Por José Macedo

Nesse dia, no Palácio do Planalto, em frente de seus seguidores, certamente, emitiu a frase, como desafio e provocação a seus opositores.

Desde sua Campanha, o Capitão revela seu irrestrito casamento com o conservadorismo religioso e o autoritarismo, sempre, agradando “evangélicos, pentecostais e a “elite atrasada “, que o apoiaram, um casamento de traços neofascistas que, ao longo da história, não deram certo, mas descambaram para retrocessos civilizatórios e ferrenhas ditaduras. Como reza a Constituição, temos de respeitar as diversas crenças religiosas ou credos, mas somos um país laico e sustentado no Estado Democrático de Direito. Assim, religião e política não se confundem. Porém, esse impulso do ora presidente revela sua vocação autoritária e uma forma pensada para desmerecer a Lei, imaginando enfraquecê-la e uma uma tosca estratégia para assustar os demais poderes da República.

Para mim, quando ouvi o presidente pronunciar essa frase, não me causou surpresa, porque o acompanho, desde seus pronunciamentos e estilo autoritário no Parlamento. Estamos acostumados a ouvir dele expressões semelhantes: “Quem manda sou eu, sou o presidente”, “vá pra porra, foda-se” entre outras porcarias. Há dias, ouvi de um amigo, Catedrático da UFBA: “aprecio seus textos e discordo, quando você menciona o presidente Bolsonaro”. Não posso escrever generalidades, até porque meu objetivo é também o de esclarecer as incoerências e iniciativas perigosas do atual governo brasileiro, cujos riscos são visíveis, para a ruptura institucional e, às vezes, iminente.

Nosso papel de cidadão é o de manter esse alerta e vigília, considerando os escabrosos atos e fatos ocorridos, no curso desses, um ano e dez meses de mandato. Tenho convicção de que o presidente da República leu a Constituição Federal e lembra-se de que, em sua posse jurou respeitá-la. Tenho convicção de que o presidente da República sabe de que somos governados por presidentes eleitos, ele inclusive, de quatro em quatro anos, democraticamente, pelo povo, cujo poder, dele emana. Tenho convicção de que ele sabe que foi eleito, tendo como suporte legal, nos termos dispostos de nossa Carta Magna. Nesse contexto, estamos sob o Estado Democrático de Direito, no que ele teria de prestar atenção ao que está escrito no Livro I, artigos de 1° ao 4°, da CF/1988. Para não ser cansativo, transcrevo apenas o Parágrafo único do artigo 1°:

“Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Assim, não esquecer de que, o mandato ocupado pelo presidente emana da vontade popular e não de divindade, de sua vontade pessoal ou por força de armas. Os impulsos autoritários do presidente da República têm de ser contidos pelo inafastável cumprimento à Constituição e demais dispositivos à espécie.

O presidente da República que já se manifestou em diversas oportunidades defensor da ditadura e até da tortura tem de observar que é presidente eleito para cumprir as leis do país e, em consonância com nossa Constituição, suas disposições e dela não poderá afastar-se, sendo o limite de sua atuação e de pronunciamentos públicos. Quando o presidente da República extrapola os limites regulados, insultos à Constituição e aos demais poderes, que são autônomos e harmônicos, incide no crime de responsabilidade, sujeitando-se a seu impedimento (impeachment), artigo 85 da Constituição e Lei n° 1079, de 10 de abril de 1950. Exemplifico o inciso V, do artigo 1°, tratando da probidade administrativa, cujo conceito é amplo, referindo-se ao funcionário público (o presidente exerce alta função), ou seja, atuar segundo os princípios éticos e morais.

Segundo as normas estabelecidas, o dever do governante no exercício de suas funções é o bem comum, o bem de todos, jamais fazer da administração pública instrumento para beneficiar interesses pessoais, de amigos ou familiares. O presidente da República não exerce o poder sob a forma de um Presidencialismo Imperial, nem absolutista, mas sendo chefe do Executivo (um dos três poderes) e do governo, não devendo confundir os conceitos e prática dessas funções. Quando o presidente pronunciou a frase, título deste texto, lembrei-me de Luiz XIV, durante o absolutismo, que governou a França entre 1643 e 1715, cujo poder, acreditava-se era de “origem divina”. Por isso, atribui-se a Ele a célebre frase: “O Estado sou Eu, enfim, em francês, a frase completa: “Je suis la Loi, je suis l’Etat, l’Etat s’moi”.

O presidente Bolsonaro sonha com o absolutismo, tem negado a Constituição, ameaçado o STF, o Parlamento e a seus opositores, desde o início de seu mandato. Seus arroubos e impulsos ditatoriais objetivam, visivelmente, controlar em todos os aspectos fundamentais os outros poderes. Sua frase explica as conhecidas e inaceitáveis interferências, exemplo e aqui resumo: na Polícia Federal e proteção aos filhos em supostas irregularidades (rachadinhas), enriquecimento sem causa ou ilícito, o caso de seu amigo Queiroz, os depósitos na conta pessoal de sua mulher, a forma de escolha da PGR (quebrando a tradição), o enfrentamento da crise sanitária (pandemia), sua Cloroquina e o desafio à orientação da ciência e Organismos Internacionais (OMS), a crise da vacina e o governador de São Paulo.

Em meio a esse clima de medo, a população brasileira sente-se abandonada ou desprotegida, quando, aparece o presidente e afirma: “juiz nenhum pode decidir sobre a obrigatoriedade da imunização contra o Convid-19”. São contradições do Presidente, quando, a Constituição Federal prevê as consequências penais do Presidente ou de agentes públicos, há precedentes, em caso de omissão, enseja tornar-se objeto de ação judicial ou até, de seu afastamento. Ainda, com suas afirmações perigosas, disse: “a saúde não é caso da justiça”. Porém, esqueceu que “A saúde é direito de todos e dever do Estado…”, na forma em que dispõe o artigo 196, da CF/1988.

A omissão do Estado submete seus agentes às penalidades legais. O personalismo do ora presidente tem sido objeto de diárias críticas, dentro de nosso país e e fora, frequentemente, motivo de ácidas críticas ou até gozações, expondo o país em situação do ridículo. Do mesmo modo, suas saídas de moto, parando nas ruas, padarias e bares, abraça e aperta as mãos das pessoas, faz rápidos discursos, tudo isso sem máscara. Com essa irresponsabilidade, expõe sua vida e a saúde das pessoas em risco, uma conduta censurável obviamente. O comportamento do ora presidente tem se repetido na prática, um perigo à vida e à saúde, de todos. No caso concreto, aduzo o artigo 132, do CP: “Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto ou iminente. Pena – de detenção, de três meses a um ano”. Do mesmo modo, disseminar o coronavírus é crime. Ver decisão do TJDF.

Nesse cenário, temos um mandatário destruidor do que construímos, com o sangue de muitos brasileiros, pobres e ricos, pretos e brancos, não omitindo os índios da Amazônia, ora queimada, em função do descaso, da omissão ou de sua conduta dolosa (consentida), como se observa. Nessas circunstâncias, a história reservará um lugar não desejado por nenhum governante, o de genocida, de um destruidor, porque, teve um povo fraco e covarde, uma elite, politicamente, atrasada e egoísta, todos permanecemos omissos e de cócoras, assistindo o derretimento da nação, de seus valores e patrimônio, que, um dia, pretendeu ser civilizada.


JOSÉ MACEDO – Advogado, economista, jornalista e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.