Por Amirah Sharif

Essa coluna não poderia começar em melhor momento. Logo após o abril laranja, quando se evidencia o combate aos maus-tratos contra os animais, iniciamos maio com o firme propósito de oferecer a eles proteção permanente. Conforme indica a campanha do mês que passou, não basta apenas alimentar e não agredir fisicamente. Como qualquer outro ser vivo, os animais merecem respeito, proteção, atenção e direitos.

E são esses direitos que vão nos pautar.

Estaremos atentos ao que é errado, ao que pode ser melhor e também às iniciativas e demandas daqueles que amam cuidar dos animais domésticos ou não. Enfatizo que essa coluna deseja ser uma via de mão dupla com o leitor e qualquer dúvida, história, denúncia e propostas de um mundo melhor para a bicharada podem ser enviadas para o e-mail: asharif@bol.com.br

Animais como sujeitos de direito

A questão não vem de agora e a discussão não é recente. As pessoas sempre tiveram dificuldade de compreender que o ser humano é um sujeito de direito. Pois é. Quem diria, então, que nosso grau de evolução e consciência cresceriam a tal ponto de compreendermos que o mundo não é só composto por pessoas, que existem animais que coabitam esse mundo e que esses animais também têm direitos como nós?

É importante conceber os animais não-humanos como sujeitos de direitos morais básicos, tais como vida, liberdade e integridade física A ideia de “coisificação” dos animais está ultrapassada e as legislações de vários países já contam com avanços na proteção dos mesmos, criminalizando práticas de maus tratos e concebendo aos animais um tratamento diferenciado, como seres dotados de individualidade, como fez a França quando passou a reconhecer os animais como seres vivos dotados de sensibilidade.

Como curiosidade, vou lhes contar duas situações em que se utilizou de leis de proteção aos animais para defender seres humanos de maus tratos: uma, nos Estados Unidos e outra, no Brasil.

Exemplos

Nos Estados Unidos, em 1874, houve o caso da menina Mary Ellen, submetida a maus tratos e à crueldade por seus pais adotivos. Uma vizinha pediu a um defensor local de direitos dos animais para intervir e, com sucesso, a mãe adotiva da pequena Mary foi levada a julgamento, na Suprema Corte do Estado de Nova Iorque. O defensor alegou que, se os animais se encontravam legalmente protegidos e Mary Ellen, como humana, pertencia ao reino animal, a ela também deveria lhe ser garantida proteção.

No Brasil, na década de 30, o grande advogado Heráclito Fontoura Sobral Pinto foi designado para defender Luiz Carlos Prestes, líder dos comunistas. A OAB estava recém-criada, mas ninguém queria ser o advogado de Prestes, que estava preso na rua da Relação, no Rio de Janeiro, debaixo de uma escada, não podendo ficar nem em pé, nem sentado. Estava em condições subumanas. Tudo o que o brilhante causídico pleiteava em favor do cliente, o então juiz do tribunal de exceção da época indeferia, até que Sobral Pinto teve a ideia de pedir para o preso Luiz Carlos Prestes o cumprimento de alguns artigos do Decreto 24.645/34, e, assim, se utilizando de uma lei que estabelece medidas de proteção aos animais, Prestes conseguiu ter condições mais dignas na prisão.

Acredito que muitos dos leitores irão se lembrar de um fato que chocou o país em 2013. Ativistas resgataram 178 beagles de um laboratório, que fazia testes com eles. Os técnicos asseguravam que os cães não sentiam dor.

Beagle ou bigle é uma raça de cães de caça de pequeno a médio porte originária do Reino Unido. De acordo com a Federação Cinológica Internacional, seu padrão é o número 161, a raça está inserida no grupo 6, pertencente a seção 1 (Wikipédia)

Proteção jurídica

A tendência a uma proteção jurídica diferenciada aos animais tende a aumentar, seja sob o prisma da relação entre pessoas e animais (por exemplo, em virtude da afetividade que pode haver entre pessoas e animais de companhia ou de estimação), seja se considerada a proteção do animal em si mesmo. De todo modo, requer uma nova definição de seu status jurídico — até o momento considerado como coisa por boa parte das leis.

A vedação na Constituição brasileira de 1988 da prática do ato cruel aos animais também impõe uma série de limites, que dizem respeito não apenas ao modo como são tratados, mas também ao motivo pelo qual os animais são usados. Assim, por exemplo, não se admite que, a pretexto de realizar uma manifestação cultural ou folclórica, sejam maltratados animais. Considerou-se contrária à norma constitucional a “farra do boi” e a “briga de galos”. Quanto ao uso de animais em rodeios ou espetáculos similares, decidiu-se que é vedado o uso de instrumentos que lhes causem maus tratos, já que, caso contrário, iria se admitir a “exploração econômica da dor” dos animais.

Em 2015, a França deu um passo à frente quando seu Código Civil passou a reconhecer os animais como “seres vivos dotados de sensibilidade”. Realmente, foi um grande passo, porque, até então, Alemanha, Suíça e Áustria os consideravam apenas como não sendo uma coisa.

O preâmbulo da Constituição da Suíça não tem uma afirmação específica em relação ao direito dos animais. Lê-se: “O valor de um povo se mede pelo bem-estar dos mais fracos”. Estaríamos em que posição? O que fazemos para haver bem-estar dos mais fracos? O que fazemos? Que tal fazermos?

É essa a nossa proposta: contribuirmos para o bem-estar dos animais.

Estamos juntos!!


AMIRAH SHARIF é jornalista, advogada, protetora dos animais e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. asharif@bol.com.br