Por Miranda Sá

“Ser sensível é uma coisa e sensato é outra. Uma tem a ver com a alma, a outra com a razão” (Diderot)

É linda a comparação da Mitologia Grega fazendo da borboleta o símbolo da alma humana; os pais da Filosofia da Grécia Antiga viam também nessas espécies coloridas e esvoaçantes a forma visível da alma.

Num dos meus últimos artigos, “Sonhos”, descrevi as versões da ciência e da religião sobre a alma, que é representada na Mitologia Grega por Psique, a mortal que tanto fascinava a todos com a sua beleza que ocupou o lugar de Vênus na crença popular.

Diante disto, enciumada, Vênus se revoltou considerando uma profanação a própria existência de Psique. Cheia de ódio, incumbiu o filho, Cupido, de levar uma praga para a jovem, condenando-a apaixonar-se pelo mais inaccessível dos homens.

Entretanto, mesmo enfrentando todas as agruras impostas pela maldição da deusa, a incriminada encontrou o amado, mas desgraçadamente ele morreu na celebração das núpcias…

A dor da perda foi amenizada por Zéfiro, o mensageiro da Primavera, que a sequestrou levando-a a ocupar como morada um suntuoso palácio. Nele, Psique era visitada por um amante invisível que a beijou e conquistou. Foi Cupido, que tendo se apaixonado por ela, amou-a escondido da mãe Vênus.

Arqueólogos encontraram uma grande quantidade de ornamentos em vasos, em quadros e estátuas, mostrando Psique com asas de borboletas. São alegorias para representa-la como a alma humana purificada pelos sofrimentos e infortúnios, mas preparada, assim, para ser feliz.

O pai da psicanálise, Sigmund Freud, figurou entre outros mitos a história de Psique mostrando a necessidade do analista assumir o autoconhecimento, e o seu discípulo Jung encontrou na história de Cupido (deus do amor) e de Psique (personificação da alma) o modelo disciplinador do processo analítico.

Dicionarizado, o verbete Alma é um substantivo feminino definido como princípio vital; vida. A palavra vem do sânscrito Ātman e no nosso idioma deriva etimologicamente do latim, anima,ae, significando “o que anima, inspira”.

Na antiga Grécia dos filósofos, o termo adotado é psykhé, “o ser”, “a vida” e também “criatura”. É certamente uma referência a Psique. A Filosofia discute desde então a diferença entre “Alma” e “Espírito”, termos que se confundem nas religiões espiritualistas.

Refletimos, porém, que o conceito geral vê a alma o espírito como a mesma coisa, a energia que atua indissociável à vida dos seres viventes, e, nos humanos, suscitando a afetividade, a sensibilidade e o pensamento, que se revelam independentes da atividade corporal.

O desempenho físico dos indivíduos obedece a um conjunto de movimentos práticos, diferente dos seus sentimentos. As normas de conduta das pessoas são distintas entre si, dependendo das suas relações sociais.  Na sociedade moderna vê-se claramente a diferença ideológica entre o trabalhador braçal e o trabalhador intelectual.

A nossa experiência ensina, todavia, que ambos são interdependentes. O intelectual sobrevive graças a produção braçal, e o técnico se emociona com o fruto do trabalho intelectual, o cinema, a música, a poesia e o teatro, as descobertas científicas e tecnológicas. Materializa-se dessa maneira o pensamento de Brecht: “Ciência e arte têm algo em comum: existem para simplificar a vida do homem. Uma na substância material, outra no espírito”.

Assim, na Filosofia e no Trabalho vemos o realismo recusar a ver a alma metafísica e muito menos existindo na maléfica política brasileira que surfa nas ondas da incompetência e da corrupção no enfrentamento do novo coronavírus.

Quem não encontra beleza no poema de Fernando Pessoa, que se perguntava quantas almas tinha, e poetou:  “Tudo vale a pena quando a alma não é pequena”. E, do outro lado, temos do também poeta Mario Quintana uma definição filosófica: “A alma é essa coisa que nos pergunta se a alma existe”.

Com uma visão pessoal, a minha consciência acompanha o pensamento de Giordano Bruno, escritor, filósofo, matemático, poeta e teólogo, condenado e morto pela Inquisição romana:  – “Ignorância e arrogância são duas irmãs inseparáveis, com um só corpo e alma”.


MIRANDA SÁ – Jornalista, blogueiro e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como a Editora Abril, as Organizações Globo e o Jornal Correio da Manhã. Recebeu dezenas de prêmios em função da sua atividade na imprensa, como o Esso e o Profissionais do Ano, da Rede Globo.