Por José Carlos de Assis

A crise financeira atual, que certamente se converterá em crise monetária – escassez de crédito -, recolocou em evidência o maior neoliberal do século XX, Milton Friedman, sob uma roupassem curiosamente progressista. Ele sugeriu o “dinheiro por helicóptero”, ou seja, uma suposta política de recuperação da economia pela qual o governo, para estimular os negócios a partir dos bancos, fizesse chover dinheiro de graça sobre as pessoas, a fim de que essas pessoas comprassem títulos e inundassem os bancos de dinheiro. O passo seguinte seria os bancos emprestarem dinheiro para público e empresas, estimulando a economia.

Há muitos aspectos equivocados na fantasia de Friedman, mas, por economia de espaço, me deterei no essencial. Todo o pensamento dele está estruturado numa economia totalmente privada, especialmente bancos. Dessa forma, o dinheiro que cai do helicóptero não atinge imediatamente a economia real. Passa por uma instância intermediária, imediatamente locupletada de dinheiro público, em favor dos bancos e do sistema financeiro. O efeito de crescimento seria duvidoso. O dinheiro poderia simplesmente ser empoçado no sistema bancário , conforme previu Keynes em relação a uma economia estagnada.

Contudo, o raciocínio de Friedman, que não faz sentido mesmo numa economia privatista como a norte-americana, falha ainda mais numa economia mista, como a brasileira. Por enquanto, não temos ainda a estupidez de um banco central independente, como tem os Estados Unidos. Isso significa que, em lugar de jogar dinheiro de helicóptero nos bancos, poderíamos simplesmente jogar o dinheiro no setor estatal, estimulando por aí o multiplicador keynesiano da economia e criando ativos. O dinheiro do helicóptero, além de estimular o primeiro nível da demanda, serviria para construir hidrelétricas, pontes, rodovias e outros ativos.

O economista russo Aba Lerner tratou da relação entre moeda e finanças de uma forma extremamente inteligente e inquestionável. Dividindo a economia entre setor público e setor privado, ele mostra que uma injeção de recursos autônomos na economia (monetários), em época de recessão ou depressão (como hoje), provoca um efeito estimulante, sem inflação, até que se esgote a capacidade produtiva da economia. Disseram-me que o grupo de economistas que cerca Sanders, candidato democrata nos EUA, é simpático a Finanças Funcionais. Se ganhar, pode ser a libertação do país e do mundo da escravização financeira.


JOSÉ CARLOS DE ASSIS – Jornalista, economista, escritor, professor de Economia Política e doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ, autor de mais de 25 livros sobre Economia Política. Colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Foi professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), é pioneiro no jornalismo investigativo brasileiro no período da ditadura militar de 1964. Autor do livro “A Chave do Tesouro, anatomia dos escândalos financeiros no Brasil: 1974/1983”, onde se revela diversos casos de corrupção. Caso Halles, Caso BUC (Banco União Comercial), Caso Econômico, Caso Eletrobrás, Caso UEB/Rio-Sul, Caso Lume, Caso Ipiranga, Caso Aurea, Caso Lutfalla (família de Paulo Maluf, marido de Sylvia Lutfalla Maluf), Caso Abdalla, Caso Atalla, Caso Delfin (Ronald Levinsohn), Caso TAA. Cada caso é um capítulo do livro. Em 1983 o Prêmio Esso de Jornalismo contemplou as reportagens sobre o caso Delfin (BNH favorece a Delfin), do jornalista José Carlos de Assis, na categoria Reportagem, e sobre a Agropecuária Capemi (O Escândalo da Capemi), do jornalista Ayrton Baffa, na categoria Informação Econômica.