevida e inconstitucional dos militares na política – tal como ocorreu na ditadura e agora, no atual governo – é desastroso para o país: arrocho salarial, carestia, miséria, fome, descontrole, violência, aumento das desigualdades, incompetência e destruição.

A semelhança do desastre atual com aquele da ditadura [1964/1985] não é casual, é repetição previsível.

É uma repetição histórica que acontece ao mesmo tempo como farsa e tragédia em um país sujeitado à tutela militar e habituado a contemporizações, conciliações por cima e anistias.

JEFERSON MIOLA – Jornalista e colunista desta Tribuna da Imprensa Livre. Integrante do Instituto de Debates, Estudos e Alternativas de Porto Alegre (Idea), foi coordenador-executivo do 5º Fórum Social Mundial.

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