Por José Macedo

Artigo 5°, inciso XXXV, da Constituição Federal – “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

“Nunca é tarde demais para fazer a coisa certa”.

O acesso à Justiça não significa, tão-só, o direito restrito de petição ou de ação, requerer em juízo um direito, estando no pólo passivo ou ativo do feito, não é só a obtenção de uma sentença célere, imparcial, justa e efetiva ou que seja entregue em um tempo razoável.

Antes de tudo isso, ou de uma sentença justa, célere, imparcial e efetiva, o escopo do direito é o de que a paz social seja restabelecida e o conflito dirimido.

Entendo que, a paz social e a harmonia não serão alcançadas com a adoção de leis duras, muito menos, olhadas sob o prima policial, com repressão, implantação do medo ou coação do Estado.

Assim, estamos a anos luz do Estado Social e da concretização do desejo para a implantação de Justiça Social e de medidas econômicas, do respeito à dignidade do outro, capazes de distribuir a riqueza e a renda, eliminando a fome e a miséria.

É inaceitável ou incompreensível que, em um país, segundo maior produtor de grãos e de proteínas do planeta,10% de sua população passe fome e outros milhões de brasileiros estejam em estado de insegurança alimentar.

Apesar desse quadro, que nos inquieta, o governo utiliza de recursos do Estado, para comprar apoio de deputados, senadores, o excesso no uso do cartão corporativo, ainda canaliza esforços para a implantação de um Estado Policial e teocrático, financiando auto denominados pastores evangélicos, bem como garantindo seus espúrios interesses. O direito tem fracassado nos seus objetivos, por isso, sou favorável a que, o povo venha para o centro do poder, discuta e reivindique, talvez possa alcançar a cidadania plena, enfim a democracia, o Estado Democrático de Direito e Justiça Social.

Recentemente, assisti em vídeo: o julgamento de um réu no Tribunal do Júri, em um certo País. Apesar da ausência de provas e de que o réu não poderia ter praticado o crime, o assassinato, prosseguiu o julgamento.

A autoria e imputação do crime àquele réu era impossível, porque, restava comprovado nos autos, o réu se encontrava, no dia e hora, a 3.000 kms do local, onde crime ocorreu. O representante do MP (Ministério Público), desejava condená-lo, porque era um episódio de repercussão nacional e, propiciaria fama, espetáculo, visibilidade e promoção. O réu era negro e pobre.

No prosseguimento da Sessão de Instrução e Julgamento, o representante do Órgão acusador (MP), enfurecido, diz: não preciso de mais provas, basta olhar para o réu, ele detém todas as características de um criminoso, é negro, é pobre e vive em local fértil para a prática de crimes, acuso-o, assim prevalece minha convicção.

Estava tudo delineado para o magistrado sentenciar, condenando-o. Tratava-se de um inocente. De repente, levanta-se o auxiliar da promotoria que, indignado com a parcialidade e injustiça, narra a pretensão do Promotor, traz provas e a Sessão do Tribunal do Júri é suspensa. O resultado foi a absolvição do réu, sendo a trama e interesse do Promotor expostos.

Quando, uma das partes, autor ou réu é pobre, é negro, é um excluído, um outsider, a tendência é que seja refém de estereótipos e do ódio, dos detentores do poder, dos poderosos, até dos fiscais da lei, que, em regra, não deveriam nutrir-se de preconceitos e de ódio.

O negro nasce com índice altíssimo de possibilidade para ser marginalizado e reprovado por esse mundo que é seletivo, rejeita-o e exclui-o.

O Sistema de Justiça pode, facilmente, ser manipulado por operadores sem escrúpulos, deformados e alimentados por esses desvios e vícios, próprios de uma sociedade estratificada e de classes.

A elite dominante e atrasada manipula o Estado e seus instrumentos, preparados para punir, exatamente, aqueles, que atrapalham seus desejos, e objetivos, ou seja, a acumulação da riqueza.

A classe dominante e rica manipula, enfurece-se e não divide seus privilégios, porque o outro a ela não importa.

É a lógica do Sistema Capitalista, predador, acumulador de riquezas, garantidor de privilégios, excludente e do “salve-se quem puder”.

O direito, assim, perde sua função pacificadora e social, cujo resultado é o fracasso. Os fins justificam os meios, o acesso à Justiça passa a ser uma utopia, uma quimera, um sonho.

Enquanto que, o Sistema Econômico é um arsenal de técnicas, fora do alcance do povo, a serviço do Estado e da classe que o sustenta.

Aos olhos da classe dominante o direito não deve ser obstáculo para a ampliação de seus direitos e garantia do status quo. O conflito pereniza-se!

