Por Geraldo Pereira

Em abril de 1989, o Brasil vivia uma situação muito parecida com a de hoje. A Dívida Externa consumindo a nossa Poupança, o arrocho salarial levando a fome e a miséria para a casa do trabalhador. O desemprego era igual ou pior do que o de hoje. O governo sem dinheiro, para pagar os seus compromissos internos. Dirigia o Brasil, o maranhense José Sarney. A situação era tão ruim, que Sarney declarou a Moratória. Teve essa coragem!

Para a revista Caxias Magazine, do meu saudoso amigo Carlos de Sá Bezerra, eu escrevia mensalmente, entrevistando uma personalidade de peso na vida do País. Uma dessas matérias foi muito comentada, não só na cidade de Duque de Caxias, como também, no Rio de Janeiro. O diretor da revista dada a importância do entrevistado, deu-nos a capa da mesma. O que me deixou muito feliz.

Sobre o entrevistado escrevi:

“Ele é um dos raros homens públicos do nosso País, que é unanimidade nacional em termos do reconhecimento da sua cultura, da sua dedicação às melhores causas de nossa Pátria e também da coragem sempre demonstrada, em defesa das liberdades. Voz que não se calou diante do arbítrio. Aos 92 anos de idade, mestre Barbosa Lima Sobrinho, sempre atualizado e preocupado com os graves problemas que afligem a Pátria brasileira. É o nosso entrevistado do mês”.

“Nesta hora difícil que o Brasil atravessa, é uma honra ouvir um brasileiro, da envergadura moral de Barbosa Lima Sobrinho, que assim como Sobral Pinto, com 95 anos, e Luís Carlos Prestes, com 91, é dono de uma memória privilegiada. Decano dos jornalistas brasileiros, presidente da ABI, ele escreveu o seu primeiro artigo em 1915, para o Diário de Pernambuco, o mais antigo órgão de imprensa da América Latina. Decano também o é do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil e da Academia Brasileira de Letras.”

“Autor de mais de 40 livros publicados, sobre Literatura; Direito; Economia; e História. Seu último livro, é sucesso de livraria em todo o território Nacional: “Japão – O capital se faz em casa”. Essa obra é indispensável, para se saber porque o Japão saindo da Segunda Grande Guerra Mundial, esmagado, bombardeado impiedosamente por duas bombas atômicas lançadas pelos americanos, no seu território na cidade de Nagasaki e Hiroshima humilhado e ocupado militarmente, é , hoje, essa invejável potência.”

Geraldo: – “Há dias tomei conhecimento de um dado assustador. Um Salário Mínimo, em março de 1964, dava para comprar 100 quilos de carne, hoje só dá para 25.

Barbosa Lima: “Exatamente. O Salário Mínimo aqui, está abaixo do salário de qualquer País da América do Sul, aqui o desnível é total. E essa diferenciação de renda, foi profundamente agravada, no período de 20 anos de governo militar e até agora não se corrigiu.

Geraldo: “Estamos numa democracia, saímos de um regime de arbítrio. Com Castelo Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel, Figueiredo, o trabalhador ganhava mais, agora os salários achataram para valer. Não é um preço muito caro, o que o trabalhador está pagando para desfrutar da democracia.”

Barbosa Lima: “Grande parte disso, é consequência, também, da Dívida Externa. Por isso é que eu digo, que a Dívida Externa não pode ser paga. Até onde teremos que levar arrocho aos trabalhadores, para pagar uma dívida externa, que está acima dos nossos recursos. Eu tenho dito na imprensa e vou repetir agora: ‘Nós somos um País, que exporta poupança, porque de 1982 até 1986, pagamos o total de 73 bilhões de dólares e a dívida só fez crescer. A dívida não foi reduzida, a dívida só fez aumentar nesse período. Agora, se nós aplicássemos esses 73 bilhões de dólares em investimentos no País, o que teríamos? Nós estamos exportando poupança. E não faltam pessoas que tem ligações maiores com empresas estrangeiras, a dizer que nós somos um País sem capital e de poupança. Como somos uma País sem poupança? É que nós estamos exportando a nossa poupança, através do pagamento da dívida externa. Dessa dívida externa que chegou a 121 bilhões de dólares. Se perguntarmos o que dessa dívida externa se aplicou em investimento no país, talvez não tenhamos 30 bilhões. Nós estamos pagando a dívida externa de 121 bilhões de dólares, quando desses 121 bilhões de dólares, só talvez a quarta parte tenha sido aproveitada no desenvolvimento do País. Isso é o que me dói como brasileiro.

