Por Lincoln Penna –

Aos insanos e desvalidos porque um dia eles vão brilhar.

O que está exposto acima foi incluído como uma mensagem aos excluídos de uma sociedade que tem se esmerado em produzir essas e tantas outras formas de violência contra o ser humano. Ela se encontra presente num dos meus livros, cujo título Política & História. Lugares e Fazeres, editado no ano de 2000 pela editora da então Universidade Severino Sombra, hoje Universidade de Vassouras foi o resultado de alguns cursos por lá desenvolvidos.

Recorro a essa lembrança e a reitero aqui, juntamente com o desejo de que esses nossos semelhantes possam desfrutar dias bem melhores. Estamos atravessando um momento que requer nossa atenção e disposição para reverter esse quadro que tem se agravado. Mas, para que isso aconteça é necessário mais do que produzir catarses tão comuns nas redes sociais na troca de mensagens repletas de indignação compartilhadas, a exemplo do que faço também através desses textos, que só servem para expelir as nossas insatisfações sem que as nossas esperanças sejam canalizadas com vistas ao enfrentamento da atual situação em que vivemos.

O mundo entrou definitivamente numa encruzilhada. Ou garantimos a preservação da humanidade com todas as suas contradições e imperfeições, ou sucumbimos sob o manto do ódio, subproduto anunciado da barbárie. Esta sentença categórica faz sentido porque ela se prende ao que se passa presentemente nas sociedades que conformam a nossa civilização contemporânea, situação por sinal que vem acontecendo também e reiteradamente nas diversas comunidades que abrigam pequenas contravenções até crimes praticados por organizações que vêm ocupando territórios nas diversas periferias metropolitanas, no Brasil e em várias outras cidades de grande porte. E, em alguns casos, com a omissão e mesmo a convivência de autoridades dos poderes públicos.

O panorama das relações internacionais não consegue disfarçar a espiral de violência que se expressa de várias maneiras, seja através de uma intensificação de conflitos bélicos ou por meio de ações extralegais praticadas por organizações criminosas que replicam essa lógica do confronto para alcançarem os seus objetivos à revelia dos poderes institucionais e dos interesses do povo. Este fica à mercê de governantes que se encontram ora dependentes de poderes que limitam o cumprimento de seus programas políticos avalizados eleitoralmente, mas impedidos por interesses inconfessáveis, ora a enfrentar as imposições do mercado que instrumentaliza a captação de recursos financeiros e joga favoravelmente a restrições de maneira a impossibilitar as ações propositivas dos governos, principalmente aquelas que atendem às pautas sociais e em alguns casos estratégicas no campo da ciência e tecnologia.

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Indícios dessa realidade de contornos adversos é o crescimento dos comportamentos de intolerância, tanto no que se passa no âmbito internacional por força de projetos hegemônicos de poder, como – o que é tão preocupante quanto – na dissimulação junto a segmentos sociais. Todos imbuídos da crença de soluções extremadas. Sem falar de pautas retrógradas em franca contradição com os tempos de uma revolução científica e tecnológica em plena expansão.

Quando evoco a necessidade de se discutir uma saída radical para esse cenário, ou seja, mudanças que ataquem a raiz de nossos eternos desafios é porque não vejo mais como equacionarmos os grandes e pequenos problemas apenas contendo os seus excessos multiplicadores. Sustentar a democracia como anteparo ao que vem se alastrando só tem sentido se as práticas democráticas forem efetivamente exercitadas, de modo a transformar essas realidades. Para que isso ocorra é indispensável a mobilização do povo para que a democracia se torne efetiva e não venha a ser uma forma de mascarar o poder dos que respondem por esse quadro no qual ela, democracia, se encontra aprisionada e incapacitada de se tornar uma realidade.

Logo, o que está em jogo neste primeiro quarto de século XXI é a batalha pelo resgate dos valores essenciais da democracia, absolutamente impraticáveis num regime capitalista. E isso coloca ou recola a questão da encruzilhada aludida no início, qual seja a de permanecermos submetidos aos ditames do grande capital, ou lutarmos pela sua rejeição de modo a construir uma nova sociedade fundada na socialização dos meios de produção, ou se quiser, na repartição dos bens produzidos pelo trabalho.

E essa nova sociedade precisa ser internacionalmente constituída. Seria um novo socialismo sem os erros cometidos no passado, dentre eles o de julgar possível a coexistência com o capitalismo. Trata-se de uma questão difícil e delicada tendo em vista os grandes embates e acirramentos ocorridos durante a própria construção da primeira sociedade socialista na Rússia tão logo se deu a Revolução de Outubro de 1917. Contudo, a atual conjuntura e o que se aprendeu desde então pode ajudar a encontrar caminhos que nos conduzam a tempos menos tortuosos.

Por outro lado, mas ainda assim dentro dessas conjecturas preliminares, tornou-se mais do que nunca necessária e oportuna o hasteamento da bandeira da paz. Desde cedo, os socialistas e comunistas entenderam que a paz é um antídoto às políticas imperialistas a cultivarem as guerras e intervenções indiscriminadamente. Portanto, sustentar a paz não diz respeito tão somente a situações momentâneas como a que acontece em Gaza e em outros territórios africanos, por sinal pouco divulgados pelas mídias sob o controle das poderosas agências de comunicação.

Mas a interação com os demais movimentos sociais e políticos de libertação é algo estratégico para que possamos alcançar de fato uma finalidade comum, isto é, instituir uma outra lógica nas relações internacionais. No que se refere ao Brasil, dada a sua posição de relevo no continente latino-americano, a construção de uma unidade de fato já está passando do tempo de colocá-la em prática. Tal providência é uma questão de soberania continental, e caberia a sua inclusão como prioridade para os seus povos. Lideranças existem, porém há que se ter vontade política para a sua execução.

Definitivamente e por fim, cabe uma tarefa igualmente inadiável. Ela consiste em desbancar os senhores da guerra. É um imperativo inadiável, pois, tornou-se insuportável a permanência dessa realidade a exigir mais do que denúncias, embora elas continuem a ser necessárias, mas é pouco diante do que precisa ser feito para desbancar a ganância dos que não cessam de acumular riquezas sugadas e naturalizadas de forma abjeta em detrimento dos quem as criam efetivamente, o povo trabalhador.

Em nome das populações mais vulneráveis do mundo inteiro submetidas aos caprichos da exploração contumaz dos poderosos grupos enricados pela constante espoliação dos povos torna-se urgente que travemos os rumos da barbárie que já se faz presente sem que nos apercebamos. É preciso um não rotundo – lembrando Brizola -, mas que resulte numa efetiva transformação revolucionária antes que sucumbamos inertes mais uma vez.

LINCOLN DE ABREU PENNA – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP); Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (MODECON);  Vice-presidente do IBEP (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos); Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.

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