Por Pedro do Coutto –
Aos 88 anos de idade e há praticamente 70 anos acompanhando as eleições, votei na manhã deste domingo (2), em meio à grande expectativa. As pesquisas, tanto a do Datafolha quanto a do Ipec, apresentavam, como os jornais deste domingo destacaram, uma vantagem muito grande para Lula, com uma diferença de 14% sobre Bolsonaro, o que poderia se traduzir em aproximadamente 15 milhões de votos. Mas esta enorme diferença não se concretizou a haverá segundo turno.
CÁLCULOS – Cientistas políticos, entre outros analistas, desenvolvem cálculos baseados em transferências de votos e de confronto entre os resultados de 2018 e os de agora, 2022, sem considerar que as eleições e as disputas são diferentes e que as contradições que existem, em muitos casos, são passageiras. Veja-se, por exemplo, o que aconteceu com o Centrão.
Na hora do voto na urna, o Centrão não veio fechado com Bolsonaro. E se Bolsonaro não tivesse ido ao segundo turno, ainda neste domingo o bloco do governo teria iniciado sua mudança para o novo Palácio do Planalto aguardando o sucessor do atual presidente da República. É da política, é natural.
Quanto às razões dos votos, são múltiplas. E como na poesia de Vinicius de Moraes, em Orfeu do Carnaval, “são mais profundas do que parecem”. Claro que a atuação política dos governantes influencia consideravelmente. Mas não é apenas isso. Há uma dose acentuada de identificação e de empatia entre as eleitoras e eleitores e os candidatos e candidatas.
CONTROLE DA MÁQUINA – Esse aspecto misterioso e enigmático é decisivo para muitas vitórias. E podem explicar, muitas situações. Bolsonaro, por exemplo, beneficiou-se pelo fato de possuir o controle administrativo do país e, como tal, dispor da máquina que há muitos anos, antes da Revolução de 1930, era fundamental para a eleição desse ou daquele presidente da República.
O fenômeno modernizador encontrou a sua maior fonte de expressão nas urnas eletrônicas e no sistema eleitoral de votação e computação. Mas há exemplos anteriores de que a máquina produtora de vitórias não resistiu à passagem do passado para os tempos modernos.
Em 1950, o presidente Eurico Dutra detinha o poder. Escolheu como candidato Cristiano Machado do PSD, cujas bancadas eram amplamente majoritárias no Congresso. Mas o vencedor foi Getúlio Vargas, do PTB, com 49% da votação. Ficou na história o termo “cristianização” para explicar como o fato aconteceu e os autores do tema não lembraram que paralelamente a Vargas, Juscelino Kubitschek elegeu-se governador de Minas Gerais, e Amaral Peixoto governador do antigo Estado do Rio de Janeiro.
REFORMA – Mas não é só isso. Vargas representava, além do mito, o reformista que implantou a consolidação das leis do Trabalho em 1943. Vargas tinha compromisso com a reforma, pois se não o tivesse não daria ao seu filho o nome de Lutero, sobretudo porque Vargas não era religioso. Nas eleições de 1960, a coligação PSD/PTB apoiando o general Lott era enorme em matéria de bases regionais. Entretanto, Jânio Quadros venceu disparado com 47% da votação.
A instituição do segundo turno, e da maioria absoluta no primeiro, foi estabelecida pela Constituição de 1988 e seu primeiro teste na prática foi na vitória de Fernando Collor sobre Lula que este ano completou a sua nona atuação diretamente em eleições presidenciais. Perdeu quatro e venceu quatro.
Se vencer o segundo turno, Lula levará o saldo consigo para a história universal, já que não há outro exemplo no mundo de tantas atuações presidenciais.
Entre os candidatos e os eleitores e eleitoras, existe uma faixa que os aproxima e outra faixa que os distancia. Às vezes existem razões óbvias para o afastamento, tais são os erros e atitudes de governantes que desconcertam o pensamento e a atmosfera que envolve a atividade nacional. Não é fácil fixar referências. Elas são tanto sociais quanto psicológicas no caso da aproximação e no caso do distanciamento.
CÓDIGOS – É o mesmo modelo oculto da empatia ou antipatia de pessoas umas com as outras. Isso de modo geral. No plano do sexo, o fenômeno se verifica na atração do homem pela mulher e da mulher pelo homem. Não tem razões transparentes. São códigos que se refletem em algo muito forte ou de rejeição acentuada. Há também os casos de temor que muitos políticos despertam e de acolhimento que outros proporcionam.
Tudo isso gera um ambiente soprado pela emoção. Essa emoção está na atmosfera das chegadas, da reta final, na energia que faz a diferença entre uns candidatos e outros. Muitas outras eleições virão através do tempo e sempre haverá a mesma sensação entre os que buscam o voto e aqueles que com os votos proporcionam vitórias.
Na eleição de ontem, a grande vitoriosa foi a democracia brasileira.
Pedro do Coutto é jornalista.
Enviado por André Cardoso – Rio de Janeiro (RJ). Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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