Geraldo: “Mestre Barbosa Lima, o Brasil tem condições de pagar essa dívida?”

Barbosa Lima: “Nem nós podemos pagar, nem a Argentina, nem o México, de modo que esse é um problema político, que teria de ser resolvido, através da união dos países devedores. Eles deveriam fazer um pool dos países devedores, para se oporem exatamente ao pool dos banqueiros, porque os banqueiros estão todos reunidos, em torno da causa, que eles defendem, enquanto que os devedores estão separados, divididos, cada um procurando resolver por si só os seus pleitos, sem maiores condições para isso. Eles têm que se unirem para resistir, porque não têm condição para pagar. A moratória virá mais cedo ou mais tarde, o Brasil não terá condições de pagar essa dívida.

Geraldo Pereira: “Falemos um pouco sobre o seu livro: ‘Japão – O Capital se faz em casa.’”

Barbosa Lima: “Meu livro, não se reduz apenas aos aspectos econômicos. Eu considero o Japão na primeira fase, na fase de sua formação. O Japão derrotado na Segunda Guerra e o Japão depois da guerra. O auxilio americano foi insignificante. Também uma espécie de plano Marshall, para lá, porque o Japão devastado, com suas fábricas destruídas, não tinha condições de ressurgir, e os americanos tinham receio, de que essa situação de miséria do povo, inclusive, levasse o governo japonês a se aliar à União Soviética e instalar lá, um regime soviético, e para evitar isto, ele procurou auxiliar os japoneses e dar os primeiros passos e pô-lo, na situação de antes da guerra. O Japão tinha um sentimento nacionalista tão poderoso, que no começo da Segunda Grande Guerra, existiam raríssimas casas comerciais estrangeiras em seu território. A técnica do Japão, foi fazer com que todo dinheiro ganho no Japão, deveria ser dos japoneses e não dos estrangeiros. e através dessa orientação defendendo ardentemente todas as oportunidades de lucros do povo japonês, ele conseguiu pouco a pouco e reerguer e chegar a situação mundial que tem hoje, é uma potência que desafia os Estados Unidos, e os Estados Unidos, estão em crise exatamente porque muitas empresas americanas estão se vendendo para os japoneses.

Há um livro de um escritor americano, publicado recentemente, onde ele diz que os Estado Unidos, viveram sempre acima do povos, criando uma situação hoje insustentável, de modo que a situação dos Estados Unidos, é uma situação difícil, como os próprios déficits comerciais em sua balança estão registrando: 50 bilhões de dólares o déficit comercial com o Japão, déficit comercial com outros países… isto é uma situação de crise, que eles apenas não se aperceberam dela, porque tem ainda o direito de emitir dólares.

A dívida externa do Brasil que era de 121 bilhões de dólares em 1989, cuja divida já pagamos diversas vezes, hoje supera a casa de 400 bilhões de dólares. Não vejo nenhuma autoridade brasileira, quer civil ou militar, levantar a sua voz contra essa espoliação sem limites.

Por que o Poder Executivo, Judiciário ou Legislativo não procuram ouvir a grande brasileira Dra. Maria Lúcia Fattorelli autoridade máxima, que o país possui sobre o assunto Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida?

Por que a Escola Superior de Guerra não a convoca para uma palestra debate, convocando também, o ministro Paulo Guedes e todo o generalato da Ativa do nosso País, para participar do mesmo e ficar a par, através de um retrato vivo, sem retoque da verdadeira situação, em que se encontra a nossa Pátria.

Quem sabe que, de posse desses conhecimentos, as nossas Forças Armadas, cumprindo com os seus deveres, dê um grito de basta a essa espoliação que há tantos e tantos anos tem submetido o nosso País, e tanto mal tem feito ao nosso povo.

Deus nos dê a coragem para enfrentar essa luta!

Voltarei oportunamente ao assunto, com dados e números irrespondíveis.


GERALDO PEREIRA é jornalista especializado em história política e sindical do Brasil, atuando por mais de 60 anos nos principais veículos de comunicação do país, ex-presidente do Conselho Fiscal da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e Colunista do jornal  Tribunada Imprensa Livre.