Por Miranda Sá

“A caricatura é mais forte que as restrições e que as proibições” (Eça de Queiroz)

Inspirei-me para o título deste artigo na observação de Aldous Huxley dizendo que as caricaturas são as formas mais agudas da crítica. A História nos mostra que no Brasil a caricatura tem sido a mais exuberante e influenciadora maneira de atacar a politicalha e os políticos despreparados, negligentes e venais.

Folheei a espetacular História da Caricatura Brasileira, de Luciano Magno, um registro da inteligência brasileira neste campo da literatura, mostrando o trabalho dos grandes caricaturistas e as dezenas de publicações, jornais e revistas, que encantavam o imperador Pedro II e mais tarde a Getúlio Vargas e Juscelino Kubitscheck.

Nos governos militares, de 1964 a 1985, o último general que ocupou a Presidência da República, João Batista Figueiredo, comentava que o humor das caricaturas ajudou muito a abertura democrática iniciada no Governo Geisel e realizada por ele.

O verbete Caricatura, dicionarizado, é um substantivo feminino que significa a mostra ridícula de pessoas, coisas e acontecimentos científicos, culturais e sócio-políticos, provocando comicidade. Vem do francês “caricature” e do italiano “caricatura”, ambos de etimologia latina, “caricare”, carregar.

No casamento do desenho – com distorção engraçada, mas traços característicos do modelo -, e o texto – sucinto, claro e provocante -, muitas personalidades sociais foram ridicularizadas, projetos legislativos desmoralizados, poderosos caíram e governos mudaram o rumo da política….

Nessas núpcias humorísticas, entram festivamente as alcunhas, apelidos e codinomes, qualificativos especiais que revelam ou deixam dúvidas sobre a identificação dos referenciados…. Provocando risos ou enraivecendo, as caricaturas deverão ser acatadas como fez o genial Voltaire.

O Filósofo se encontrava num círculo de intelectuais que conversavam sobre superstições e citou Habacuque, atribuindo-lhe juízos radicais. Habacuque, é o oitavo dos doze profetas menores, aceito pelos rabinos ortodoxos como autor do Livro de Habacuque, pouco lido, mais com revelações semelhantes às de Jeremias sobre conversas entre eles e Deus.

Pois bem. Como não era a primeira vez que Voltaire citava Habacuque usando-o para avalizar ideias próprias, um dos presentes, estudioso da Bíblia, levantou dúvidas afirmando que o Profeta nunca dissera aquilo. Voltaire não se importunou: – “Pouco m’importa, considero-o capaz de ter dito isto e muito mais…”.

Assim, não devemos deixar esquecidas nas gavetas dos ofendidos as caricaturas que mostram que são capazes de manifestação censurável, sejam eles de que partido forem e quais as ideias que defendem. Se forem radicais no seu comportamento, muito melhor para serem divulgadas.

Os apelidos e alcunhas não podem ser escondidos, Getúlio era chamado pelo povão de “Gegê”, Juscelino, conhecido entre amigos como “JK”, o general Figueiredo, na Escola Militar de Realengo era apelidado de “Fig”, e o general Aurélio Lira Tavares, intelectual, usava nas suas crônicas o cognome de “Adelita”.

Uma capa da revista IstoÉ, comparando Bolsonaro a Coringa, vilão das histórias de Batman, alcunhou-lhe de “Bolsoringa”; mas, para desmerecer a comparação, os bolsonaristas inteligentes (os há, poucos, mas existem) passaram a chama-lo assim. Outros, entre eles, mostram intimidade chamando-o de “Bozo”.

Na oposição, aparecem “Capitão Minto”, com referência às contumazes mentiras, e “Capitão Cloroquina”. por causa da insistência tresloucada em diagnosticar um remédio para malária como sendo capaz de combater a covid-19….

Dá-se agora um apelido para o deputado preso pelo STF e a Câmara Federal por pregar a insurreição contra o Estado de Direito, defendendo o ditatorial AI-5, mostrando com esta explosão o desagregador contumaz, intolerável pela Corregedoria da PM/RJ, isolado na Câmara, e desprezado até pelo seu partido. Chamam-no de Daniel “O Quê”.

Surgiu por coincidência por causa da dúvida que o ministro Luiz Fux teve a respeito do seu sobrenome e representa o medíocre que ele é; esse “O Quê” é uma caricatura de parlamentar: ignorante e truculento que não merece respeito.


MIRANDA SÁ – Jornalista profissional, blogueiro, colunista e membro do Conselho Editorial do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como a Editora Abril, as Organizações Globo e o Jornal Correio da Manhã; Recebeu dezenas de prêmios em função da sua atividade na imprensa, como o Esso e o Profissionais do Ano, da Rede Globo.