Por Amirah Sharif –
E por falar em rainha, me lembrei das abelhas e, por falar em abelhas, lembrei-me que elas estão ameaçadas de extinção. “Se as abelhas deixassem de existir, o mundo entraria em um caos sob diferentes aspectos”, revela Carlos Alfredo Lopes de Carvalho, engenheiro agrônomo, doutor em Entomologia.
Como assim?
“Sabemos que as abelhas são muito importantes para a polinização e a manutenção dos ecossistemas. A importância das abelhas para o meio ambiente se explica por um simples fato: elas possuem papel chave para plantas e animais”, esclarece Bruno Freitas De Conti, também engenheiro agrônomo e mestre em Entomologia.
“Em relação às plantas, o inseto é responsável por polinizar diferentes espécies vegetais, um dos mais importantes serviços ecossistêmicos: esse processo de transferência de grãos de pólen para o estigma da flor resulta na reprodução das plantas, que, por sua vez, cria frutos e sementes. A partir desse ponto, é clara a relação com os demais organismos da natureza. As plantas e frutos constituem, em meio natural, a base da alimentação de animais herbívoros, que, por sua vez, são a base de alimentação de animais carnívoros e até a dos seres humanos.”
Segundo uma pesquisa realizada pela Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, é estimado que um terço dos alimentos consumidos globalmente é dependente do trabalho das abelhas. A pesquisa indica, ainda, que o inseto é responsável pela polinização de 80% dos cultivos no planeta. E, junto com outros estudos, os argumentos levantados pela Universidade de Cornell acrescentaram à ideia do bee apocalypse (do inglês, apocalipse das abelhas), que diz que a vida na Terra acabaria, caso as abelhas fossem extintas.
“É nesse contexto que se justifica a importância das abelhas para o meio ambiente e toda a preocupação com a sua preservação, uma vez que se trata de um elo fundamental no equilíbrio entre as comunidades vegetal e animal”, continua Carlos.
É fantástico!
Ao ler uma entrevista com Sinval Silveira Neto, ex-chefe do departamento de Entomologia da ESALQ-USP e Raimundo Rabelo, médico-veterinário e professor do curso de Medicina Veterinária da Universidade de Franca, entendi melhor o fantástico mundo das abelhas. De início, nos deparamos com a arquitetura das colmeias e nos perguntamos o porquê de suas células terem forma de hexágono. Existem apenas três figuras geométricas regulares capazes de formar um mosaico sem deixar espaços vazios: o triângulo, o quadrado e o hexágono. Destes, o polígono de seis lados é o que apresenta maior área e menor perímetro, ou seja, é ideal para armazenar o máximo de mel gastando o mínimo de cera para sua construção. E tem mais: além dessa arquitetura incrível, as colmeias são climatizadas. Sim, climatizadas! A temperatura interna deve ficar entre 34°C e 36°C para garantir a textura correta da cera. Quando esse valor é ultrapassado, as operárias entram em ação, batendo as asas para ventilar ou trazendo gotículas para refrescar o ambiente. Essas abelhas são realmente criaturinhas geniais!
Abelha, a rainha
Numa colmeia, as abelhas fêmeas podem por ovos ou trabalhar. A que põe os ovos é chamada de rainha, e as que trabalham, de operárias e enquanto as operárias se alimentam com geleia operária, a rainha é nutrida com geleia real, que contém mais açúcar. Uma proteína contida nesse alimento ativa uma enzima que faz o corpo da abelha rainha crescer, distinguindo-a das operárias. Já os zangões são o produto de óvulos não fecundados que se desenvolvem com a função de fecundar a abelha rainha para garantir a continuidade da colmeia. Nem sempre esse papel é exercido, mas, para aqueles que, de fato, copulam, esse é o fim da linha. Isso porque seus órgãos genitais ficam presos à fêmea após o ato sexual, levando a uma morte rápida.
Mais curiosidades
O zumbido é uma das características mais marcantes das abelhas, mas engana-se quem pensa que ele é uma forma de comunicação entre esses animais. Na verdade, esse ruído é produzido pelas asas batendo no ar, devido sua alta velocidade. E isso não é exclusivo das abelhas, também ocorre com mosquitos, moscas e besouros, mas o que torna interessante tudo isso é que essa vibração de asas desses insetos estimula algumas plantas a aumentar temporariamente a concentração do néctar de suas flores. Mas, se o zumbido não é comunicação, como as abelhas falam umas com as outras? Simples: elas dançam! Se a fonte de néctar ou pólen está próxima da colmeia, isto é, a menos de 100 metros, esses insetos executam uma coreografia circular. Quando o achado está mais longe, as abelhas requebram para indicar a posição exata, que é decodificada a partir da vibração produzida e da posição da abelha dançarina e do sol.
