Por Carlos Mariano –
Os ataques abjetos e covardes recebidos pelo jogador de futebol, cria do Ninho do Urubu, o nosso Vini Júnior, hoje o maior craque em evidência no futebol mundial, me fez lembrar da luta abolicionista antirracista da primeira agremiação institucional carnavalesca do carnaval carioca: os Tenentes do Diabo.
Os Tenentes foi um clube carnavalesco fundado em 31 de dezembro de 1855 no carnaval carioca. A princípio foi forjado no berço da classe média comerciante carioca. Aos poucos, o clube foi se aproximando do Movimento Abolicionista e abraçou a luta do antirracismo. Assim, ganhou popularidade entre as classes mais baixas da sociedade.
Antes de assumir a alcunha de Tenentes do Diabo, os foliões rubro-negros se chamavam Zuavos Carnavalescos, em homenagem aos argelinos que lutavam contra a colonização francesa na região do Magrebe. A mudança de nome ocorreu em 1861 quando os foliões do até então Zuavos, num gesto de heroísmo, enfrentaram o fogo que destruía uma farmácia situada na hoje rua Primeiro de Março. A coragem demostrada pelos componentes lhes valeria o apelido de Tenentes do Diabo, denominação que adotaria oficialmente somente a partir de 1904.
Durante a festa de Momo, precisamente na chamada terça feira gorda, último dia oficial do carnaval, os Tenentes deixavam de ser clubes para se transformar nas grandes Sociedades carnavalescas que desfilavam com seus pujantes e luxuosos préstitos (as alegorias carnavalescas da sociedade). Além da plástica, outra coisa que chamava a atenção nos desfiles dos Tenentes era a ironia e crítica dos seus enredos e também a participação nos debates públicos sobre a sociedade brasileira.
No carnaval de 1864, os Tenentes agiram de forma contundente na campanha abolicionista, primeiro cedendo as dependências de sua sede para as reuniões dos líderes do movimento. E depois, destinando a verba pública do seu carnaval para comprar as cartas de alforria de alguns escravos. Neste carnaval, na terça-feira gorda de Momo, os rubro-negros não desfilaram seus maravilhosos préstitos na Avenida Rio Branco.
A participação da cultura popular nas mobilizações sociais de grandes temas mostra o quanto o carnaval historicamente esteve sempre interagindo no contexto político do país. Embora saibamos que a abolição da escravatura foi limitada e abandonou o povo preto à própria sorte, a canetada da princesa Isabel em 13 de maio de 1888, teve relevância na direção de emancipação e, por isso, é importante reconhecer esse ato como uma conquista.
A experiência histórica da participação efetiva dos carnavalescos do clube Tenentes do Diabo apoiando a luta pelo fim da escravidão nos mostra o quanto é importante olharmos para os personagens da nossa cultura popular. Esse olhar nos ajuda a entender como se dá a dinâmica e lógica das sociedades modernas.
Sem envolvimento e luta, não há libertação.
CARLOS MARIANO – Professor de História da Rede Pública Estadual, formado pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), pesquisador de Carnaval, comentarista do Blog Na Cadência da Bateria e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.
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