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Um convite dramático aos extremistas da moderação
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Um convite dramático aos extremistas da moderação

Por José Carlos de Assis

Assinei um artigo no qual afirmei que o êxito da estratégia política extremista de Jair Bolsonaro depende do comportamento também extremista do lado oposto dele.

Este, na cabeça do povo ideologicamente manipulado, é representado por eventuais extremistas da CUT e do PT. É uma simplificação grosseira, mas, enfim, é o que está na cabeça da maioria do povo. Diante disso, devido a uma diferença de tarefas na estruturação do Pacto Social que ambos buscamos, o outro possível signatário ponderou que não convinha que ele também assinasse o artigo.

É que cabe a um de nós (Belluzzo) contatos de nível, em sua maioria, políticos. Em política não convém haver comportamentos extremos. Nem no plano abstrato em que se atribuem, mesmo como caricatura, comportamentos extremistas a um ou outro grupo social. A provável maioria moderada da CUT e do PT, empenhada na busca do controle do poder político por via democrática e institucional, poderia se sentir confundida com radicais. O acordo foi então que o artigo, considerado teórica e operacionalmente necessário, fosse assinado apena por mim.

No caso, encarreguei-me, em sentido mais amplo, da parte pragmática de construção do Pacto Social. Aqui, a linguagem tem que ser mais direta, porque estamos literalmente numa guerra ideológica que levará inexoravelmente a decisões no plano político. O propósito do artigo era mostrar que Bolsonaro, desde sua remota origem política, sempre esteve do lado contrário às instituições democráticas. Queria explodir um quartel para levantar as Forças Armadas contra o que classifica como esquerda – e nem sabemos o que exatamente ele quer dizer com isso.

Era uma estratégia do tipo que, na esquerda, levou o nome de foquismo nos anos 60. A partir de um foco se faria uma revolução. Ato de desespero: quando não se vê saída para uma situação concreta, no plano institucional, buscam-se saídas heroicas, idealistas, de qualquer custo, para mudar a ordem social. No caso brasileiro, foi o que buscaram jovens idealistas na medida da radicalização política do golpe de 64. Este, no início, sob Castello Branco, se dizia destinado a garantir ordem e democracia. Resvalou para a ditadura e o AI-5. Perseguições, tortura, mortes.

O lado oposto reagiu com maior grau de idealismo, no terreno concreto, e com grandes sacrifícios: assaltos a bancos, sequestros de diplomatas e, em casos extremos, até assassinatos. Por idealismo, tudo isso se justificava no plano moral. No plano prático, suscitava reações opostas de cada vez maior agressividade. Os anos de ferro do golpe militar de 64 passaram aos anos de chumbo do AI-5. Justamente este que os extremistas de Bolsonaro, em manifestações raivosas diante do Supremo Tribunal Federal, querem restaurar, hoje, em plena democracia, sob controle de um tirano.

Essa é a dinâmica social e política simplificada das últimas seis décadas no Brasil. É descrita pelo que, teoricamente, se chama materialismo histórico. Ainda em teoria, é a dialética dos conflitos materiais elevada ao plano político, que conduz às grandes transformações históricas. Individualmente, somos seus simples objetos. Mas quem sempre as tinha conduzido, historicamente, até hoje, na prática, foram os revolucionários; dentro deles, um subgrupo mais ativo de extremistas; e dentro destes, por fim, gente majoritariamente jovem. Por quê jovens?

Jovens são, em sua maioria, idealistas. O que conhecem da história vem dos livros, não da experiência prática.

Quando, diante de uma injustiça, exigem uma reação concreta, não pensam nas consequências. As revoluções tornam-se abstrações românticas, sem mortos, feridos, viúvas, órfãos. Além disso, são vistas como possíveis e vitoriosas na prática. Há 20 anos, quando do atentado às Torres Gêmeas em Nova Iorque, escrevi um livro abordando suas consequências, “O Atentado da Nova Era”. Nele, expus o conceito de segundo nível de dissuasão de guerras.