Aceita um cafezinho?
Mas o que tem a ver café e abelha? A maioria das abelhas se alimenta de água, néctar e pólen encontrado nas flores, mas embora as abelhas não consumam a bebida quente muito popular entre os humanos, elas também adoram cafeína. Algumas flores possuem altas doses desse estimulante natural, atraindo as abelhas e “viciando-as”. É provável que se trate de uma estratégia evolutiva para garantir a perpetuação dessas espécies de planta.
Quanto a mim, vou garantir minha “perpetuação” tomando meu cafezinho diário.
O mel nosso de cada dia
Os apreciadores de mel sabem que essa iguaria pode variar bastante, tanto em sabor, quanto em preço.
O mel mais caro do mundo é produzido pela uruçu, uma espécie de abelha sem ferrão. Encontrado na Bahia, ele pode chegar a custar dez vezes mais do que o modelo comum. Já o mel mais raro do mundo é fabricado exclusivamente pelas abelhas gigantes do Himalaia e só pode ser colhido pela população nativa do leste do Nepal. Os locais o chamam de mad honey (mel louco), devido aos seus efeitos alucinógenos.
E por falar em mel, saibam que são poucas as abelhas que produzem esse alimento. Das cerca de 20 mil espécies conhecidas, pouco mais de 500 fabricam mel. E, mesmo assim, em alguns casos, ele pode não ser adequado para consumo humano. Uma abelha é capaz de produzir apenas 5 g de mel por ano. Parece muito artesanal, mas o grande número de abelhas na colmeia faz com que a produção seja mais significativa, podendo chegar a 250 kg por ano, mas, para isso, é necessário visitar mais de 1 bilhão de flores. “Não é brinquedo, não!”
O que aconteceria se as abelhas fossem extintas?
Além do impacto direto na alimentação de animais herbívoros e carnívoros causadas pela dependência da polinização, a ausência do inseto ocasionaria na perda da diversidade vegetal e animal. Atividades humanas também seriam impactadas, desde a produção de alimentos de origem vegetal e animal até a fabricação de fármacos, cosméticos, bebidas, cultura, lazer e outros fatores associados a produtos e subprodutos das abelhas.
“Considerando o extenso número de espécies vegetais polinizadas por abelhas, a ausência delas poderia provocar o desequilíbrio de diversos ecossistemas. Além dos impactos no meio ambiente, a produção agrícola de diversos itens de consumo básico estaria ameaçada”, acrescenta o engenheiro Bruno.
Proteção às abelhas, já!
Um levantamento realizado pela Agência Pública e Repórter Brasil em 2019 revelou que meio bilhão de abelhas foram encontradas mortas no país. O número se soma a uma constante dizimação desses insetos, que andam sendo incluídos aos poucos na lista de espécies em extinção desde 2016. De acordo com o engenheiro Carlos Alfredo Lopes de Carvalho, vários motivos podem ser associados a essa diminuição. Entre eles, encontra-se a redução da área vegetal ou a sua simplificação, que impacta na qualidade nutricional das abelhas e pode impedir o fluxo gênico (ou mistura) das populações. Isso causa uma perda de diversidade genética e aumenta, também, o risco ao animal. A mudança, para ele, pode começar mesmo pequena: contribuir com ações de preservação e plantio de árvores na região e participar de eventos de educação ambiental também significa cuidado com o inseto. Já o engenheiro Bruno Freitas De Conti argumenta que, “para entendermos o que podemos fazer para proteger as abelhas, basta pensarmos em como podemos atenuar as modificações que fizemos no meio ambiente”.
“Juntos, temos condições de contribuir de maneira definitiva para a manutenção das populações de abelhas em nosso país”, finaliza Bruno. Concordo. Salvemos nossas abelhas: rainhas e operárias., porque umas não podem viver sem as outras e nós não podemos viver sem elas.
AMIRAH SHARIF é jornalista, advogada, protetora dos animais e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. asharif@bol.com.br
Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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