Por Lincoln Penna

Escrevo essas linhas no penúltimo dia de agosto e, portanto, dias próximos do dia 7 de setembro, quando se dará a cartada decisiva de Bolsonaro de ameaça à democracia.

Da mesma forma que o indigitado presidente joga com o alto risco de sua empreitada, na busca de seus objetivos confessos, também me arrisco com alguns palpites sobre o que acontecerá na data da Independência.

Há duas possibilidades: o grito dos fanatizados bolsonaristas convencidos de que é hora do mito tomar de vez o poder e a manifestação se esvair sem maiores conseqüências para a democracia; ou, ocorrer badernas com ataques e eventuais ocupações das sedes dos demais poderes da República, de modo a provocar o uso da LGO, o tão decantado artigo 142 da Constituição. Neste caso, o estabelecimento de um Estado de emergência ou até de sítio abriria caminho para um poder do executivo sobre os demais. Enfim, uma ditadura auto proclamada.

Aposto na primeira dessas possibilidades, não tanto por crer de forma absoluta nas chamadas forças da ordem. Refiro-me às polícias estaduais e, sobretudo, às Forças Armadas, que têm sido freqüentemente alvos de conjecturas sobre a empatia que manifestam em relação ao presidente. A aposta tem como fundamento o fato de que o governo se encontra confinado, isolado e em processo de progressivo esvaziamento, dentro e fora do País. Logo, qualquer ato de força resultará em fracasso.

Tivemos nos anos trinta do século passado confrontos entre integralistas e aliancistas, os da Aliança Nacional Libertadora, alguns dos quais militantes comunistas. Alguns desses enfrentamentos ocorreram à bala, com trocas de tiros e casos de mortes. Eram tempos de radicalização ideológica em função do que se passava em grande medida no panorama mundial, pouco antes da Segunda Guerra. Que essa situação venha a acontecer no Brasil de hoje não está totalmente descartada, afinal o apelo de Bolsonaro às armas tem mobilizado muitos de seus adeptos.

A intolerância movimenta a política do confronto adotado por quem deveria se voltar para os graves problemas que afligem o povo brasileiro. Mas, para Bolsonaro o que importa é a sua pauta de quebrar as escoras que sustentam a nossa frágil democracia, e estas escoras são representadas pela Constituição e os demais poderes da República, que em função do cumprimento de seus deveres despertaram o ódio do presidente e, com isso, ele deu início ao projeto de tiranizar a sociedade. E diante dos arroubos de um alucinado à frente da presidência da República, tudo é possível.

Seja qual possa ser o desdobramento desse dia 7 de setembro, a partir desta data terá início um longo processo eleitoral num ambiente dos mais tensos, principalmente em virtude da profundidade da crise em todas as instâncias, de maneira a fomentar a violência.

A inflação crescente, o desemprego permanente e o desespero dos que se encontram entre os velhos e novos vulneráveis assolados pela fome crônica, criam um quadro de profunda instabilidade, próprio para quem deseja valer–se disso para tirar proveito. É, para essa turma, trata-se da tempestade perfeita, de maneira a despertar para ações antidemocráticas de maior vulto.
Todavia, como se diz não há um dia após o outro com uma noite no meio, e o povo sensível e capaz de defender-se do mal que o atinge como há muito não se tem notícia, saberá tomar para si o papel de ir à luta. E não deve ser mais para dar apoio a aventureiros e falsos profetas, mas para ele próprio redefinir sua vida e conquistar o direito à vida, até porque não lhes restam alternativas.

Por fim, não fossem as muitas razões para se resistir a um governo que tem por objetivo a destruição do pouco que se fez em direção à conquista da democracia que queremos, bastaria recorrer ao orgulho nacional hoje em dia sistematicamente humilhado ao nível internacional, em função de se ter na presidência um entreguista como nunca se viu na nossa história. Acresce a isso, a irresponsabilidade de um suposto Chefe de Estado que compromete todo o futuro da fraternal comunidade latino americana, a perder a referência que tinha em nosso País como representação dos interesses comuns.

O mês de setembro vai abrir caminhos, que podem nos levar a diferentes lugares na história. É preciso que as forças sociais e políticas comprometidas com o presente e o futuro de nossa brava gente brasileira escolha o caminho certo. Para que ele seja de fato certo, é necessário que tenhamos a abertura suficiente para entendermos que contra os malfeitores que estão à frente do Estado é indispensável unir os que prezam pela dignidade de nosso povo.

A nossa única prioridade deve ser o pronto atendimento às necessidades básicas do povo. Outro qualquer é contrário aos seus interesses imediatos.

LINCOLN DE ABREU PENNA – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP); Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (Modecon); Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.


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