Por Miranda Sá –
“A bajulação é a moeda falsa que só circula por causa da vaidade humana”. (La Rochefoucauld)
A desprezível adulação da vaidade de quem ocupa o poder é uma tendência natural dos fracassados, dos malsucedidos, dos caçadores de privilégios, de todo o lixo político que forma a elite da escória social.
É isto que faz muita gente se especializar em chaleirismo para se julgar importante ao lado das personalidades que cultuam; os conhecidos “papagaios de pirata”…. Esses não aprenderam a lição de que é preferível incomodar os poderosos com a verdade do que agradar com bajulação.
Chaleirismo vem de “Chaleira”, verbete dicionarizado como substantivo feminino para designar o utensílio de cozinha para aquecer água; e é um adjetivo figurado originário do Brasil indicando quem bajula; o adulador, bajulador, incensador e puxa-saco.
Relativo às lisonjas feitas para obter atenção e vantagens, nasceu da política brasileira, sem surpresa nenhuma: a História registrou que o político gaúcho Pinheiro Machado, eleito senador pelo seu Estado, tornou-se, por suas habilidades políticas, o homem mais poderoso da Velha República e nesta condição vivia cercado de lisonjeadores.
A sede do Senado era no Rio de Janeiro e o Senador morava em Bangu, numa fazenda com a casa grande no alto do Morro da Graça. Como bom gaúcho tomava muito chimarrão e uma chusma de puxa-sacos subia a ladeira da Graça disputando o privilégio de segurar a chaleira com água quente para servir a cuia do Chefão quando mateava….
Certamente isto ocorria, e a cena não foi poupada pela crítica humorística, principalmente nas troças carnavalescas. Assim, no carnaval de 1906 os cariocas cantaram a polca “No Bico da Chaleira”, uma composição de Juca Storoni: – “Menina, eu quero só por brincadeira/ Pegar no bico da chaleira”…. A partir daí, nasceu o verbo chaleirar que caiu no goto do povo….
No ano seguinte surgiu a marchinha inspirada na polca de Staroni: – “Iaiá me deixe subir esta ladeira, / Que eu sou do grupo do pega na chaleira”; e um chargista da revista Careta publicou a caricatura do chimarrão de Pinheiro com a legenda: “Quem gosta de ser adulado é cúmplice do adulador”.
A sátira irônica dos intelectuais foi aplaudida pelo povão. É fácil ver-se e compreender a cumplicidade do adulado com o adulador…. Há, porém, em contrapartida, muitas personalidades históricas que rechaçaram o puxa-saquismo.
Dos meus arquivos tirei uma exemplar passagem com Catarina II – A Grande, imperatriz da Rússia, que reclamou que estava sofrendo dificuldade na leitura e foi aconselhada a usar óculos. Um dos cortezões apressou-se a encomendar as lentes e levou-as para a Czarina; esta, para experimentar os óculos, pediu que lhe dessem algo para ler. Outro puxa-saco escreveu um cartão com palavras lisonjeiras enaltecendo-a. Catarina passou a vista e devolveu o escrito e as lentes ao bajulador, dizendo: – “Estes óculos não servem; aumentam demasiadamente…”.
No livro “A Verdade de um Revolucionário” o general Olímpio Mourão Filho, que comandou de frente o movimento militar de 1964, escreveu que – “Ponha-se na presidência qualquer medíocre, louco ou semianalfabeto, e vinte e quatro horas depois a horda de aduladores estará à sua volta”.
O general Mourão foi do tempo em que os oficiais superiores das FFAA estudavam e eram promovidos e condecorados por mérito. Deve ter aprendido a lição do Marquês de Maricá ao dizer que “os aduladores são como as plantas parasitas que abraçam o tronco e os ramos de uma árvore para melhor a aproveitar e consumir”.
Como observador da política nacional, parece-me que na geração do capitão Bolsonaro e do general Pazuello os militares aceitam de bom grado o aplauso enganoso.
Como governo, financiaram internautas nas redes sociais para defender sua política negacionista, com depoimentos elogiosos a remédios ineficazes e ao fraudulento “tratamento precoce”. E nas “motociatas” de campanha eleitoral feita com o dinheiro público são sorteadas motocicletas entre os participantes, atraindo muita gente…
Dessa maneira vamos vivendo sob o poder dos que não aprenderam com Napoleão Bonaparte, que “quem sabe adular também é capaz de caluniar”….
MIRANDA SÁ – Jornalista profissional, blogueiro, colunista e membro do Conselho Editorial do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como a Editora Abril, as Organizações Globo e o Jornal Correio da Manhã; Recebeu dezenas de prêmios em função da sua atividade na imprensa, como o Esso e o Profissionais do Ano, da Rede Globo.
MAZOLA
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