O primeiro nível é a dissuasão nuclear. A guerra nuclear é impraticável porque leva à destruição da humanidade e, portanto, daquele lado do poder atômico que teria tomado a iniciativa dela. O segundo nível é a dissuasão das guerras civis em nações de estágio industrial mais ou menos avançado. Os armamentos convencionais ultratecnológicos que nelas se fabricam ou se compram têm poder suficiente para destruir as bases materiais e humanas da própria nação em disputa. O grande problema é que não se iniciam guerras nucleares ou civis; chega-se a elas.

Para ficar na hipótese da guerra civil no Brasil, desejada por Bolsonaro, é preciso imaginar quem a iniciaria. Claro, a provocação é dele, ao tentar liquidar com as instituições democráticas. Mas se um não quer, dois não brigam. Quem reagirá então à proposta de Bolsonaro? Homens maduros, velhos, experientes, certamente que não. Conhecem as consequências práticas de conflitos extremados e de ditaduras, porque os vivenciaram. Já os jovens, idealistas como em geral são, podem ver a guerra civil, ou a radicalização política que leva a ela, como uma aventura romântica.

A primeira e por enquanto única vez em que a humanidade se defrontou com um risco concreto de uma guerra nuclear devastadora foi na crise dos mísseis em Cuba, em 1963. John Kenneth Galbraith, em seu fascinante “A Era da Incerteza”, conta como o presidente John Kenney, que tinha os controles dos botões atômicos, relatou para ele os momentos angustiantes da tomada de decisões na Sala de Crises da Casa Branca. Era justamente quando alguém, para parecer durão e decidido, recomendava uma ação extrema para liquidar de vez a ameaça soviética, sem medir consequências.

Bolsonaro está na condição de um fora da lei enjaulado, sem escapatória. Os escândalos de corrupção bateram nos gabinetes do Planalto e na intimidade de sua família. Nem o mais corrupto dos congressos negaria um pedido de impeachment diante da provas coletadas pela CPI da Covid. Sem saída, está voltando às origens. No posto mais alto da hierarquia institucional do Estado, a única alternativa que vê é destruir as próprias instituições que formalmente garantem sua autoridade. Assim, é provável que, antes do impeachment constitucional, seja deposto como louco.

Portanto, que os jovens idealistas tenham paciência. Se esperaram até aqui para desmascarar o mito, que esperem um pouco mais. Recorrendo a manifestações democráticas de rua e a articulações sociais e políticas responsáveis, acompanhando e aplaudindo as decisões cirúrgicas do STM, verão apertar-se o cerco constitucional e sanitário contra Bolsonaro e aproximar-se de vez sua queda. As condições para o Pacto Social estão dadas. Anunciam grandes transformações. Marx dizia que, na história, não há mudança real se o velho não estiver no ponto de cair sozinho, e o novo, pronto para substituí-lo.

Bolsonaro já caiu de podre. Pensemos no que vem depois!

JOSÉ CARLOS DE ASSIS – Jornalista, economista, escritor, colunista e membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Professor de Economia Política e doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ, autor de mais de 25 livros sobre Economia Política; Foi professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), é pioneiro no jornalismo investigativo brasileiro no período da ditadura militar de 1964; Autor do livro “A Chave do Tesouro, anatomia dos escândalos financeiros no Brasil: 1974/1983”, onde se revela diversos casos de corrupção. Caso Halles, Caso BUC (Banco União Comercial), Caso Econômico, Caso Eletrobrás, Caso UEB/Rio-Sul, Caso Lume, Caso Ipiranga, Caso Aurea, Caso Lutfalla (família de Paulo Maluf, marido de Sylvia Lutfalla Maluf), Caso Abdalla, Caso Atalla, Caso Delfin (Ronald Levinsohn), Caso TAA. Cada caso é um capítulo do livro; Em 1983 o Prêmio Esso de Jornalismo contemplou as reportagens sobre o caso Delfin (BNH favorece a Delfin), do jornalista José Carlos de Assis, na categoria Reportagem, e sobre a Agropecuária Capemi (O Escândalo da Capemi), do jornalista Ayrton Baffa, na categoria Informação Econômica. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.


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