Por Luiz Carlos Prestes Filho –
A “Jararaca” do município de Cachoeiras de Macacu vem rastejando desde o Timbó, distrito do município de São Fidélis, interior do Estado do Rio de Janeiro. Ela atravessa trilhas da Mata Atlântica, desce da Região Serrana e se acomoda em barris confeccionados de tapinuã, cerejeiras e carvalho. Depois de descansar alguns anos, suas crias se espalham por Itaboraí, São Gonçalo e Niterói. Muitos exemplares voltam para o habitat natural da sua origem, alcançam as cidades de Nova Friburgo, Teresópolis e Petrópolis. Claro, voltam para as terras de São Fidélis.
Sim, este é o ciclo de vida do produto mais conhecido de Cachoeiras de Macacu – a cachaça “Jararaca”, afirma Fábio Monteiro: “Vendemos cerca de 30 mil litros todo ano, o que nos permite manter o negócio equilibrado. Nosso foco comercial é regional, não planejamos ações empresariais voltadas para o mercado internacional.”
A empresa “Jararaca”, fundada em 1944 pelo pai de Fábio, Laerte Barbosa Monteiro, nunca foi um alambique, sua cadeia produtiva tem como elo inicial o armazenamento da cachaça produzida em Timbó: “Praticamente, compramos 90% do que é alambicado naquelas terras, trazemos para Cachoeiras, onde deixamos descansar até o ponto do engarrafamento. As garrafas e as rolhas adquirimos em São Paulo. Também, temos realizado um intenso trabalho para reciclar aqueles vasilhames que podem ser reaproveitados, por obedecer as normas de higiene e o padrão estabelecido“.
O empresário conta que ficou entusiasmado com a criação da Associação de Amigos e Produtores de Cachaça do Estado do Rio de Janeiro (APACERJ): “Mas não consegui dar continuidade a minha participação. Entendo ser importante neste momento de crise um fortalecimento das empresas de cachaça do Rio de Janeiro. Afinal, nosso Estado que deu origem a esse produto que define a brasilidade, ao lado do futebol, do samba e do carnaval.”
No galpão aclimatado, localizado no centro da cidade, estão os barris de 30 mil litros de cerejeira e de tapinuã, também os menores, de 250 litros, confeccionados de carvalho.
Como as terras de Cachoeiras de Macacu são habitadas por jararacas venenosas, pode parecer que a denominação da cachaça é um produto inspirado nestas cobras. Negativo, afirma Fábio Monteiro: “Meu pai era fã da dupla ‘JARARACA e RATINHO’, a nossa cachaça foi idealizada como uma homenagem aqueles artistas que influenciaram gerações.”
Os mais velhos moradores da localidade lembram dos cantores que, através de suas obras exaltavam a natureza. Em “Moda Antiga”, por exemplo, a passagem do dia é marcada pelo galo do amanhecer; pelo Inhambu-chororó; pela pomba-rola; pelo juru gargarejador; e pelo canário dobrador. Uma obra musical que, poderíamos dizer, homenageia o árduo trabalho de identificação e proteção dos pássaros que habitam as matas que abraçam Cachoeiras de Macacu.
No interior da Bahia tem um empreendedor que serve cachaças para os clientes, guardadas em garrafas com serpentes, corais, corre-campo, malha de traíra, jiboia e pipó. Mantém essas espécies mergulhadas juntamente com aranhas caranguejeira, escorpiões, teiús e calangos verde. Este não é o caso da “Jararaca”, lembra Fábio Monteiro: “Nosso produto pretende ter a mesma qualidade que a música nacional e o paladar único da gastronomia brasileira. Sempre buscamos aprimorar a qualidade. Repudiamos qualquer insinuação, comparação ou piada de mau gosto. Mas o povo não é mole… Sabe como é, em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher“.
LUIZ CARLOS PRESTES FILHO – Cineasta, formado na antiga União Soviética. Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local, diretor executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009). É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).
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