Por Ricardo Cravo Albin

A cada vez que reflito sobre os altos e baixos em que gravita a Educação neste país não há como deixar de me inquietar.

E quando me refiro à cultura, devo logo sublinhar que meu entendimento de qualquer processo cultural será sempre transversal, abrangente.

Não há como pensar em editar livro sem leitores adestrados a entendê-lo. Construir teatro sem formação de platéia. Fazer um filme sem locais para exibi-los. Ou erguer museu sem visitantes.

Os mecenas existem no Rio, e despontam de organismos particulares. Já comentei muitas vezes sobre os benefícios do SESC, que funciona no Brasil como um Ministério da Cultura ativo e certeiro.

Devo referir-me agora ao Cesgranrio, uma instituição que poderia limitar-se apenas aos vestibulares. Qual o quê…

Seu Presidente, o educador Carlos Alberto Serpa, continua a  mostrar o dedo do gigante. E provou por A mais B como fomentar idéias e fazer boa gestão cultural.

São, de fato, memoráveis suas façanhas. Que vão do Prêmio Cesgranrio para Teatro (hoje tradição inamovível) à recente edição de livros. Que começa agora com a biografia de Bibi ferreira, entregue a competência da escritora e atriz Jalusa Barcellos. A biógrafa acaba de pôr há dias ponto final na alentada narrativa de vida/obra da mais versátil e longeva atriz do Brasil.

Serpa, um mestre refinado a preservar memórias, também entregou à pianista Carol Murta Ribeiro, presidente da Academia Nacional de Música, o projeto “Música Erudita nas Escolas”, distribuindo de imediato trinta mil unidades aos alunos dos ensinos fundamental e médio.

Este escriba desenvolveu no Instituto Cravo Albin em 2010, e não há porque deixar de registrar aqui, o projeto MPB nas Escolas: uma pasta escolar com cartazes, livretos, CDs e DVDs, aplicada com sucesso na rede estadual do Rio pela corajosa Secretária de Educação Teresa Riff Porto.

Ao longo de três anos, uma equipe acadêmica de mestres de universidades sediadas no Rio definiu no Instituto a história da MPB, sua ancestralidade e os ecos quase assombrados de suas repercussões culturais. Ou seja, resumimos as várias qualificações da alma do povo miscigênico que nós somos.

Tanto as letras das músicas quanto a diversidade de seus ritmos permitem à qualquer pessoa um mergulho em profundidade na alma simples, ou por vezes mais sofisticada, desta nossa “civilização tão cafusa e original”, como  vaticinou Gilberto Freire.

De mais a mais, e insisto, as letras (sobretudo elas) inferem toda uma conexão muito conveniente com a literatura, a poesia e a história do país, de modo direto.  Nossos ritmos – o cadinho mágico dos gêneros musicais – exibem opulentamente a magia da ginga, da dança, da sensualidade, e até da ingenuidade de um povo argamassado pela mistura de três raças formadoras.

Por tudo isso, clamo de há muito que não há nada mais eficaz do que ensinar-se essas historias nas escolas municipais e estaduais.

Certamente será sempre fundamental que se insista em contar esta riquíssima epopeia, a dos míticos compositores/intérpretes e a dos seus gêneros musicais. Que maturaram  o melhor da alma carioca na   rolança   de quatro séculos.

Para terminar, volto a louvar o Serpa. Um homem simples, sem pose majestática, a fazer (sem querer, mas fazendo) o papel individual  de Ministro da Cultura. Que nem mais existe neste país de hoje.


*Ricardo Cravo Albin, Jornalista, Escritor e Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin

Texto publicado originalmente no jornal “Correio da Manhã” – Dia 29/11/19