Por Pedro Augusto Pinho

Monteiro Lobato (1882-1948). José Bento Renato Monteiro Lobato foi o escritor da minha infância e de toda minha vida. Na livraria Civilização Brasileira, no centro da cidade do Rio de Janeiro, havia na parede, com destaque, sua frase:

Um País Se Faz Com Homens e Livros”.

Nunca esqueci a Marquesa de Rabicó, das histórias do Sítio do Pica-Pau Amarelo, e desta frase que me ficou gravada desde a adolescência.

O Brasil está se desfazendo. Em artigo recente (02/08/2021), para o Portal Pátria Latina – Foram-se as Riquezas e o Estado, É a Vez do Território Brasileiro – escrevi: “nós mesmos, com nossa alienação, com a mesquinhez do interesse pessoal e imediato, vendo na política só uma falha de caráter e não a mais importante ação humana, com afirmou o Papa Francisco, entregamos nossas riquezas, nosso Estado Nacional e nosso território, afastando a Questão Nacional, que deveria ser a principal preocupação da existência do Brasil, do debate político”.

E o governo dos capitais apátridas, gerenciado por Jair Messias, está promovendo a alienação de parte importante de nosso território, a que guarda a memória dos grandes feitos brasileiros.

No jornal Folha de S.Paulo, sábado, 14/08/2021, à página A20 lê-se: “Guedes põe prédio icônico do Rio em feirão de imóveis”, com subtítulo: “Símbolo da arquitetura moderna, Palácio Capanema vai a leilão”.

O Palácio Capanema, como se lê na matéria de Catia Seabra, é “definido pelo próprio Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) como símbolo da arquitetura moderna brasileira”. E, adiante, explicita: “nas páginas do Iphan, o Capanema é descrito como fruto de encontro de nomes como Lucio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Carlos Leão, Ernany de Vasconcelos e Jorge Machado Moreira, sob a consultoria de Le Corbusier”. E a estas glória da cultura brasileira se somaram: Burle Marx, Cândido Portinari, Bruno Giorgi, Adriana Janacópulus, Celso Antônio e Jacques Lipchitz, responsáveis pela integração ao monumento nacional as obras de arte de suas pinturas, esculturas, paisagismo.

Este incrível acervo cultural será vendido por metro quadrado. Talvez as 62,3 toneladas de ouro que o Banco Central comprou entre maio e julho deste ano sejam para venda futura, em leilão de sucatas, promovido por estas mesmas autoridades, responsáveis (?) pelo desenvolvimento econômico do Brasil. Tristes ironias nos pregam a história. No mesmo jornal é noticiado o lançamento do livro “Os Homens do Cofre – O que Pensavam os Ministros da Fazenda do Brasil Republicano (1889-1985)”, uma coletânea organizada por Ivan Colangelo Salomão para editora Unesp. Pode não ter sido a intenção do organizador, mas o fim do pensamento em 1985 é muito significativo.

O Brasil das desregulações, privatizações, do domínio dos capitais estrangeiros dos paraísos fiscais começa, efetivamente, com a nova república.

E esta alienação do Brasil só faz crescer, atingindo um momento que só acreditamos porque estamos vendo e registrando: o domínio dos capitais apátridas onde os marginais, aqueles que têm origem em drogas, contrabandos, ilicitudes de toda ordem, também dão as cartas.

E vender obra de arte por metro quadrado é bem o que se espera do secretário da cultura que vai à Bienal de Veneza, que homenageia Lina Bo Bardi (1914-1992), a primeira mulher com cidadania brasileira a receber o Leão de Ouro pelo conjunto de obras, na 17ª Biennale di Venezia, deixando-nos obras notáveis como o Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand – o MASP, e o SESC Pompeia, sem saber de quem se tratava (!). Óbvio, ele considerava uma viagem para andar em gôndolas, a custa dos impostos que pagamos, afinal a Secretaria Especial da Cultura (Secult) é órgão do Ministério do Turismo.

Ou, talvez, atendendo ao ministro da educação que, em 2018, afiançou estar o existencialismo sendo ensinado nas universidades, o que incentivava os alunos a terem relações sexuais desconsiderando quem é o parceiro (!) (?). Que tem a mais recente “boutade” com esta pérola humanista: “universidades não são tão úteis à sociedade” (Portal G, em 10/08/2021).

Destes letrados e cultos gerentes do ensino e da cultura no Brasil de hoje podemos esperar que as alienações se dirijam não apenas aos minérios, às reservas de petróleo, a empresas estratégicas como os Correios e a Eletrobrás, mas a nosso patrimônio imaterial, nossa cultura.

É esperado, portanto, que a obra de Lucio Costa, Niemeyer, Reidy, Bruno Giorgi, Portinari seja transformada no entulho de onde surgirão 50 andares do prédio informatizado, onde os escritórios dos gestores de ativos estarão comodamente instalados.

Parodiando Emília, a Marquesa de Rabicó, após Dona Benta ter narrado a história de Cómodo, o imperador romano que governou de 180 a 192; que coisa mais incômoda ser governado por quem tem apreço a tal comodidade!

PEDRO AUGUSTO PINHO é presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET), avô e administrador aposentado.

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