Assim, no meu sentir, considerando o que narrei, o direito tem fracassado no cumprimento de suas finalidades, um poder moderador, capaz de liderar a compreensão de que os direitos humanos devem ser obedecidos e respeitados, o direito à vida, à liberdade, a um emprego, a uma moradia, o mínimo para uma existência digna; direitos, sustentados pelos vínculos da solidariedade, igualdade e fraternidade.

Esse fracasso, costumo mostrar, quando escrevo sobre o assunto, explica-se pelo número da população encarcerada, em torno de 750.000, homens e mulheres jogados em prisões fétidas, desumanas, superlotadas, verdadeiras masmorras medievais.

O Brasil, no ranking das nações, possui a triste e vergonhosa marca, de ser a 3a. maior população carcerária do mundo.

Vejam: Encontra-se no Congresso Brasileiro a PL N° 1595/19, do deputado Sanderson (PSL-RS), para ser aprovada, a Lei antiterror, que tem como objeto criminalizar os movimentos sociais e todos que criticarem o governo.

Assim, desenterra a Lei de Segurança Nacional, considerada lixo da ditadura de 64. Com isso, estamos na iminência de implantação de uma das piores ditaduras, caminho parecido e pavimentado, pela intenção do então ministro da Justiça, Sérgio Moro que, agora, deseja ser presidente da República.

O então ministro, também um fascista, apresentou proposta de livrar o policial de qualquer pena, a licença para matar.

As vozes contrárias à essa lei de natureza fascistoide, legalizaria assassinatos contra os pobres, pretos e favelados, inserindo a exclusão de ilicitude, como defesa dos que matam em nome do Estado.

A polícia é quem mais mata pobres e pretos, sob a alegação de que houve confronto.

Essa lei daria ao agente público, o policial, o fundamento para alegar a legítima defesa, no estrito exercício do cumprimento do dever legal, afastando-o da possibilidade de qualquer acusação.

Esse é o Sérgio Moro, ex-juiz, ex-ministro da Justiça, apoiador do Bolsonaro, que negociou, no curso das eleições de 2018, seu cargo vitalício de juiz federal, sob a promessa de ser nomeado ministro do STF.

Essas leis e seus idealizadores expressam traços nazifascistas, eliminam a possibilidade de sermos um país mais democrático e justo, enfim significam retrocesso de direitos humanos dos mais elementares, como os da vida e da liberdade.

Não tenho dúvidas de que, estamos em um Estado Policial, que, exige do cidadão eterna vigilância e cuidados, sob pena de irrecuperáveis perdas de direitos, conquistados com sangue e vida de muitos brasileiros.
O Estado brasileiro é, historicamente, punitivo.

Com o desemprego atual, o Brasil, retornou, em 2016, ao Mapa da Fome, cuja consequência é de mais violência e aumento da criminalidade.

consequentemente, mais presos, apodrecendo nas delegacias e penitenciárias e, mais despesas para toda sociedade.

Segundo o Conselho Nacional de Justiça, o preço médio para manter um preço é de R$ 2,400,00, mensalmente.

Nesse inferno dantesco, o Estado brasileiro responde com mais violência, matando e prendendo, sobretudo, pretos e pobres, um círculo vicioso sem fim.

O Estado descumpre suas funções sociais e constitucionais, omite-se, prende e pune, formando uma espiral, sem fim.

O encarceramento de 750.000 presos revela a ineficiente política pública adotada.

Ao contrário, após o cumprimento das penas, saem piores e, totalmente, irrecuperáveis, não são inseridos no mercado de trabalho.

O Estado produziu e é o maior responsável por essa tragédia, de injustiça e exclusão praticadas, ao longo de séculos.

O Estado brasileiro não educou, não gerou empregos e não implantou a necessária Reforma Agrária, a política de distribuição de renda, capazes de neutralizar os efeitos perversos da economia e da renda na mão de poucos.

Então, o resultado é o de uma população marginal e delinquente, em espiral crescimento. Não há surpresa, vemos a profecia do pensador, educador e antropólogo, Darcy Ribeiro ser concretizada: “Se os governantes não construírem escolas, em 20 anos, faltará dinheiro para construir presídios”.

Assim, tento, nos meus dias, após dias, ser um otimista e, não consigo, sobremodo, quando vejo néscios e ultra conservadores detendo poderes no Estado, quando vejo o uso desrespeitoso do nome de Deus, quando vejo fortes traços da teocracia, assentando praça nos três poderes da República.

Confirmo: O direito fracassou. Que eu esteja equivocado!

JOSÉ MACEDO – Advogado, economista, jornalista e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.