Por Siro Darlan

O Instituto Nacional de Pesquisa e Promoção dos Direitos Humanos promove um curso sobre a prática de pesquisa em Direitos Humanos e a aula ministrada pelo ilustre professor Doutor José Carlos Libâneo inspirou-me a escrever essas reflexões tão necessária em tempos de trevas e ameaças ás instituições de conhecimento e pesquisas, quando a prática do ensino ainda luta para a difícil desconstrução da pedagogia compromissada apenas com a escolaridade e não com a educação.

É importante compreender essa lógica hegemônica dos valores neoliberais. A educação é um campo de disputa. Disputa para que as pessoas tenham acesso a riqueza produzida pela humanidade – o conhecimento, vivências e experiências que dê sentido à vida! A prática docente criticada e exercida no âmbito da prática dos Direitos Humanos! Precisamos rever nossas condutas docentes, realmente, afirmou o Professor Libâneo.

A Educação deve atuar sobre a formação e o desenvolvimento do ser humano, em condições materiais e sociais concretas, com ensinou Paulo Freire. Educação como pratica educativa deve conter em sua pedagogia uma pratica social, materializada numa atuação efetiva na formação e desenvolvimento dos seres humanos, em condições socioculturais e institucionais concretas, implicando um processo de ensino-aprendizagem com procedimentos peculiares e resultados. Visando mudanças qualitativas no desenvolvimento da personalidade dos alunos.

Conceber a disputa da Educação centrada em seus processos educativos-formativos, como pontos de partida e chegada, e neles identificar-se as hegemonias políticas e sociais subjacentes não é uma proposta suficiente para afirmar um compromisso maior com a Educação. É preciso indagar: Pra que servem as escolas? Como as escolas podem proativas em praticar critérios de justiça? Como a justiça social é inserido no debate educacional?

Justiça social é dar aos alunos o conteúdo para que haja desenvolvimento igualitário na sociedade, instrução e sociabilização.

Penso que precisamos ampliar as discussões de trabalho de educação popular – “de base” – como um posicionamento na defesa dos direitos humanos. Pelo meu pequeno e modestíssima aproximação com a educação formal tenho testemunhado a existência de currículos que não dão espaço para essa perspectiva, para esse nível de debate. Falar de direitos humanos, justiça social dentro de algumas escolas, é uma ofensa, é coisa de comunista. Propor uma educação sexual preventiva e construtiva é tida como pedofilia perversão dos alunos e alunas. Infelizmente isso passa pelas narrativas mais comuns e preconceituosas.

Foi indagado ao ilustre professor se ele achava conveniente a prática curricular de uma educação para o equilíbrio e busca da paz social através da mediação escolar, considerando a sociedade de conflito em que vivemos, e incompetência do judiciário para plantar a PAZ social através da imposição de sentenças e penas, como via o professor a validade dessa promoção e pratica de resolução de conflitos por esse segmento da sociedade em construção. Infelizmente, apesar da prioridade absoluta que goza por lei, o iluminado professor tangenciou e não respondeu a essa pergunta. Interpretei que por receio de agravar os “deuses” do judiciário.

A desigualdade social gerada também pelos formadores e administradores educacionais está ainda mais visível nesse momento de ensino híbrido sem as menores condições para tal. Enquanto alunos ricos das escolas particulares dispõem de equipamentos para aulas virtuais, os pobres sequer tem acesso a computadores. A luta pela sobrevivência – a violação de direitos humanos cotidiano – impede por vezes que as pessoas, as famílias e os cidadãos vejam valor na educação formal, no conhecimento e na riqueza imaterial… E por outro lado a escola é uma instituição conservadora, com modelos rígidos (sinal, uniforme, disciplina, avaliações, punições etc.).

O que é justiça, em um mundo tão injusto? Só discutimos as questões estruturais por que não há espaço para todos. Quem determina a justiça? Todos somos iguais, todos somos diferentes. Fico pensando na questão de dar à criança o que ela mais “precisa” no seu interior.

Oportunidade a cultura, ou a leitura, ou as ciências exatas, cada qual no seu campo de intelectualidade. E como o acesso ao direito humano de escola pode estar subjetivado à necessidade de cada pessoa. O que precisa uma criança cuja escola é bombardeada com tiros rotineiramente, assim como seus barracos e entes queridos. O que são direitos humanos para essas crianças? Do que a criança precisa para que seja construída uma escola socialmente justa?

Em seu livro Democratização da Escola Pública – A Revisão Crítico-Social dos Conteúdos, José Carlos Libâneo defende um modelo de escola mais concentrada nas classes sociais menos favorecidas, onde seus métodos de ensino fossem principalmente pautados no estímulo do desenvolvimento da consciência crítica de cada indivíduo a fim de despertá-lo para a sua condição de oprimido e proporcionar a ele subsídios para que venha a se tornar um agente transformador da sociedade.

Essa educação deveria servir como um instrumento de luta para a compreensão e transformação dos conceitos sociais. Valoriza o uso de um conhecimento que possibilitasse a liberdade intelectual e política para as que as pessoas dessem real significado à informação, julgando-a criticamente e tomando decisões mais livres e acertadas. Para isto propõe quatro pilares básicos para a escola de hoje, que juntos formam uma unidade, dependes um da realização dos outros.

1. O primeiro deles é o de preparar os alunos para o processo produtivo e para a vida na sociedade atual, investindo na formação geral, isto é, no domínio de instrumentos básicos conhecimentos, conceitos, habilidades, valores, atitudes que propiciem uma visão de conjunto das coisas, capacidade de tomar decisões, de fazer análises globalizantes de interpretar informações, de trabalhar em equipes interdisciplinares etc.

2. Em segundo lugar, auxiliar os alunos nas competências do pensar autônomo, crítico e criativo, para que estes possam desenvolver a capacidade de aprender, de desenvolver os próprios meios de pensamento, de buscar informações.

3. O terceiro é a formação para a cidadania crítica e participativa, onde escolas criem espaços de participação dos alunos dentro e fora da sala de aula de forma organizada onde estes possam praticar democracia, iniciativa, liderança e responsabilidade.

4. O quarto objetivo é a formação ética. É urgente que os diretores, coordenadores e professores entendam que a educação moral é uma necessidade premente da escola atual e que eles precisam constantemente investir na capacitação efetiva para empregos reais e na formação do sujeito político socialmente responsável.

“Desigualdades sociais produzem desigualdades educativas. Desigualdades educativas produzem desigualdades sociais” J. C. Libâneo.

Somos tomados pelos discursos rasos, repleto de modismos para disfarçar o controle e domínio de poder. O Direito de Aprender em uma Escola Socialmente Justa! Esse lógica nos faz pensar no esvaziamento intencional que há no que é público, na escola pública. E é interessante porque quem tem dinheiro, quem compra no mercado, envia as crianças e adolescentes para escolas particulares, e quando chega no nível superior procura Universidade pública. Defender uma Política de Educação que valorize a educação básica, os professores e a aprendizagem é necessário. A escola deve ser um lugar que reproduza riqueza!

Como dizia Paulo Freire: a educação não pode tudo, mas é por não poder tudo que ela pode fazer alguma coisa. E aí está a verdadeira eficiência da escola.


SIRO DARLAN – Juiz de Segundo Grau do Tribuna de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Diretor de Jornalismo e Editor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Membro da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.