Por Miranda Sá –
A genialidade do dramaturgo, poeta e filósofo alemão Bertolt Brecht, estrela ofuscante da arte teatral no século 20, condenou o “Escapismo”, lembrando “que continuando a nos omitir da política é tudo o que os malfeitores da vida pública mais querem”.
Brecht deu como exemplo o “analfabeto político”, a pessoa que não ouve, não fala, nem acompanha as ações de governo. “Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas”, escreveu.
Como verbete dicionarizado, “Escapismo” é um substantivo masculino, significando a tendência de se afastar de situações ruins considerando-se incapaz de resolve-las; é a fuga da realidade ou do cotidiano por meio da abstração, da fantasia. Vem do inglês, “escapism” que no brasilês se formou com escapar + ismo.
Alguns estudiosos atribuem esta palavra ao célebre mágico Harry Houdini, famoso pelo ilusionismo como a arte de escapar de prisões consideradas intransponíveis. Por isto, chamavam-no “escapologista”.
Daí o termo entrou para a cultura contemporânea, expressando-se notadamente na literatura pelo romantismo baseado em situações imaginárias de fuga de problemas aparentemente reais.
No cinema, encontramos a chamada ficção especulativa que traz à telona fantasias, terror e a atraente ficção científica. Especialistas dizem que isto expressa a excelência do “escapismo”.
Aliás, a cultura norte-americana é riquíssima em escapismo, que notadamente se difundiu após a “grande depressão” – a quebra do mercado de ações em 1929. Alan Brinkley, autor do badalado livro sobre este fato que abalou o mundo, “Culture and Politics in the Great Depression”, considera que historicamente foi o escapismo que ajudou o povo norte-americano a atenuar o medo da retração econômica, e escapar mentalmente da pobreza em massa surgida no país.
Assim se viu no jornalismo, nos filmes e matérias radiofônicas. O melhor exemplo é a revista Life, que se tornou popular pelas entrevistas otimistas, reportagens romantizadas sobre os esportes e belas fotos de jovens mulheres na praia. Tudo, menos pobreza e desemprego.
Os EUA escaparam da miséria pelo New Deal de Roosevelt, mas a tendência ao escapismo se revigorou após a Segunda Guerra Mundial e recentemente após o 11 de Setembro.
Freud considerou uma dose de fantasia escapista como um elemento necessário na vida dos humanos: “Eles não podem prescindir da satisfação de extorquir da realidade”. Infelizmente isto é obtido muitas vezes pelo uso de drogas, perversões sexuais e ideação suicida.
Constatamos tristemente que isto vem ocorrendo entre nós. Fugir à realidade e à rotina, é um pensamento que grassa entre os mais jovens que encontram motivos para escapar das decepções e emoções desagradáveis.
A violência reinante, social e politicamente, provoca a deserção para se salvar do caldeirão aonde ferve a corrupção parlamentar e judicial, e dos governos populistas demagógicos que se alternam pela satânica polarização eleitoral.
Não quero que se estabeleça a sociedade dos “Elói” formada por indivíduos indiferentes ao seu entorno, como nos mostrou o filme “A Máquina do Tempo”, baseada no livro de H.G. Wells do mesmo nome; condeno por isto o escapismo dos que não lutam contra o sistema estabelecido.
Não combater a corrupção, o desleixo na administração pública e a injustiça na conjuntura que atravessamos, como fazem os escapistas por conveniência pessoal, covardia ou fanatismo partidário, torna-os cúmplices da maligna realidade criada pelos ocupantes dos três poderes republicanos que se misturam diabolicamente.
Muitos desses evadidos da honestidade e do patriotismo estão anestesiados pela imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta, divulgadora do escapismo. A chamada “grande mídia” nos dá o exemplo mais do que perfeito disto com a descarga de reportagens nos jornais e revistas e a copiosa cobertura televisiva do show de Madonna…. Influenciam pessoas com apenas um ovo da geladeira a se deslocar para Copacabana e vê-la na janela do Hotel.
Graças à lavagem cerebral do escapismo brasileiros comem nas mãos dos polarizadores populistas mesmo enfrentando a carestia de vida, os altos preços dos remédios, sem ter Educação, sem uma Justiça confiável e sem Segurança.
Atentem: Não é por acaso o combate contra as redes sociais independentes, que mostram a realidade, que criticam, denunciam e reivindicam.
MIRANDA SÁ – Jornalista profissional, blogueiro, colunista e diretor executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como a Editora Abril, as Organizações Globo e o Jornal Correio da Manhã; Recebeu dezenas de prêmios em função da sua atividade na imprensa, como o Esso e o Profissionais do Ano, da Rede Globo. mirandasa@uol.com.br
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